O meu tio foi um 'lobisongo'!

Publicado a
Atualizado a

Lembro com algum saudosismo os meus tempos de miúdo, ainda na Escola Primária, em que descia o caminho das cobras em direção a casa da minha avó. Os lanches em casa da Avó Cochicha eram um misto de regras militares e histórias quase sobrenaturais.

Passei lá à porta no outro dia. Parte do caminho das cobras foi ocupado por uma estrada de alcatrão, a casa dela tem agora uma mega marquise que descaracterizou por completo aquele pátio, onde ela me esperava todos os dias.

Aquela casa era farta em lendas e lengalengas muito particulares. Era um poço de estórias, de fantasias e de superstições. E a minha avó tinha um dom especial para contar todas estas estórias.

Ela contava-me de tudo! Desde lendas com bruxas, a episódios mirabolantes com feit’cêras e lobisongos. E a estória do lobisongo era assim... qualquer coisa de espetacular e inacreditável. Ao que parece eu tive um tio que era lobisomem. Sim, leram bem. Eu tive um tio lobisomem.

ILUSTRAÇÂO: D.R. / Carlos Rosa

Mas era um lobisomem bom, ou lobisongo como se dizia lá na aldeia. Bom, porque não comia carne, nem atacava os amigos. Quando se transformava, lá ia a correr desalmadamente até à Costa da Caparica para saciar o apetite com sardinhas na praia.

E no fim lá dizia ela: - “Ele é irmão do teu bisavô. Agora já está muito, muito velhote e já quase não se consegue transformar. E muito menos ir atá à praia para comer sardinhas! Diz que lhe doem muito as artroses e os joelhos. E que lhe custa muito ir até lá acima às três palmeiras esconder a roupa rasgada.”

A minha avó dizia que nas aldeias e lugares nos arredores de Lisboa, havia uma série de indivíduos singulares que eram nossos parentes. Todos estes sítios tinham um tio, uma prima ou um avô, assim... esquisito e desviante, que se transformava ou que tinha poderes sobrenaturais.

E dou comigo a pensar o que é feito destas criaturas? Tenham ou não existido, onde andam estes seres especiais? Onde andam estas estórias que alimentavam o imaginário das crianças?

Onde andam os nossos lobisongos? Onde estão as nossas bruxas?

Provavelmente escondidos e incógnitos a fazer feitiços digitais dentro de uma plataforma qualquer de Inteligência Artificial, o que é uma pena.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt