Já está em andamento o processo para tentar realizar o primeiro referendo de Lisboa, cujo objetivo é acabar com o alojamento local em prédios destinados à habitação. Esta iniciativa está a ser levada a cabo pelo Movimento Referendo Pela Habitação, que tem agora de recolher pelo menos cinco mil assinaturas para que a proposta seja levada à Assembleia Municipal de Lisboa (AML), que tem o poder de decidir dar luz verde ou não a esta consulta de iniciativa popular, que se pretende que seja realizada durante o próximo ano..O primeiro passo foi dado a 17 de dezembro no Largo da Graça, onde foram recolhidas cerca de 200 assinaturas. As duas perguntas que o movimento pretende levar a referendo são: "Concorda em alterar o Regulamento Municipal do Alojamento Local no sentido de a Câmara Municipal de Lisboa, no prazo de 180 dias, ordenar o cancelamento dos alojamentos locais registados em imóveis destinados à habitação?" e "Concorda em alterar o Regulamento Municipal do Alojamento Local para que deixem de ser permitidos alojamentos locais em imóveis destinados a habitação?"..Ana Reis da Silva, advogada e uma das porta-vozes do Movimento Referendo pela Habitação, explica que o objetivo da primeira pergunta é "cancelar os alojamentos locais registados em imóveis destinados à habitação", acrescentando que esta intenção "encontra respaldo numa decisão do Supremo Tribunal de Justiça de abril que vem dizer que o desenvolvimento da atividade de alojamento local em imóveis destinados à habitação está numa situação ilegal". Assim sendo, é pretendido que "a Câmara de Lisboa reponha a situação de legalidade, cancelando estes registos que foram concedidos a imóveis destinados à habitação", explica, garantindo que o movimento que representa é "apartidário". "A segunda pergunta visa-se evitar que, no futuro, a Câmara de Lisboa possa voltar a permitir o registo dos alojamentos locais em imóveis com destino à habitação", acrescenta..A ideia de levar esta questão a referendo "é pegar numa possibilidade de os cidadãos poderem exercer a democracia de uma forma direta", defende Ana Reis da Silva, sublinhando que "não foi colocada a hipótese de negociar com a câmara"..E porquê tentar travar o alojamento local em Lisboa? De acordo a porta-voz do movimento, "houve um crescimento muito grande em Lisboa", pois "em dez anos foram registadas mais de 20 mil casas para alojamento local só no município de Lisboa e isso cria pressões no uso que é feito da cidade". "Lisboa é também uma das cidades europeias com mais alojamento local por residente, é a cidade com maior taxa de esforço na habitação", acrescentou, frisando que "Lisboa é ainda a cidade europeia com mais casas por residente".."Nós não enfrentamos um problema de falta de casas, mas sim um problema de uso indevido das habitações existentes, e é nesta leitura conjunta que residem os principais problemas do alojamento local. Nós temos pessoas a serem retiradas dos seus bairros, a terem de ir para a periferia, a saírem do município, o que faz com que haja uma alteração do tecido social, não é só a orientação para a turistificação, mas sim uma substituição de classes sociais por outras", acrescenta a mesma responsável..Este movimento pretende conseguir as cinco mil assinaturas até junho, entregando depois a proposta de referendo na Assembleia Municipal de Lisboa, que terá de criar uma comissão especial que, no prazo de quinze dias, fará um relatório sobre o tema.."Depois o plenário da Assembleia Municipal terá de votar no prazo de 30 dias a contar desde a data da entrega das assinaturas", refere Ana Reis da Silva. "Temos feito, ao longo de quase meio ano, um caminho para que, do ponto de vista legal, não haja nenhum problema nas questões. Daí que estamos em crer que se houver alguma rejeição desta iniciativa ela seja por motivos políticos e não técnicos.".Caso seja aprovado pelos deputados municipais, a AML tem oito dias para enviar para o Tribunal Constitucional, que por sua vez tem 25 dias para decidir sobre a realização do referendo. Um prazo que pode ser estendido caso o tribunal coloque questões aos organizadores. Aprovado pelo Constitucional, regressará à AML, que terá então cinco dias para marcar a data do referendo. "Estamos a ver se conseguimos que ele se realize para o ano, pois não pode coincidir com outros atos eleitorais, e em 2024 são as europeias e em 2025 as autárquicas", sublinha a advogada..ana.meireles@dn.pt