13 março 2018 às 00h12

Médio Oriente campeão da corrida ao armamento

Índia é o país que mais gasta na importação. Arábia Saudita lidera no crescimento de compras. EUA campeões de vendas

César Avó

A Índia é o maior importador de armamento do mundo e os países do Médio Oriente estão numa corrida armamentista liderada pela Arábia Saudita. Os dados são relativos ao quinquénio 2013-17 e foram divulgados ontem pelo Instituto Internacional de Investigação da Paz de Estocolmo (SIPRI, na sigla em inglês), que desde 1950 recolhe e analisa dados de transferências de armas em todo o mundo.

"O aumento do fluxo de armas suscita preocupações quanto ao seu impacto na paz e na segurança internacionais", reagiu o embaixador Jan Eliasson, presidente do conselho de administração do SIPRI. Estes dados "realçam a necessidade de melhorar e de pôr em prática mecanismos internacionais como o Tratado sobre o Comércio de Armas", comentou o antigo presidente da assembleia-geral das Nações Unidas.

Arábia Saudita (com 10% do total de importações), Egito (4,5%), Emirados Árabes Unidos (4,4%) e Iraque (3,4%) são os estados que mais armas compraram no Médio Oriente. As guerras na Síria e no Iémen envolvem quase todos os países na região, o que também explica a lista de compras. Aviões de caça, drones, helicópteros, mísseis e veículos blindados têm sido adquiridos em quantidades impressionantes: mais 103% do que em comparação com o período 2008-2012.

Só o reino da casa de Saud importou 78 aviões, 72 helicópteros e 328 veículos de combate. Um aumento de importações de material militar de 225%. A utilização do armamento em bombardeamentos que desde 2015 têm atingido centenas de alvos civis no Iémen levaram a vários protestos (o mais recente aquando da visita do príncipe Mohammad bin Salman a Londres).

Já o rival Irão, também envolvido nos conflitos na região, mas sob embargo internacional de armas, importou 1% do total no Médio Oriente.

Cerca de um terço da importação de todas as armas (32%) no mundo registaram-se no Médio Oriente, quando no quinquénio anterior tinha registado 18%.

"Há muitas correntes diferentes que alimentam essa corrida de armamentos. Quando se trata das armas químicas na Síria e do programa nuclear iraniano, os dois assuntos foram tratados como questões de puro controlo de armas", comentava ao Guardian, em 2015, o analista de política e segurança no Médio Oriente Tobias Borck. "Quando se trata de observar as nossas vendas de armas - sejam elas britânicas ou norte-americanas ou seja o que for - ela tende a ser vista como uma questão económica interna, que é proteger as nossas fábricas. Isso negligencia as dimensões políticas regionais, com as vendas de armas a decorrer ignorando o contexto e sem uma consciência estratégica de longo prazo", disse o especialista da Royal United Services Institute, think thank britânico dedicado às questões de defesa e segurança.

Um dado a ter em conta: os países com assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas - Estados Unidos, Rússia, França, China, Reino Unido - estão no topo da lista de maiores exportadores de armas. A Alemanha é o único país no top 5 de exportadores - em quarto - que não pertence ao grupo de países com direito de veto na ONU. Juntas, as seis potências totalizam quase quatro quintos das exportações de armamento.

Renovação na Índia

A Índia foi o maior importador mundial de armamento em 2013-17, o que equivaleu a 12% do total global. As suas importações aumentaram 24% entre 2008-12 e 2013-17. Em curso está um programa de renovação militar, até 2025, que ultrapassa os 200 mil milhões de euros.

A Rússia foi o grande fornecedor (62%) das importações da Índia em 2013-17. No entanto, com o aumento espetacular de 557% de importações dos EUA, este tornou-se no segundo maior fornecedor.

"As tensões entre a Índia, de um lado, e o Paquistão e a China, do outro, estão a alimentar a procura crescente da Índia por armas, que continua incapaz de produzi-las", diz Siemon Wezeman, investigador do SIPRI.

O vizinho e rival Paquistão, pelo contrário, importou menos 36% de armas em comparação com o quinquénio anterior. Quem ficou mais a perder foram os Estados Unidos, com uma queda de 76% de encomendas. As compras de Islamabad equivaleram a 2,8% das importações globais de armas.

"A China, pelo contrário, está a tornar-se cada vez mais capaz de fabricar as suas próprias armas e continua a fortalecer as suas relações com o Paquistão, Bangladesh e Birmânia através do fornecimento de armas", nota ainda Wezeman.

As importações chinesas de armas caíram 19% entre 2008-12 e 2013-17. Apesar desta diminuição, Pequim foi o quinto maior importador de armas do mundo em 2013-17, com 4% da fatia global.

As exportações chinesas, por seu turno, ultrapassam já os 5% do total mundial. Uma tendência de crescimento exponencial. Mas ainda muito longe dos números alcançados pelos norte-americanos. Entre os dois períodos em análise vendeu mais 25%, o que coloca o país como fornecedor de 34% de todo o armamento mundial. Apesar de ter quase cem países como clientes, quase metade das armas (49%) têm como destino os países do Médio Oriente.

"Com base em acordos assinados durante a administração Obama, as entregas de armas dos EUA em 2013-17 atingiram o seu nível mais alto desde o final da década de 1990. Esses acordos e outros contratos importantes assinados em 2017 garantirão que os EUA continuem o maior exportador de armas nos próximos anos", indica Aude Fleurant, diretora do SIPRI.