A questão da imunidade parlamentar e das circunstâncias em que a Assembleia da República (AR) deve autorizar que um deputado seja ouvido como arguido e seja suspenso o seu mandato tornou-se tema de relevante atualidade e interesse. A imunidade parlamentar não é um privilégio pessoal do deputado, mas uma garantia prevista na Constituição da República Portuguesa (CRP) destinada a assegurar aos deputados as imunidades necessárias ao exercício independente do mandato. No seu artigo 157.º, a CRP, estabelece que os deputados não podem ser perseguidos civil, criminal ou disciplinarmente, por causa das opiniões ou votos emitidos no exercício das suas funções. No entanto, esta garantia tem os seus limites, estabelecidos na própria Constituição, quando estiverem em causa indícios fortes da prática de crimes graves..Assim, o artigo 11.º do Estatuto dos Deputados (ED), por decalque do artigo 157.º da CRP, estabelece as imunidades parlamentares dos deputados. Retira-se do n.º 2 do artigo 11.º que o deferimento do pedido de levantamento da imunidade parlamentar que a autoridade judiciária dirija ao presidente da AR para audição do deputado visado, é obrigatório, quando o mesmo seja fundamentado na existência de fortes indícios de prática de crime doloso punível com pena de prisão, cuja moldura máxima seja superior a 3 anos..Ora, se em causa estiver o crime previsto no n.º 2 do artigo 240.º do Código Penal, que tipifica o crime de discriminação e incitamento ao ódio e à violência, que prevê uma pena de prisão de 6 meses a 5 anos para quem, publicamente e por qualquer meio destinado à divulgação, incite à discriminação, ao ódio ou à violência com base em características específicas de pessoas ou grupos, a Assembleia está legalmente vinculada a autorizar que o deputado seja ouvido como arguido..Por seu lado, o n.º 3 do artigo 11.º dispõe que, após a dedução da acusação “definitiva” contra o deputado, sendo que a mesma apenas se torna “definitiva” quando confirmada por um juiz de instrução, por um juiz de tribunal superior quando haja recurso naquela fase, ou, não havendo fase de instrução, quando recebida pelo juiz de julgamento, a Assembleia, quando estejam em causa crimes com moldura máxima superior a 3 anos, está obrigada a proceder ao levantamento da imunidade parlamentar, suspendendo o mandato do deputado suspeito, com vista a permitir o prosseguimento da tramitação do processo-crime em causa..No fundo, o legislador constitucional pretendeu alcançar um equilíbrio entre a proteção da independência dos deputados no exercício de funções e a necessidade de cumprimento da Justiça.