Salvini faz da violação e morte de Desirée uma bandeira anti-imigração
A violação e morte da jovem italiana, que já resultou na detenção de quatro cidadãos, dois senegaleses, um nigeriano e um gambiano, está a inflamar a discussão pública em Itália. Extrema-direita e antifascistas manifestam-se nesta tarde quase frente a frente
Esta não é a primeira vez que um caso de homicídio de uma jovem italiana por um imigrante ilegal se torna um tema político em torno da imigração em Itália. Na noite de 17 de outubro, Desirée Mariottini, de 16 anos, foi drogada, violada e morta por vários homens antes de ser abandonada à morte num edifício desocupado em San Lorenzo, zona de Roma conhecida por ser palco de tráfico de droga, onde ficou dois dias.
Já foram detidos quatro suspeitos, todos eles imigrantes ilegais. Primeiro dois homens senegaleses e um nigeriano. Sexta-feira, o ministro do Interior Matteo Salvini, que dirige o partido de extrema-direita Liga do Norte, depois de apelidar de "vermes" os três suspeitos detidos, dava conta da prisão de um quarto, cidadão da Gâmbia, uma "BESTA", escreveu na sua página de Facebook, "também imigrante africano ilegal". Quanto ao seu destino, foi claro: "Prisão dura e depois casa!"
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Antes de Desirée, em janeiro deste ano Pamela Mastropietro foi brutalmente morta e desmembrada na cidade italiana de Macerata por, alegadamente, um nigeriano, traficante de droga. Salvini usava então o episódio para argumentar que em Itália a imigração estava descontrolada. Pouco mais de um mês depois, em março, o seu partido, coligado com o Movimento 5 Estrelas, formava governo, e Salvini tornava-se ministro do Interior.
A bandeira anti-imigração de Salvini foi, aliás, um dos elementos mais marcantes da campanha da Liga do Norte. Já empossado, o ministro do Interior declarava que a Itália "não pode ser o campo de refugiados da Europa". Em 2017, segundo a Organização Internacional para as Migrações, entraram em Itália por via marítima 120 mil imigrantes. Segundo o governo aceitá-los custou 4,2 mil milhões de euros. A fundação ISMU, que estuda as migrações, estima que atualmente vivam em Itália 500 mil imigrantes ilegais.
Desta vez, o ministro do Interior afirmou, citado pelo Il Messaggero , que se a nova legislação anti-imigração ilegal (aprovada por unanimidade no fim de setembro em conselho de ministros, que ainda terá de ser discutida no Parlamento) já estivesse em vigor, "nada teria acontecido", uma vez que "os cidadãos não europeus que cuja permissão [para permanecer no país] expirou já teriam sido expulsos".
O decreto acaba com os vistos por razões humanitárias e estabelece o perigo social como motivo para expulsar um requerente de asilo. Outra das mudanças que contém é a prisão de um a quatro anos e expulsão com acompanhamento imediato à fronteira para o estrangeiro que tendo sido rejeitado na fronteira regressa a Itália sem uma autorização especial do Ministério do Interior.
Forças opostas manifestam-se hoje em Roma
A tarde deste sábado será tensa em Roma, mais precisamente em San Lorenzo, já que, tendo o caso de Desirée Mariottini como motor, o partido de extrema-direita Forza Nuova convocou uma manifestação entre a Piazza di Porta Maggiore, que segundo o Corriere della Sera deverá contar com centenas de pessoas. Perto dali, na Piazza dell'Immacolata, estarão movimentos antifascistas, como a Associação de Militantes Italianos, defendendo "os direitos civis para todos" e manifestando-se contra um discurso anti-imigração. A polícia romana já fez saber que tem um plano de segurança para evitar que as duas partes entrem em contacto.
Na quarta-feira os ânimos também se exaltaram em San Lorenzo quando Matteo Salvini foi prestar homenagem a Desireée. Alguns chamavam-lhe "Chacal!", enquanto outros lhe manifestavam o seu apoio. "Muita gente está com medo dos migrantes e ele [Salvini] está a tentar pô-los ainda com mais medo", disse Isabella Troisi, uma das ativistas ouvidas pelo New York Times . "Não queremos xenófobos em San Lorenzo" afirmou contundente Carlo Caponi, membro da antifascista Associação de Militantes Italianos Partisans (ANPI). "Defendemos os direitos civis de toda a gente"
Salvini disse então que os edifícios abandonados de San Lorenzo, como aquele em que a adolescente foi encontrada, serão demolidos, e que em fevereiro haverá mais 154 polícias e mais 100 elementos de polícia paramilitar em Roma "graças a um orçamento corajoso que Bruxelas gostaria que mudássemos, mas do qual não vamos mudar nem uma vírgula". O ministro do Interior avisou também que não vão poupar os traficantes de droga, acrescentando que vai acabar "com uma lei idiota do governo de esquerda" que descriminalizou o consumo.
Os media italianos avançam ainda que Salvini convocou um grande ato público contra a imigração ilegal no dia 8 de dezembro em Roma, dia em que na cidade se celebra a Imaculada Conceção da Virgem.