Marques Mendes só quer ser Presidente da UGT? 

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O atual candidato presidencial, Marques Mendes, que tem o apoio do PSD, preocupado com a greve geral contra a legislação laboral marcada para 11 de dezembro, pediu ao primeiro-ministro, líder desse partido, Luís Montenegro, que tratasse “com respeito a UGT”, porque esta central sindical é “responsável”, pois “tem estado no passado envolvida em vários acordos entre patrões e governo”, “ao contrário da CGTP”. 

Há três anos, o antigo comentador político Marques Mendes recomendou aos telespectadores a leitura de um livro que eu próprio escrevi, em 2022, para o Conselho Económico e Social, e que narra o essencial da história da concertação social em Portugal. Ele recomendou o livro aos espectadores da SIC, mas não o deve ter lido, porque, se o tivesse lido, o atual candidato presidencial Marques Mendes saberia que, dos 29 acordos assinados até então entre patrões, governo e centrais sindicais, oito tiveram a rubrica da CGTP. 

Os oito acordos de concertação social assinados pela CGTP não ocorreram apenas com governos de “esquerda”: dois foram assinados em 1991 com um governo PSD de Cavaco Silva (onde Marques Mendes até era secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros), três em 2001 com governos PS de António Guterres, um em 2005 com um governo PSD+CDS de Santana Lopes e dois em 2006 com governos PS de José Sócrates. 

“Ah!”, estou já a imaginar ouvir argumentar, “mas esses acordos eram sobre matérias fáceis, como formação profissional, higiene e segurança no trabalho, políticas de emprego, proteção social ou contratação coletiva; não eram sobre matérias difíceis, como aumentos salariais”. 

Não é verdade: para além de, por exemplo, a contratação coletiva não ser propriamente uma “questão fácil”, o último acordo que a CGTP assinou, em 2006, estabeleceu um novo salário mínimo nacional e um compromisso de um ritmo de subida anual desse valor até 2011 — era, portanto, um relevante acordo de rendimentos numa matéria que até costuma dividir o patronato. 

É verdade que a CGTP recusou a esmagadora maioria dos acordos de concertação social que lhe são apresentados, mas, quando as matérias em causa favoreciam claramente os trabalhadores, ela assinou-os. Isso não é ser “responsável”? 

Porém, a experiência da central sindical é amarga: nesse mesmo livro, que citei, a líder de então da CGTP, Isabel Camarinha, explica em entrevista que nenhum dos acordos que a central sindical assinou teve aplicação prática, ou que a que teve foi apenas de uma pequena parcela do acordado. Ou seja, patrões e governos, sistematicamente, não cumpriram o que assinaram em simultâneo com CGTP e UGT. Isso não é ser “irresponsável”? Como podem, agora, pedir mais acordos e a confiança das centrais sindicais? 

A narrativa de que “a CGTP não assina acordos porque está nas mãos do PCP”, que é a mensagem subliminar da tese apresentada por Marques Mendes, desrespeita a história de combatividade da CGTP em favor do mundo do trabalho e procura, na atualidade, motivar a descrença e a desmobilização dos trabalhadores para um protesto que é decisivo para o seu futuro: a luta contra o chamado pacote laboral que até os Trabalhadores Social-Democratas, a corrente do PSD dentro da UGT, recusa, aderindo à greve geral. 

...Também, lateralmente, fico a pensar nisto: se Marques Mendes for eleito Presidente da República, será presidente de todos os trabalhadores portugueses ou será apenas presidente dos trabalhadores filiados na “responsável” UGT? 

Jornalista

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