A urgência do possível
Os nossos arquétipos de pensamento falharam e os nossos modos de ação tendem a fracassar também. No campo do pensamento, os modelos, os conceitos e os argumentos que traçámos serviram em determinada época, mas fomos incapazes de lidar com as nossas ações. Criámos cenários e estratégias, mas fomos incompetentes para as abandonar quando mais precisávamos.
Havia, e há, que repensar a relação entre justiça, ou justeza se preferirem, e o fazer. Entre as necessidades materiais e os meios e os modos de como produzimos e fruímos os artefactos. Há que repensar o natural por oposição ao artificial.
As gerações do-it-yourself que viveram e criaram com parca qualidade e baixo custo convidaram ao efémero, ao temporário, ao postiço.
Para resolver tudo isto, e quem diz isto diz o mundo, há que apostar numa política do quotidiano estimulada por criadores ativistas que transformem a normalidade, porque esta está estragada.
Já nos anos de 1980 e 1990 os sociólogos, como Ulrich Beck, Anthony Giddens e Scott Lash, que introduziram o conceito da modernidade reflexiva, apontaram para a crescente evaporação das tradições e por conseguinte do desaparecimento das convenções que geriam os quotidianos comuns. Consequentemente, as escolhas foram, e são, cada vez mais individuais, solitárias e sem recorte. Fizemos e fazemos as nossas histórias, desenhamos a nossa vida, e isto dito assim nem parece mau, mas é. A ausência ou a continuada camuflagem entre o bem e o mal, entre o certo e o errado, entre o natural e o artificial, instala-se e perdura. Estamos perante uma crise dos modos convencionais porque decidimos, governamos e implementamos tudo errado. Todo este texto está inflamado, eu sei, mas sigam o raciocínio: se tivemos de criar um artefacto que limpa os mares, esta necessidade foi apenas uma das consequências de tudo o que fizemos de errado. Não?
O mundo industrial desviou-se amplamente da criação estética, contentou-se a imitar, ao utilizar materiais de substituição que permitem a produção em série a baixo custo. E isto é mau? Eu diria que começa a ser, que estamos já sem ponto de viragem. Diria até que já atravessámos o Rubicão e que não há como voltar atrás. Melhor, precisamos de voltar atrás, mas olhando para a frente.
Contra mim falo, se os designers tiveram responsabilidade na criação do mundo em que vivemos, talvez nos caiba a nós salvá-lo, agora que entrámos na urgência do possível.
Designer e diretor do IADE - Faculdade de Design, Tecnologia e Comunicação da Universidade Europeia