A política europeia é, para muitos, uma bolha. É algo que acontece lá longe, em Bruxelas, que envolve vocabulário próprio, siglas incompreensíveis que só quem está lá dentro percebe, um sistema de tomada de decisões complexo e aparentemente afastado do dia a dia. “Nós estamos a viver numa bolha, mas a tentar rebentar essa bolha. E o Summer CEmp dá-nos as farpas de que precisamos para o fazer, dá-nos a energia para voltar a casa e mobilizar outros jovens para rebentar mais bolhas”, explicou João Maria Botelho, de 22 anos..O jovem jurista, que terminou o curso na Nova School of Law e uma formação intensiva de Direito em Regulação das Alterações Climáticas na Universidade Católica, falou à velocidade dos inúmeros projetos que tem em mente. Isto apesar do cansaço dos quatro dias de palestras, encontros e trocas de ideias na escola de verão da Representação da Comissão Europeia em Portugal, que reuniu 40 jovens motivados como ele em Miranda do Douro no fim de agosto..“Era o meu terceiro ano a tentar participar e superou todas as minhas expectativas”, contou ao DN no autocarro de regresso a Lisboa. “São dias fantásticos a falar com imensas pessoas de renome. O Presidente Marcelo Rebelo de Sousa esteve num dos Sunset. Pudemos falar com a maior figura do Estado, o poder moderador, o garante das instituições democráticas quase sem filtro. Não é a mesma coisa do que estar num evento 100% formal”, referiu. “O programa começa às oito da manhã e acabamos por só ir dormir já de madrugada, porque ficamos à conversa com os oradores, os mentores, depois já estamos a falar de experiências de vida, do futuro da Europa e do mundo...”.O Presidente Marcelo Rebelo de Sousa foi um dos convidados do Summer CEmp. FOTO: Representação da Comissão Europeia em Portugal.Mas não é só nos convidados - de eurodeputados a ex-governantes, de professores universitários a peritos europeus, passando por jornalistas, empresários ou músicos - , que João Maria encontra inspiração. Os restantes jovens também. “São quatro dias intensivos em que chegamos ao fim e dizemos uns aos outros: ‘Epá, sinto que já te conheço há imenso tempo.’ Já recrutei duas ou três pessoas para o meu grupo internacional, o Generation Resonance, que desafiado pela Associação das Nações Unidas em Portugal criou um projeto para a COP 28, a Conferência do Clima no Dubai.”.O mais recente projeto desse grupo é o podcast Tomorrow Talks, que fala de sustentabilidade, diversidade, inovação, inclusão e não só, entrevistando de deputados a CEOs para “capacitar os jovens” a “ajudar a desmistificar a ideia de que ‘nunca poderão ser como eles’.” João Maria disse ver muitas diferenças e muitas similitudes com os projetos dos colegas: “E o giro foi dizer: deixa-me ajudar-te, deixa-me promover o teu trabalho, vai lá falar ao meu podcast, eu falo do teu. E já estamos a combinar encontros.”.Fazer parte da mudança.Tânia Mata de Freitas tem 28 anos e acabou em julho um mestrado em Barcelona em Sustainable Business e Innovation. A ida ao Summer CEmp, antes de voltar a Barcelona para trabalhar, foi fruto de um acaso, algo que pensou “porque não”, quando surgiu a oportunidade. “Eu sempre fui uma apaixonada por geopolítica, sempre fui a menina de 9 anos a discutir sobre política nas mesas de Natal com a família”, referiu..A experiência internacional, que também já passou por Londres, faz com que tenha “uma visão mais completa, mais holística” do mundo. “Eu quero ser não só uma pessoa de opinião, mas uma pessoa de ação, de mudança. É necessário uma mudança sistémica nas nossas sociedades, e acredito que posso fazer parte dela”, explicou..Para ela o Summer CEmp é um local onde “jovens inacreditáveis” podem criar relações e estar em contacto com diferentes pessoas e fazer algo muito positivo. “Somos jovens muito proativos, não somos comodistas, queremos mudança, queremos agir, não estamos à espera de que os outros façam por nós, e sabemos que a melhor maneira de construir algo melhor é juntos”, lembrou, admitindo que ainda não lhe tinha “caído a ficha” para toda a experiência..Para Tânia foi interessante ouvir oradores de outras cores políticas. “Obviamente que tenho uma visão, uma ideologia política, mas sempre fui alguém que respeita todas as opiniões, acho que foram os valores que me foram colocados desde pequenina”, disse. Ao ouvir opiniões diferentes, “há logo uma tendência de resistência, de desconhecido”, mas no final “percebemos que são só pessoas, são seres humanos, com percursos inacreditáveis, com uma simpatia e uma empatia inacreditável.”.Tânia deixou um desafio: “Às vezes devemos parar de olhar para cores políticas. Acho que temos de pensar em conjunto como é que podemos ajudar e mudar o nosso sistema para o melhor de todos. Há valores, eu acho, com que todos concordamos, ou com que a maior parte de nós concorda, e é nisso que temos de nos focar, é isso que temos de defender e é por isso que lutamos todos os dias.”.A representante da Comissão Europeia em Portugal, Sofia Moreira de Sousa, e a presidente da Câmara de Miranda do Douro, Helena Barril. FOTO: Representação da Comissão Europeia em Portugal.Saudade.José Afonso Garcia tem 24 anos e está a estudar Engenharia Informática, no Instituto Superior Técnico, em Lisboa. “Não tem nada a ver com política, mas o Summer CEmp é aberto a tudo”, contou ao DN, já uns dias depois de regressar a casa. O antigo presidente da Associação Académica da Universidade de Lisboa, agora ocupado a lançar uma startup, revelou que já falou a todos os amigos do Summer CEmp, desafiando-os a participar. .“Foi a melhor experiência política que tive, em termos de um evento super bem organizado, em termos de conteúdo e até em termos de pessoas, porque senti que eram jovens cheios de potencialidades e, sinceramente, depois de chegar a casa há um sentimento muito forte de saudade”, admitiu. “Saudade é uma palavra que só existe no dicionário português e, dentro de todas as línguas da União Europeia, é a única que consegue descrever na perfeição o sentimento de pós-evento. Talvez este seja um dos nossos contributos para a união, adicionar “saudade” ao léxico europeu.”.Apesar de ter nascido em Lisboa, José cresceu em Trás-os-Montes, não muito longe de Miranda do Douro. E elogiou o facto de este evento decorrer longe da capital, em locais que parecem (mas não estão) ainda mais longe da União Europeia. “Acho que serve para lembrar aos jovens e também aos locais que a Europa é qualquer vila, qualquer local. Porque qualquer vila que existe em Portugal beneficiou do projeto europeu e faz parte do projeto europeu”, disse. .“Sou jovem mas sei bem os meus valores, sou Europa pintada de mil cores, sou conversas com quem me faz crescer, sou oportunidade de aprender. Sou parte da UE-É-É-É”, diz a música que o cantor Pedro Gonçalves escreveu como hino para o Summer CEmp. Finda a sétima edição, já se pensa na oitava..susana.f.salvador@dn.pt