Partido Aurora Dourada considerado organização criminosa por tribunal grego
Esta é uma sentença histórica e que põe fim a cinco anos de julgamento. O tribunal condenou vários dos membros do Aurora Dourada por liderarem ou participarem numa organização criminosa. Nikos Michaloliakos e seis colegas do partido foram condenados por liderarem um grupo criminoso. O apoiante Giorgos Roupakias foi considerado culpado pelo assassínio de um músico antirracista e outros 15 réus foram condenados por conspiração no caso.
A sentença começou a ser lida cerca das 11.30 locais (09.30 em Lisboa) desta quarta-feira e foi recebida com gritos e aplausos de mais de 15 mil pessoas que aguardavam a decisão na rua, em frente ao tribunal, com faixas onde se liam frases como "Eles não são inocentes" ou "O fascismo não é uma opinião, é um crime". Dois mil polícias estavam no local e acabaram por usar gás lacrimogéneo sobre a multidão.
Os 68 réus incluíam 18 ex-deputados do partido, fundado na década de 1980 como uma organização neonazi, que se tornou a terceira maior força política da Grécia, com 7% dos votos, ganhando assento no Parlamento em 2012, durante a crise financeira registada no país e na Europa.
A decisão judicial baseia-se concretamente em quatro casos: o assassínio do rapper grego Pavlos Fyssas, vários ataques a migrantes, atentados contra ativistas de esquerda e a determinação do tipo de organização (criminosa ou não) que está na base do partido Aurora Dourada.
A decisão faz história na Grécia e no movimento antifascista, já que o tribunal entendeu que os crimes cometidos por líderes e militantes do partido político neonazi foram cometidos sob a proteção e as ordens do Aurora Dourada.
O veredicto mais importante é de que o Aurora Dourada - Chrysi Avgi em grego - é uma organização criminosa. Logo, os seus líderes tinham de ser punidos por dirigirem uma organização criminosa.
Esses líderes eram Michaloliakos e seis colegas, incluindo os ex-deputados parlamentares Ilias Kasidiaris, Ioannis Lagos, Christos Pappas e Giorgos Germenis. Outros membros do partido foram considerados culpados de integrarem uma organização criminosa.
Nikos Michaloliakos, de 62 anos, negacionista do Holocausto e admirador do nacional-socialismo, foi um dos 68 réus do julgamento condenados por um homicídio e duas tentativas de homicídio.
O ativista de esquerda e rapper Pavlos Fyssas foi esfaqueado até à morte na noite de 18 de setembro de 2013, aos 34 anos, frente a um café do seu bairro de Keratsini, um subúrbio de Atenas.
O assassino, um dos líderes do Aurora Dourada, Yorgos Roupakias, admitiu o crime durante o julgamento e pode ser condenado a prisão perpétua.
Além do esfaqueamento mortal de Pavlos Fyssas, os réus no julgamento também foram condenados por outros ataques violentos contra migrantes e oponentes políticos de esquerda.
Cinco membros do Aurora Dourada foram condenados por tentativa de assassínio de pescadores egípcios e quatro por tentativa de assassínio de ativistas comunistas do sindicato PAME.
Além de Mijaloliakos, outros seis líderes do partido foram considerados culpados de liderar uma organização criminosa, e os 18 ex-deputados do partido poderão ser condenados a pelo menos dez anos de prisão.
Dezenas de outras pessoas em julgamento, membros do partido e militantes enfrentam condenações por acusações que variam entre assassínio e perjúrio.
Nikos Michaloliakos, que fundou o movimento em meados da década de 1980, era um admirador do nazismo e um negador do Holocausto, saudando Hitler em comícios do partido.
Oficialmente, o Aurora Dourada negou ser um movimento neonazi, mas o seu emblema lembrava muito uma suástica, alguns membros mais antigos elogiaram Adolf Hitler e as roupas usadas nos protestos contra imigrantes eram camisas pretas e calças da tropa.
A investigação preliminar indicou que o partido operava como um grupo paramilitar, com ordens transmitidas pela liderança do partido a organizações de bairro e a gangues que realizaram ataques violentos a migrantes.
Michaloliakos sempre negou qualquer conhecimento do assassínio de Pavlos Fyssas ou o envolvimento em qualquer outro ato criminoso, mas quando a polícia revistou a sua casa em 2013, encontrou armas e munições.
No julgamento, várias testemunhas disseram que os membros foram treinados para manusear armas e confirmaram que eles usavam símbolos nazis.
Mas durante o curso do julgamento, o Ministério Público recomendou a absolvição de muitos dos membros do partido da acusação de organização criminosa com base em falta de provas.
Apenas 11 dos 68 arguidos estiveram presentes no tribunal, tendo os restantes sido representados pelos advogados. Nenhum dos ex-deputados do Aurora Dourada esteve no tribunal.
O Aurora Dourada nega qualquer ligação direta aos ataques e descreveu o julgamento e as acusações contra a liderança do partido como uma "conspiração sem precedentes", com o objetivo de conter o aumento da sua popularidade.
O primeiro-ministro de centro-direita Kyriakos Mitsotakis escreveu no fim de semana sobre a experiência "traumática, dolorosa e, infelizmente, muito sangrenta" da Grécia com o Aurora Dourada, e elogiou o sucesso democrático do país, que se conseguiu livrar deste movimento, tanto no Parlamento como na vida diária.
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O líder da oposição de esquerda Alexis Tsipras foi inflexível, dizendo que "os membros desta organização criminosa devem ir para a prisão".
Apesar disso, ao mesmo tempo, o cemitério judeu em Atenas foi coberto nesta semana com inscrições antissemitas e slogans nazis.
Nesta quarta-feira, logo de manhã, milhares de pessoas reuniram-se em frente ao tribunal de Atenas a aguardar a sentença, acompanhados por altifalantes a tocar músicas de Pavlos Fyssas.
Os principais partidos políticos gregos estiveram todos presentes na manifestação, incluindo uma representação do partido no poder, Nova Democracia (conservador), e os líderes do principal partido da oposição, a coligação de extrema-esquerda Syriza.
"A guerra contra a violência e o ódio é constante", disse o secretário do Comité Político do Nova Democracia, Giorgos Stergiou, lembrando que foi sob um governo do seu partido que começou o processo contra o Aurora Dourada.
"Hoje, as vítimas e a sociedade recebem justiça", referiu o líder do partido Kinal, de centro-esquerda, Fofi Gennimata. "Estamos aqui porque não há espaço para o fascismo nas nossas vidas", acrescentou.
A organização humanitária Amnistia Internacional, que participou e ajudou a organizar uma rede para registar a violência racista na Grécia, também aplaudiu a sentença, sublinhando que a decisão vai aumentar os esforços daqueles que tentam processar judicialmente os crimes de ódio.
"As acusações contra líderes e membros do Aurora Dourada, incluindo a do assassínio de Pavlos Fyssas, mostram o início do desmoronamento [destas organizações] não apenas na Grécia, mas em toda a Europa", afirmou o diretor europeu da Amnistia Internacional, Nils Muiznieks. "O impacto deste veredicto, naquele que é um julgamento emblemático de um partido de extrema-direita com uma postura agressiva antimigrantes e antidireitos humanos, será sentido muito além das fronteiras da Grécia", sublinhou.