2024, “O Verão Quente” dos Haratines da Mauritânia!
Junho é mês de campanha e eleições presidenciais na Mauritânia, assunto que também nos diz respeito! Porquê? Porque a sorte do processo nos poderá afectar o prato! É verdade, muito do peixe que nos é servido/vendido, vem das águas mauritanianas. Eu próprio, no improviso da oportunidade, desenrasquei uma boleia para Nouakchott, a partir de Rabat, num camião frigorifico que regressava do MARL e tinha como destino um entreposto de pescado, gerido por um português, na capital da Mauritânia. O já falecido Dimas desenrascou muitos estudantes portugueses, sobretudo antropólogos, cujo trabalho de campo obrigava a deslocações, que este português facilitava através dos camiões que semanalmente fornecem o MARL, mas também com um avião de carga deste entreposto de peixe e que numa base quase diária chegou a ligar Nouakchott a Lisboa com canastas de sardinha, corvina, salmonete, anchova e lagosta. É esta a importância da Mauritânia para a felicidade dos portugueses!
29 de junho será dia de braço-de-ferro entre o actual Presidente (PR) Mohamed Ould Cheikh El Ghazouani e “a promessa de mais de uma década”, o anti-esclavagista Biram Dah Abeid! Isso mesmo, o anti-esclavagista do IRA da Mauritânia, a Iniciativa para o Ressurgimento do movimento Abolicionista. Biram e o IRA já eram um “segredo-de-polichinelo” antes da Primavera Árabe (desde 2008), mas é com o surgimento da contestação social na Tunísia e depois Egipto em janeiro de 2011, que o “momento Biram” se temeu na Mauritânia. Porquê? Porque o mesmo representa os Haratines, os “mouros negros”, tradicionalmente escravizados pelos “mouros brancos”, ou ainda, numa tradução colonial, “os escravos libertos” do “affranchi francês”! Os Haratines, representam cerca de 40% da população da Mauritânia, mas não têm noção da sua força em união, pois são a etnia menos instruída e mais distribuída pelo inóspito deserto, logo mais vulnerável à manipulação dos patrões, que instigam à “zizania entre grupos de fazenda”, na materialização das rivalidades entre os senhores da terra, ou apenas pelo “viagra do gozo” que manipular dá!
Biram, um haratine formado em Direito, percebe a visibilidade que a Primavera Árabe poderia trazer à sua causa e “sai do segredo” para abertamente mobilizar a sua etnia no esclarecimento e na necessidade de inscrição para poderem contar. Sem bilhete de identidade e/ou cartão de eleitor, de nada vale protestar. Era esta a condição de 40% da população de país tão próximo de Portugal! Este “Mandela da Mauritânia” foi segundo classificado nas presidências de 2019 e em 2014 entrou na mui exclusiva lista das 10 People Who Changed The World You Might Not Have Heard Of da PeaceLinkLife e uma das 100 Personalidades Mais Influentes do Mundo, no mesmo ano, pela revista Time!
Este é o principal desafiador do actual PR Ghazouani, cujo partido a que pertence, o Partido da Equidade, uma geringonça que junta o União para a República e uma miríade de pequenos partidos fiéis ao actual PR, mantém a confiança no eleitorado que lhes concedeu uma maioria absoluta nas legislativas de 2023, mas as mudanças estão a acontecer do Chade ao Senegal, umas a tiro, outras a poder voto!
Importante, importante, é este processo não cair na dúvida do escrutínio e da “chapelada eleitoral”, que rapidamente se passará do voto à catana, tal é o ranger de dentes dos Haratines, desde que a voz e figura de Biram Dah Abeid os representa e defende, conferindo-lhes a “dignidade do escravo que pode não o ser”!
Bon Courage Mauritânia, Bonne chance oh haratines!