Noite de distúrbios faz várias dezenas de feridos em cidades da Catalunha

Às pacíficas "Marchas da Liberdade", que mobilizaram meio milhão de pessoas, manifestantes entraram de novo em confrontos com a polícia, não só em Barcelona, mas também em Tarragona, Girona e Lleida.
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A praça Urquinaona, palco de confrontos entre manifestantes radicais e pela polícia, foi tomada pelas forças de segurança após a utilização de canhões de água. Antes a polícia tinha recorrido a gás lacrimogéneo e balas de borracha em resposta aos manifestantes que lançavam pedras e outros objetos às forças de segurança, além de pegarem fogo a caixotes do lixo. A polícia deteve 41 pessoas. Há o registo de 77 pessoas feridas na Catalunha, das quais 52 em Barcelona.

A polícia advertiu os cidadãos para saírem dos arredores da praça Urquinaona, na qual continuam "os atos de violência e as barricadas".

Durante os confrontos, o fotojornalista do El País Albert García foi detido e algemado por polícias. Segundo jornalistas presentes no momento da prisão de García, o repórter teria sido acusado de empurrar um polícia quando as forças policiais tentavam impedir que um dos manifestantes participasse dos confrontos no centro de Barcelona.

O ministro do Interior espanhol, Fernando Grande-Marlaska, disse em conferência de imprensa que a manifestação alternativa e violenta junta "cerca de 400 pessoas organizadas". A estes, diz o governante, a lei será "claramente aplicada", tendo lembrado que o crime de agressão à autoridade tem uma moldura penal de prisão até seis anos.

O ministro atualizou o balanço de manifestantes detidos desde segunda-feira, dia em que foi conhecida a sentença dos dirigentes independentistas: há nove pessoas na prisão de um total de 128 detidos.

Se na capital catalã mais de meio milhão se juntou nas ruas, outras cidades registaram manifestações. Lleida contou com 50 mil pessoas, Tarragona com 20 mil e Girona com 9 mil. Ao longo da noite foram registados incidentes, também nestas cidades, com as forças da ordem.

Após uma nova noite de violência, com carros incendiados e confrontos entre pró-independentistas e conservadores, e entre estes e a polícia, que causaram pelo menos 49 feridos e 19 detenções, Barcelona viveu uma greve geral, em protesto contra a condenação pelo Tribunal Supremo espanhol dos 12 dirigentes políticos envolvidos na tentativa de independência da Catalunha em 2017.

Mais de meio milhão de pessoas afluíram às ruas de Barcelona, vindas de outras cidades da região autónoma. Há estradas cortadas, acessos bloqueados e a Sagrada Família, o amado ícone da cidade, foi encerrada aos visitantes. No aeroporto, terão sido cancelados pelo menos 55 voos.

A marcha em Barcelona começou em Jardinets de Grácia e vai acabar na Gran Vía, no cruzamento com o paseo de Gràcia, onde os Comités de Defesa da República convocaram um "acampamento popular" por tempo indefinido. O ambiente é de festa, dizem os jornalistas no local. A Guardia Urbana fala em 525 mil pessoas a assistir à manifestação.

Um ambiente diferente vive-se frente à sede da Polícia Nacional na via Laietana. Ao princípio da tarde havia relato de confrontos entre polícia e manifestantes, com as autoridades a atuar depois de terem sido lançados vários objetos contra os agentes.

A confusão continuava ao final da tarde nesta manifestação alternativa de estudantes e antissistema, com vários detidos e a atuação da polícia antidistúrbios e novos contentores a arder.

Veja em direito as imagens partilhadas pelo jornal El País no YouTube.

Esta manhã, em conferência de imprensa, o ministro do Interior em funções, Fernando Grande-Marlaska, afirmou que nas últimas hora foi feito "um importante número de detenções", oito das quais oito resultaram "em prisões preventivas" por delito de desordem pública e agressão a agentes de autoridade. Barcelona, garante o governante, pode ser visitada "com normalidade". Ministro considerou que os distúrbios são "ocasionais e em lugares concretos", e deixou o aviso: "Não haverá impunidade".

Tsunami Democràtic

A Audiência Nacional espanhola ordenou entretanto o encerramento da página de Internet da plataforma Tsunami Democràtic, que tem estado por detrás das convocatórias para os protestos na Catalunha, sendo responsável pelo bloqueio do aeroporto de Barcelona logo na segunda-feira. A página tsunamidemocratic.cat foi entretanto transformada na democratictsunami.eu.

A decisão foi tomada pelo juiz Manuel García-Castellón e, segundo o El País, em causa está um processo por alegado crime de terrorismo. Castellón é o mesmo juiz do processo que levou à detenção de sete membros das Equipas de Resposta Técnica, a ala mais radical dos Comités de Defesa da República.

A plataforma reagiu passadas umas horas à decisão, falando em "censura" como a que se viu após o referendo de 1 de outubro de 2017 mas lembrando que um tsunami não se pode travar. E indicaram o novo endereço, dizendo ser mais difícil fechá-lo.

Horas antes, a plataforma anunciava os planos para novas iniciativas. "Na segunda-feira, recuperamos a iniciativa e a autoconfiança. Pensaram que a sentença era o fim do movimento, mas era o seu reinício. Hoje paramos o país para lembrar que queremos uma solução e exercer os nossos direitos e liberdades", escreveram, pedindo aos catalães que não consumam produtos das empresas do índice bolsista espanhol. "Deixem de cooerar com a repressão".

Por seu lado, o Tribunal Eleitoral suspendeu a campanha do governo espanhol intitulada "Espanha, a casa de todos"; com um vídeo em que apareciam vários ministros, por considerar que vai contra "o dever de neutralidade que se exige aos poderes públicos em período eleitoral". As eleições são a 10 de novembro e o vídeo, divulgado na segunda-feira, era uma forma de responder às mensagens independentistas e destacar os valores democráticos do Estado.

Apelo de Guardiola

O treinador do Manchester City, Pep Guardiola, que na segunda-feira à noite deu rosto e voz à plataforma Tsunami Democràtic e tem sido um defensor do independentismo, voltou ontem a pedir a ajuda à Europa.

"Não sei exatamente o que vai acontecer hoje no meu país, na Catalunha. É incrível como estão a marchar pacificamente pela Catalunha até Barcelona para dar apoio aos políticos e ativistas presos desde há mais de um ano. Se as pessoas não estivessem convencidos não marchariam milhões e milhões de pessoas de todas as cidades da Catalunha para dar o seu apoio", disse na conferência de imprensa na véspera do jogo com o Crystal Palace.

"A comunidade internacional deve ajudar-nos para resolver o conflito entre Catalunha e Espanha. Alguém, um mediador de fora, deve ajudar-nos a sentarmo-nos e a falar. Esta situação chegou, apesar de soar incrível", acrescentou, alegando que tem "amigos que vão estar novo anos na prisão por pedir para votar".

Em Espanha, o duelo entre o Barcelona e o Real Madrid foi adiado por causa dos protestos na Catalunha. O jogo estava marcado para dia 26 de outubro, mas os dois clubes sugeriram o dia 18 de dezembro. A Liga Espanhola propõe contudo a 4 de dezembro.

Marcha da Liberdade

Os participantes da "Marcha da Liberdade", que partiram a pé no dia 16 de de outras cidades catalãs, como Girona, Vic, Berga, Tàrrega ou Tarragona, e ao longo do percurso provocaram cortes em diferentes estradas e autoestradas da Catalunha, como a AP7 e a A2, chegaram em massa a Barcelona, onde está prevista uma grande manifestação de protesto.

As vias que estão cortadas podem ser vistas a qualquer momento no perfil de Twitter do serviço de trânsito da Catalunha, Tránsit.

Segundo a Guardia Urbana (a polícia de Barcelona), cerca de 525 mil pessoas participam nos protestos.

Os manifestantes cortaram também as estradas fronteiriças. De acordo com o El Mundo , foi cortada a estrafa N-2, próximo da fronteira com França. O acesso a Andorra desde a Catalunha, a N-145, também foi cortado pelos manifestantes. Esta é a única estrada pela qual se pode aceder a este país a partir de território espanhol, diz o El Mundo.

A marcha iniciada no dia 16 foi desencadeada pela organização cívica independentista Assembleia Nacional da Catalunha (ANC), com o apoio do Òmnium Cultural, uma outra organização cívica independentista.

A greve geral foi convocada pelos sindicatos independentistas Intersindical-CSC e Intersindical Alternativa de Catalunya (IAC), também em protesto contra a condenação dos 12 dirigentes políticos.

Já a Unión General de Trabajadores (UGT) e a Confederación Sindical de Comisiones Obreras (CC.OO) demarcaram-se do protesto.

Discursos

No final da marcha, durante os discursos, o atual porta-voz da Òmnium Cultural leu algumas palavras do presidente da entidade, Jordi Cuixart, condenado a 9 anos de prisão. "Não pararemos até conseguir a liberdade", disse. "O direito ao protesto ganha-se protestando e o direito ao voto ganha-se votando", diz a carta. "O povo unido, jamais será oprimido", culmina a missiva.

Elisenda Paluzie, presidente da Assembleia Nacional Catalã, pediu unidade aos partidos independentistas. "Importa-nos muito pouco que deputados terão nas eleições", refere, defendendo uma eventual declaração unilateral de independência. "Pedimos aos partidos independentistas que isto não seja uma manobra de dilatação dos tempos. Se o diálogo não chega, preparem-se para apoiar uma declaração unilateral de independência, nós estaremos aqui para a defender pacificamente."

O presidente da Generalitat, Quim Torra, festejou no Twitter a "força cívica e pacífica do movimento independentista"; com imagens da multidão que participou na manifestação da greve geral.

Voos cancelados

A greve geral provocou até ao momento o cancelamento de 55 voos no aeroporto de Barcelona - El Prat. Destes, 36 são operados pela Vueling, segundo o El Pais . A companhia aérea anunciou esta quinta-feira que não se realizariam preventivamente.

Muitos outros transportes e serviços estão a meio gás na cidade. Segundo o balanço a meio da tarde, o volume de passageiros no metro de Madrid caiu 37% em relação a um dia normal, com uma queda de 50% no período entre as 8.00 e as 9.00 da manhã. Várias estações de metro foram fechadas.

O Supremo Tribunal espanhol condenou esta segunda-feira os principais dirigentes políticos envolvidos na tentativa de independência da Catalunha de há dois anos a penas que vão de 9 a 13 anos de prisão, o que desencadeou movimentos de protesto de grupos de independentistas em todo o território da comunidade autónoma espanhola mais rica.

Os protestos têm-se desenrolado desde então principalmente nas ruas de Barcelona, marcados por episódios de violência, com vários carros incendiados e destruídos, e confrontos entre grupos radicais e as forças policiais.

Pelo menos 100 pessoas foram detidas e quase 200 agentes da polícia ficaram feridos desde o início dos protestos.

Em dia de greve geral, as autoridades da Catalunha estabeleceram os serviços mínimos nos transportes ferroviários em 33% da circulação normal, de acordo com o El País, enquanto o metro e os transportes rodoviários terão de circular a 50%, mas não é certo que isso possa ser cumprido.

Madrid segue com apreensão os acontecimentos e o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, não exclui "nenhum cenário na Catalunha", como fez questão de avisar esta quarta-feira, ao deixar no ar a ameaça de que, se for necessário, atuará com "firmeza, proporcionalidade e unidade".

A porta-voz do Ciudadanos no parlamento, Inés Arrimadas usou o Twitter para criticar os nacionalistas catalães e o governo socialista. "Outro dia de destruição e de confrontos com a polícia (...) Outro dia de imagem horrível de Barcelona e da Catalunha", escreveu.

Mais tarde: "O que sofremos na Catalunha não é uma reação a uma sentença, é fruto de 40 anos de nacionalismo que cresceu e foi doutrinado enquanto os governos de Espanha nada faziam."

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