Ultimamente voltou a debater-se a questão sobre a constitucionalidade da imposição do confinamento obrigatório por razões de controlo de epidemias. Este assunto regressou à agenda pública a propósito do Anteprojeto de Lei de Proteção em Emergência de Saúde Pública, recentemente divulgado pelo Gabinete do Primeiro Ministro. Ainda bem que assim acontece. Agora é possível equacionar o problema de uma forma participativa, aberta e responsável..Aliás, por isso mesmo, o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa já anunciou que, antes da promulgação, a nova lei será enviada para fiscalização preventiva ao Tribunal Constitucional, a fim de se pronunciar sobre as medidas aí previstas e decidir se estão de acordo, ou não, com o articulado da Constituição da República..Sobre o mesmo assunto, em declarações à TSF, Jorge Reis Novais, professor da Faculdade de Direito de Lisboa, apontou a oportunidade, se necessário, para rever "cirurgicamente" o texto constitucional. A ideia é aprovar a futura lei "limpa", na perspetiva constitucional. Portanto, sem inconstitucionalidade alguma..Tema que tem de ser encarado frontalmente, apesar de se reconhecer o melindre que sempre existiu em admitir situações de elevado risco para a Saúde Pública. Imagine-se um doente infetado com Ébola, recém-chegado a Portugal. Imagine-se, também, a identificação laboratorial de nova estirpe do coronavírus de rápida propagação. O que fazer?.CitaçãocitacaoA ideia é aprovar a futura lei "limpa", na perspetiva constitucional. Portanto, sem inconstitucionalidade alguma.esquerda.Ora, a alínea h), do número 3, do artigo 27º da Constituição, claramente, estipula que "a privação da liberdade, pelo tempo e nas condições que a lei determinar" apenas é possível para permitir o "internamento de portador de anomalia psíquica em estabelecimento terapêutico adequado, decretado ou confirmado por autoridade judicial competente.".A estreiteza da sua letra faz desta regra constitucional uma barreira ao controlo da propagação de doenças infectocontagiosas, quer em casos esporádicos quer em epidemias..Nestes termos, a nova lei não poderá prever medidas para interromper cadeias de transmissão de determinada doença contagiosa como o confinamento, por exemplo..O respeito pela constitucionalidade das ações que serão preconizadas pela futura lei teria de implicar a declaração de Estado de Emergência para possibilitar o confinamento de cidadãos com caráter obrigatório, quarentena e, até, o internamento compulsivo de doentes portadores de doença infecciosa. Como, justamente, sucedeu na primavera de 2020..A outra hipótese, seria decidir pela revisão da Constituição, nomeadamente do número 3 do artigo 27º da Constituição que, hipoteticamente, poderia, ter nova alínea com a seguinte redação: a privação da liberdade, pelo tempo e nas condições que a lei determinar, pode contemplar situações para permitir a eliminação de risco de transmissão de doença infectocontagiosa com expressão epidémica e o internamento de portador de doença infectocontagiosa....Se assim fosse acordado, então nada haveria a duvidar da redação do anteprojeto: "a autoridade de saúde pode determinar o isolamento no domicílio, em local adequado de alojamento, estabelecimento de saúde ou estrutura de acolhimento e apoio, por um período que não ultrapasse 14 dias, com a finalidade de afastar o risco para a saúde pública, de pessoa afetada por doença que fundamenta a declaração de emergência de saúde pública"..Ex-diretor-geral da Saúde franciscogeorge@icloud.com