As aplicações de inteligência artificial generativa (IAGen) estão já a provocar uma revolução silenciosa no ensino superior. As suas aplicações são imensas. Com décadas de germinação, a sua popularização veio com o ChatGPT, da OpenAI, em 2022, rapidamente seguido pelo Bart (agora Gemini), da Google, ou do Copilot, da Microsoft, a par de dezenas de aplicações relevantes em todos os domínios das ciências às artes. Isto é apenas o início de algo que transformará profundamente o ensino superior na maneira como os estudantes hoje estudam, investigam e fazem os seus trabalhos, como os professores definem os seus curricula, ensinam e avaliam os seus estudantes e como a instituições universitárias funcionam nos processos de recrutamento e de gestão dos recursos humanos. Deste modo, muitas faculdades e universidades estão já a aprovar orientações pedagógicas para o uso da IAGen. .É hoje possível não apenas resumir mas recriar, através do uso de algoritmos e imensas bases de dados, textos, imagens, músicas completamente novas. Pode transformar-se documentos Word em apresentações PowerPoint e vice-versa. É possível obter resumos de artigos científicos ou resenhas de literatura bem estruturados. Elaborar ensaios ou trabalhos finais de mestrado em várias áreas científicas. Processar com muita velocidade (e muito consumo de energia) imensas quantidades de dados. A IAGen pode ajudar na elaboração de curricula na própria avaliação dos estudantes. .As boas aplicações de IAGen têm, assim, um enorme potencial, mas têm riscos significativos associados e que podem ir contra os valores essenciais das comunidades académicas: integridade ética, excelência académica, inovação e criatividade, inclusão e responsabilidade social e ambiental. .Será que as orientações pedagógicas para as instituições de ensino superior devem ser definidas a nível de cada universidade ou de cada escola ou departamento? Como salvaguardar o valor insubstituível dos professores, mesmo com a utilização generalizada da IAGen? Como é que a IAGen está a mudar o papel dos professores e dos tutores nas faculdades? Quais são as mudanças prováveis nas técnicas de avaliação para serem eficazes, garantirem a integridade e desencorajarem o plágio? Podemos esperar que novas aplicações de IA eficientes detetem o plágio como as usadas até há bem pouco tempo (e. g. URKUND)? Quais são as utilizações razoáveis e não razoáveis da IAGen na avaliação dos alunos, tendo em conta a transparência da sua utilização na avaliação? Será que devemos introduzir a literacia em todos os programas curriculares, formando professores e estudantes? Como corrigir desigualdades de acesso a tecnologias de informação e comunicação, nomeadamente pelo facto que as versões pagas das aplicações terem bastante maior capacidade do que as versões gratuitas? Qual a melhor forma de transmitir aos estudantes a forma como os enviesamentos dos dados influenciam os resultados da IA? Como reduzir o individualismo que pode ser promovido pela IAGen e promover as competências sociais e o pensamento crítico?.Não há respostas simples para estas questões, mas devemos discuti-las e encará-las com frontalidade e sobretudo tornar muito claras, em cada estabelecimento de ensino superior (para não falar no básico e secundário), as regras para o uso ético e responsável da IAGen por parte de todos os atores da comunidade académica..Uma reflexão sobre estes temas é desenvolvida no relatório Generative AI in Higher Education: Challenges and Opportunities, que será lançado e disponibilizado online amanhã pelo Institute of Public Policy - Lisbon (https://www.ipp-jcs.org/), no ISEG, pelas 17.00. Aí teremos a oportunidade de conhecer as reflexões do governo sobre a matéria, através da secretária de Estado da Ciência, bem como a perspetiva, provavelmente diversa, de professores e estudantes.