Como é que está a popularidade de Donald Trump neste momento entre os americanos?Há áreas da sua política interna em que continua popular. Mas há outras, que são as mais importantes, em que realmente está com dificuldades. Portanto, o que temos visto é, aquelas sondagens que nos mostram a taxa de favorabilidade do presidente, mostram claramente um padrão de declínio, mas sobretudo na questão da política tarifária, ou seja, na economia. Menos noutras questões, ou seja, há questões que continuam a dividir completamente o país, como é a migração. E temos mais ou menos sensivelmente metade do país que acha que estes métodos mais agressivos, por exemplo, da agência ICE na captura de imigrantes indocumentados, estão muito bem, e temos outra metade do país que está completamente horrorizada com este tipo de avanço sobre uma população que não considera perigosa.É aquilo que tem a ver com a economia o que mais desilude os apoiantes do presidente Trump?Obviamente. E agora a isso juntou-se o escândalo Epstein. É um escândalo à direita e é um problema à direita para Donald Trump. Porquê? Porque pela primeira vez Trump vê-se sem conseguir controlar a mensagem dentro do seu próprio movimento, dentro do seu próprio partido. Sobretudo na questão de Epstein, ele tem tentado de todas as formas mudar de tema, avançar deste caso, mas é a própria base que não permite fazê-lo. E parte disso deve-se ao facto de que Trump deu um tiro no próprio pé, ou seja, utilizou a teoria da conspiração sobre Epstein contra os democratas como um dos seus argumentos para trazer aquele bloco de eleitores que é mais dado às teorias da conspiração para o seu lado. Aqui também há aquela dinâmica do populismo que é, Trump apresenta-se como alguém que conhece a elite, mas é anti-elite. Alguém que, na verdade, é a voz do povo contra as elites de Washington. E, portanto, estas ideias esbarraram dentro do movimento porque pela primeira vez temos Donald Trump a, basicamente, dizer, “aquelas teorias todas que vocês tinham sobre as elites políticas e económicas e os abusos sexuais de menores e por aí fora, toda essa teoria da conspiração, enfim, vocês estão olhando para o lado errado, isso não tem nada a ver”. Ou seja, dá a impressão de que Trump está a tentar ajudar essas mesmas elites, a tentar encobrir os seus nomes. Portanto, há aqui uma pressão dentro do partido em que o movimento MAGA, amplificado pelas vozes dos influencers do movimento de direita, Tucker Carlson, por exemplo, ou Joe Rogan, que têm milhões de seguidores, e que não deixam que este tema caia por terra, mesmo com o presidente, basicamente, a dizer que não há nada a ver aqui. Portanto, este é um momento inédito para Donald Trump. Na questão das tarifas, ele também não conseguiu persuadir, nem mesmo a sua base, de que a política tarifária que tem proposto se vai traduzir em resultados positivos na economia. Portanto, apesar do presidente tentar sempre colocar a mensagem no positivo e estar a tentar dizer ao país, e isto é um facto, eu vi os dados do Departamento de Tesouro para o mês de julho, que o valor que os Estados Unidos arrecadaram em tarifas alfandegárias foi mais do dobro do ano passado, durante o mesmo mês, porque realmente as tarifas subiram. Trump tem falado imenso sobre isso, que “estamos a receber tanto dinheiro, nem sabemos o que faremos com este dinheiro”, ou seja, com esse dinheiro podem até enviar cheques às pessoas para perceberem que há aqui um dividendo, mas nem isto tem persuadido os americanos.Portanto, a política externa, ou seja, o que se passa no Médio Oriente ou na Ucrânia, não é assim tão importante para a popularidade de Trump? Até agora não era, mas também já começamos a ver cisões, mesmo dentro do movimento MAGA, sobre a questão de Israel. Chegamos a uma conjuntura no conflito em que a pressão pública é tal, que já vemos membros do Partido Republicano, muitos deles verdadeiros aliados do presidente Trump, estou aqui a pensar em Marjorie Taylor Greene, que é absolutamente dedicada ao movimento MAGA e ao presidente, e vem para as redes sociais chamar o que está a acontecer em Gaza de genocídio, e basicamente a ir contra a linha da Casa Branca.E a incapacidade também de Trump em obter resultados na Ucrânia, de convencer a Rússia a fazer a paz, isso também mexe com o movimento MAGA?Mexe menos do que o que acontece internamente nos Estados Unidos, mas isso é verdade não só para o movimento MAGA, é verdade para o eleitorado americano em geral, que é sempre muito mais virado para a política doméstica do que para a política internacional. Temos decisões do presidente, algumas delas impetuosas, como a decisão de avançar com o bombardeamento das supostas bases nucleares no Irão, que vieram dividir o próprio Movimento MAGA. Há uma parte do movimento que não quer que a política externa dos Estados Unidos seja intervencionista, quer que os Estados Unidos se virem mais para os seus problemas domésticos, que diz, “not our problem”, aquela ideia de que os Estados Unidos não têm que ser o polícia do mundo, têm que defender os interesses dos americanos e só intervir quando a defesa e a segurança dos americanos estiver completamente em questão. Portanto, também aí, o presidente também não fez o trabalho de base para criar algum consenso dentro do seu partido e dentro do seu movimento, e junto com do eleitorado. Trump não tem paciência para isso.Os democratas estão a aproveitar estas divisões no MAGA, a pensar nas intercalares de 2026? O partido está a preparar-se para recuperar a maioria no Congresso e fazer uma verdadeira oposição às políticas de Trump?O partido está-se a preparar, e claramente as eleições de 2026 e as de 2028 já arrancaram. Mesmo as presidenciais de 2028 já arrancaram, ou seja, já temos Super PACs criados para apoiar potenciais candidatos, a maioria deles governadores de estados democráticos, ou de estados púrpura, os que podem oscilar para um lado ou para o outro. Para 2026, isso começou imediatamente depois das eleições do ano passado, porque em causa estará o Congresso, mas sobretudo a Câmara dos Representantes, que é a mais provável de ser retomada pelos democratas e dar-lhes realmente algum espaço de manobra para fazer oposição dentro do Congresso à plataforma de Trump. Mas se me perguntar se há um líder óbvio, ou uma estratégia clara de contra-ataque a Donald Trump, se há, ainda não transpareceu para fora.Se não há estratégia, pelo menos, há nomes previsíveis para tentar a Casa Branca em 2028?Há nomes óbvios. Por exemplo, Pete Buttigieg claramente quer concorrer para a presidência, mais uma vez. E digo isto porque o Super PAC dele só nos primeiros seis meses deste ano arrecadou mais de um milhão e meio de dólares. Portanto, é um candidato forte. Mas que também tem alguns desafios em termos do seu perfil pessoal, perante um eleitorado americano que é bastante conservador, pois Pete Buttigieg é gay, é casado e tem filhos adotados, mas é realmente uma figura com muito carisma.O governador da Califórnia também é hipótese?Gavin Newsom já anda há muito tempo a preparar-se para uma corrida nacional, portanto, é uma hipótese. O próprio Tim Walz continua a ser hipótese, e Gretchen Whitmer, governadora do Michigan, quase com certeza também concorrerá a essas eleições.A ex-vice-presidente Kamala Harris já pertence ao passado?Kamala Harris deu uma entrevista há dias ao Stephen Colbert em que mostrou desinteresse pela corrida a governadora da Califórnia, mas deu uma resposta ambígua em relação a 2028. É possível que ainda se venha a candidatar. Tenho falado em candidatos prováveis, mas temos de levar em conta que pode haver aqui uma jogada a dois níveis, que é, o partido faz aquilo que sempre fez, e do lado republicano também, ou seja, há aqueles players que jogam dentro das regras do partido, e que são os candidatos do partido, mas estamos num ambiente nos Estados Unidos em que prevejo que vamos ter candidatos que não são necessariamente as escolhas do partido..Estamos a falar dos dois partidos?Sobretudo do Partido Democrata, também podemos ver isso no republicano, mas é mais provável no democrata, ou seja, aparecer o tal Progressive Candidate, com uma boa dinâmica…Na lógica de Bernie Sanders em 2016, a desafiar Hillary Clinton?Exatamente, já não será Sanders, tem-se falado na AOC, mas não tenho a certeza que ela esteja preparada para esse palco. Há ainda uma cisão dentro do Partido Democrata que é bastante óbvia, que é geracional, ou seja, entre as pessoas mais velhas e que têm a liderança do partido e os jovens, e é política, ou seja, entre aquela esquerda mais ao centro e aquela esquerda mais à esquerda. Estes candidatos, o Pete Buttigieg, a Gretchen Whitmer, até mesmo o Tim Walz e o Gavin Newsom, são aqueles candidatos tradicionais, de certa maneira, os candidatos que o partido, sobretudo os líderes partidários, obviamente estariam dispostos a fazer avançar. Mas temos visto este movimento paralelo liderado por Sanders e por AOC percorrer o país e a ter encontros gigantescos com milhares de democratas que aparecem com sede real de mudança na liderança.É como se fosse um MAGA invertido? Um Tea Party à democrata?É parecido com o que aconteceu no movimento MAGA em 2008, em que havia realmente uma desilusão da base com partidos. E essa desilusão, primeiro, manifestou-se através do Tea Party Movement, e depois o partido tentou agarrar naquele movimento, institucionalizá-lo, mas nunca conseguiu, porque era, na verdade, um movimento anti-partido, queria transformar o próprio partido. E até aí podemos ter uma comparação, há uma desilusão com a liderança do Partido Democrata, há uma desilusão com a falta de oposição forte a Donald Trump, e cada vez mais parece haver um movimento à esquerda de pessoas que eram muito centristas, mas que agora têm tanta vontade de ver essa reação, que se estão a alinhar com as novas vozes do partido, o lado mais progressista. Ainda não tivemos nenhuma eleição, ainda não temos nada concreto que nos mostre que essa intenção de voto se vai manifestar em 2026, mas ficaria muito surpreendida se não tivéssemos aquela mesma estratégia que o Tea Party seguiu em 2010. Ou seja, em 2010 o que é que o Tea Party fez? O partido propunha um candidato, mesmo nas primárias, e o Tea Party Movement propunha outro. E foram conseguindo criar aquele Tea Party Caucus dentro do Partido Republicano. E agora, para 2026, o momento é muito parecido nos democratas em termos da dinâmica emocional, psicológica, política, dentro do partido, com esta desilusão entre o eleitorado e o partido.Em 2028, no pós-Trump, como é que imagina o Partido Republicano? O vice-presidente JD Vance avança?A dinâmica é um pouco diferente, porque Trump é uma força centrífuga tão forte dentro do partido, que apesar de já haver candidatos óbvios para 2028, todos eles andam com pezinhos de lã. JD Vance é um deles, Marco Rubio, o secretário de Estado, é outro nome óbvio, Sarah Huckabee Sanders, cujo pai é o embaixador em Israel neste momento e ela vem do Arkansas, também é outro, há muito tempo se fala também de Glenn Youngkin, e na verdade todos eles já têm Super PACS, já estão a fazer angariação de fundos, já estão em pré-campanha..Um democrata e um republicano unidos pelas raízes açorianas e pela fé no sonho americano.Trump vai ter uma palavra decisiva nessa escolha ou não?Pode ter e pode não ter. Eu sei que é o pior tipo de resposta, mas é a única possível. O que Trump também nos mostrou, por exemplo, nas últimas intercalares, em que se esperava que o Partido Republicano, isto há três anos, 2022, conseguisse limpar tudo, pois Donald estava a apoiar vários candidatos, é que o carisma e a ligação que Trump tem com a sua base aparentemente não é transferível.Trump pode ser um trunfo para um candidato, mas também pode ser uma dificuldade?Exatamente. Um sucessor que não é visto como um sucessor. É a questão do carisma, é a questão da ligação pessoal que o eleitor sente com esta pessoa, da confiança que se cria, não com o partido, mas com a pessoa em si.Acresce que nem Vance nem Rubio têm um historial de lealdade desde sempre a Trump, não é?Eles têm aqui um dilema. Há um dilema à direita para estes candidatos. É que, por um lado, todos percebem que não podem pisar o risco. Não podem fazer o que fez Nikki Haley, que concorreu contra Trump nas primárias. Ela tentou, como dizem os americanos, “to have her cake and eat it too”. Ela tentou essa estratégia de, basicamente, dizer sim, sim, o presidente não fez nada muito errado, mas, na verdade, eu teria tomado as decisões de uma forma diferente. Isso não funcionou.Apesar de tudo há uma diferença, ela tinha que derrubar o presidente e estes agora já só têm que conseguir que ele não seja contra eles, não é?Mas aí está a questão. É se realmente o apoio de Trump é algo que é transferível. E em 2028 também não sabemos o que é que vale o apoio de Trump. A menos que seja uma pessoa com o nome Trump.Essa também é uma hipótese? Está a falar de um dos filhos?Exatamente. Ele tem dois filhos e uma filha na ribalta. E o Júnior, claramente, tem-se mantido muito envolvido na dinâmica interna do partido e do movimento.E na América não é tão estranho assim. Porque Hillary Clinton era a mulher do Bill. E George W. Bush era filho de um presidente. E houve os dois Adams...Esta ideia do legado familiar não é uma loucura. É algo até normalizado. A questão para o Partido Republicano é que Trump criou uma nova coligação. Têm que manter essa coligação para poderem vencer com as mesmas estratégias. Precisam não só daqueles blue collar workers do Ohio e da Pensilvânia e do Michigan, mas também precisam de todos aqueles eleitores que ficavam sempre em casa, que tinham uma apatia quase completa do processo e que foram ativados por Trump.Não lhe parece provável que Trump queira realmente concorrer a um terceiro mandato, como chegou a deixar no ar?Pode tentar, certamente. Mas nesse aspeto a Constituição é tão clara que parece impossível que o Supremo Tribunal, mesmo um muito favorável, conseguisse contornar os artigos que se referem a esse limite de dois mandatos. Mas Trump, claramente, quererá que o seu legado continue. Eu lembro-me perfeitamente que, no início deste mandato, lhe perguntaram se JD Vance era o candidato óbvio que ele apoiaria. E a resposta dele foi esquivar-se. Ou seja, foi talvez sim, talvez não..Congressistas democratas do Texas 'fogem' para bloquear mudanças nos círculos eleitorais