"O primeiro a ir, o último a voltar. Não vamos parar até voltares.” Foi esta a mensagem que a mãe de Ran Gvili deixou no Facebook a 4 de dezembro, quando se tornou oficial que ele era o último refém israelita ainda na Faixa de Gaza depois de o Hamas devolver mais um corpo. Israel recusa avançar para a segunda fase do cessar-fogo sem o regresso de Ran - um polícia de 24 anos que morreu a proteger o kibbutz Alumim no ataque de 7 de outubro de 2023. Para garantir que o filho não fica esquecido, Talik Gvili viajou para os EUA com o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, que esta segunda-feira, 29 de dezembro, tem previsto reunir-se com o presidente Donald Trump na Florida. A primeira fase do cessar-fogo entre Israel e o Hamas, com base no plano de 20 pontos de Trump (endossado depois pelo Conselho de Segurança da ONU), entrou em vigor a 10 de outubro. Previa a libertação de todos os reféns, vivos e mortos, e de quase dois mil presos palestinianos, o aumento da entrada de ajuda na Faixa de Gaza (as organizações humanitárias queixam-se que ainda é insuficiente) e a retirada das tropas israelitas para a “linha amarela”, mantendo o controlo de mais de 50% do enclave.O cessar-fogo é frágil e ambos os lados acusam-se mutuamente de constantes violações - segundo as autoridades de Gaza, controladas pelo Hamas, mais de 400 palestinianos morreram em 875 violações da trégua por parte das Forças de Defesa de Israel (IDF, na sigla em inglês). O facto de Ran Gvili ainda não ter sido devolvido a Israel (o Hamas avisou logo que teria dificuldade em encontrar alguns dos corpos no meio das ruínas) é uma ferida em aberto, mas não é o único obstáculo para a próxima fase do cessar-fogo - que muitos acreditam poder começar já em janeiro.O plano de Trump prevê a criação de uma força de estabilização internacional, mas esta continua sem mandato claro e sem efetivos. Diz-se que Azerbaijão, Indonésia e Paquistão podem desempenhar um papel, no entanto Israel quer ter a última palavra e rejeita, por exemplo, a presença de tropas da Turquia. Nada está ainda fechado. Netanyahu expressou há dias ceticismo de que esta força seja capaz de desarmar o Hamas - o grupo terrorista palestiniano ainda nem sequer aceitou entregar todas as suas armas. Israel só admite recuar até à “linha vermelha”, ainda dentro do enclave, se isso acontecer. A segunda fase do cessar-fogo prevê também a formação de um governo tecnocrata palestiniano, para assumir a gestão corrente na Faixa de Gaza, que deveria ser supervisionado por um Conselho de Paz liderado pelo presidente norte-americano. Mas nem a composição do primeiro (ainda há dúvidas sobre se a Autoridade Palestiniana poderá ou não ter lugar à mesa), nem a do segundo, foram tornadas públicas.Trump disse que o Conselho será anunciado no início de 2026, parecendo claro que o ex-primeiro-ministro britânico, Tony Blair, o único outro nome que se tinha falado, já não fará parte, devido à oposição de vários países árabes.Com tantas dúvidas, é baixa a expectativa de que a segunda fase possa avançar rapidamente assim que o Hamas devolver o último refém - e há quem alegue que o grupo terrorista está a atrasar o processo para evitar, precisamente, ter que avançar.Israel diz-se confiante, mas também deixou claro que se o Hamas não desarmar de uma forma pacífica, irá retomar as ações militares - e não tem hesitado em recorrer à força mesmo em pleno cessar-fogo, para responder ao que percebe como ameaças. O receio é que a situação fique congelada como está. Isso faz com que, do lado israelita, haja receio de que o Hamas possa preparar outro 7 de Outubro. Já do lado palestiniano, teme-se que as IDF nunca deixem totalmente Gaza - antes do Natal o ministro da Defesa, Israel Katz, admitiu isso, mas negou que pudessem ser criados colonatos - e que a reconstrução nunca avance..Katz admite que Israel não sairá da Faixa de Gaza, mas depois volta atrás.A situação no enclave estará em cima da mesa na reunião desta segunda-feira entre Trump e Netanyahu em Mar-a-Lago - o primeiro-ministro faz até 4 de janeiro a quinta visita aos EUA num ano. Mas não será o único item da agenda: Síria (onde Israel continua a efetuar bombardeamentos), Líbano (onde há um impasse no desarmamento do Hezbollah) e Irão (que voltou a realizar testes de mísseis) devem ser temas de conversa. “Obviamente que será um tema das nossas discussões”, disse Netanyahu sobre o Irão, alegando que Israel “não está à procura de confronto” mas “estabilidade, prosperidade e paz”.