O Natal somos nós

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Em Portugal, o Natal não é apenas uma data no calendário: é uma expressão viva da nossa identidade, da nossa história e da nossa forma de estar em comunidade. Isto é um facto, é um dado indiscutível. Até os ateus o assinalam.

Quando vemos decisões como a proibição de referências ao Natal numa sessão fotográfica de crianças em Pinhal Novo, ou a substituição de um Mercado de Natal por um “Mercado Comunitário de Inverno” na Junta de Freguesia de Arroios, é legítimo sentir preocupação, revolta e receio pelo caminho que estamos a seguir.

O Natal celebra o nascimento de Jesus Cristo, um acontecimento central da nossa fé e da civilização que moldou Portugal ao longo de séculos, mesmo que na Constituição se diga que o país é laico. Mas o povo não o é. Igrejas, tradições populares, canções, presépios, ceias em família: tudo isto faz parte de um património espiritual e cultural que não pode ser tratado como algo embaraçoso ou descartável. Como algo incomodo de que nós tenhamos de nos envergonhar. Apagar o Natal do espaço público não é neutralidade; é negação das nossas raízes.

Do ponto de vista político e cultural, estas decisões revelam uma confusão profunda entre inclusão e auto-apagamento. A verdadeira inclusão não exige que um povo abdique da sua história para acolher quem vem de fora. Pelo contrário, quem escolhe viver em Portugal deve encontrar um país com identidade, valores e tradições claras. Das quais não abdica. Respeitar outras culturas não implica esconder a nossa. Um país que não se afirma acaba por não respeitar nem a si próprio, nem os outros.

Além disso, é difícil compreender como a eliminação de símbolos cristãos promove a convivência. O Natal, mesmo para quem não é crente, é um momento de união, solidariedade, partilha e comunidade. Retirar-lhe o nome e o significado não torna a sociedade mais justa ou mais aberta; torna-a mais fria, burocrática e desligada das pessoas reais que nela vivem.

Portugal sempre foi um país acolhedor, mas nunca foi um país sem identidade. O espírito de comunidade constrói-se através da continuidade das tradições, da transmissão de valores entre gerações e do orgulho naquilo que somos. Quando instituições públicas cedem a uma lógica de medo cultural, acabam por destruir precisamente aquilo que dizem querer proteger: a convivência social.

Defender o Natal no espaço público não é excluir ninguém. É afirmar quem somos. E um país que deixa de celebrar as suas próprias tradições corre o risco de perder não só o seu passado, mas também o seu futuro. E, ainda mais preocupante, fará com que as pessoas que cá estão e celebram o Natal olhem para quem vem de fora com desconfiança, raiva e sentimento de exclusão, o efeito exactamente contrário ao que se predispunha construir. E os responsáveis políticos tinham obrigação de ver isso.

Portanto, um Santo e Feliz Natal para todos.

Professora auxiliar da Universidade Autónoma de Lisboa e investigadora (do CIDEHUS).

Escreve sem aplicação do novo Acordo Ortográfico

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