As eleições foram na Extremadura, mas a leitura dos resultados é nacional. O PSOE do primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, sofreu um descalabro numa região historicamente socialista, perdendo dez deputados na Assembleia regional em apenas dois anos e meio. Já o Partido Popular (PP) de Alberto Núñez Feijóo venceu, mas ficou aquém da maioria absoluta que queria e volta a ficar dependente de um muito reforçado Vox, de Santiago Abascal, que duplicou o número de representantes. “Fica claro que não há governo de direita sem o Vox”, disse ao DN o politólogo Diogo Noivo, explicando que estas eleições mostram um PP cada vez mais dependente da extrema-direita. Isto numa altura em que o Vox está mais radical, depois da saída da ala mais liberal-conservadora, em rota de colisão com a direção atual. “A direção do Vox é quase tão anti-PP como anti-PSOE. E, portanto, o Vox está a tornar muito difícil que haja um entendimento com o PP”, contou o também colunista do DN.“Neste momento, a nível nacional, a direita tem votos suficientes para uma maioria absolutíssima”, referiu Diogo Noivo, lembrando que nas últimas legislativas os dois partidos tiveram mais votos juntos do que Mariano Rajoy quando ganhou a maioria absoluta. “Só que agora a direita está dividida em dois e os dois partidos têm cada vez mais dificuldade em entender-se.” Isso também deverá ficar claro na Extremadura. Vencedores e vencidos.A presidente da Junta e candidata do PP, María Guardiola, venceu as eleições antecipadas de domingo, subindo de 28 para 29 deputados. Mas o seu objetivo ao convocar as eleições não foi alcançado, ficando a quatro representantes da maioria absoluta que lhe permitiria ficar livre da extrema-direita. O Vox, com a candidatura de Óscar Fernández, ganhou mais 40 mil votos do que em 2023 e duplicou o número de deputados - de cinco para 11.Mas o acordo entre os dois partidos não é um dado certo. O braço de ferro entre ambos ficou claro logo na noite eleitoral. Normalmente o vencedor das eleições é o último a reagir aos resultados, mas parece ter havido uma primeira demonstração de força - o tempo passava e nem Fernández nem Guardiola saíam para falar aos apoiantes e jornalistas. No final, ela acabou por falar primeiro, com o líder regional do Vox a apresentar-se depois como o “vencedor real”..Abascal disse esta segunda-feira (22 de dezembro) que “a bola” está “no telhado” de María Guardiola, não excluindo a possibilidade de o Vox exigir entrar no governo da Extremadura para poder apoiar o PP - houve uma aliança em 2023, que acabaria por ruir um ano depois. Mas disse que cabe à presidente da Junta decidir o que quer fazer, nomeadamente se quer um pacto com os socialistas - só precisa de maioria simples para ser eleita numa segunda volta, o que é possível com a abstenção do PSOE. “Espero que o Vox compreenda o que a maioria dos espanhóis nos dizem. Que não se enganem de adversário nunca mais. O adversário não é o PP. É um governo que degradou a política”, disse Feijóo, após a reunião da direção nacional do partido para analisar o resultado da Extremadura. “O declínio irreversível do PSOE ainda agora começou”, acrescentou, insistindo que os espanhóis “não querem mais sanchismo”.O descalabro do PSOE.Extremadura: PP fica aquém da maioria absoluta e depende de um Vox que sai reforçado. Descalabro no PSOE.O grande derrotado da noite eleitoral foi o socialista Miguel Ángel Gallardo, que conseguiu o pior resultado de sempre para o PSOE na Extremadura (que governou em 36 dos últimos 42 anos). Perdeu mais de cem mil votos (nem ganhou na sua terra natal) e caiu de 28 para 18 deputados. Esta segunda-feira (22 de dezembro), Gallardo apresentou a demissão como secretário-geral regional, depois de na noite eleitoral ter logo admitido que o resultado era “muito mau”. A coligação Unidas pela Extremadura não conseguiu aproveitar o descalabro socialista, apesar de ter subido quase 18 mil votos e de quatro para sete representantes na Assembleia regional. Esta coligação une Podemos, Esquerda Unida e Verdes, mas não o Sumar da vice-primeira-ministra espanhola, Yolanda Díaz, que não foi a votos numa região onde não tem implementação. O parceiro do governo mostra-se contudo cada vez mais preocupado com a situação, tendo criticado o primeiro-ministro por continuar a agir como se não tivesse acontecido nada. “Tem ar de negação da realidade”, indicou a coordenadora do Movimento Sumar, Lara Hernández. “A inação não é opção frente ao avanço reacionário”, disse também o coordenador federal da Esquerda Unida, Antonio Maíllo. Esta segunda-feira (22 de dezembro), Pedro Sánchez fez uma declaração ao país, mas apenas para nomear uma nova ministra da Educação, Formação Profissional e Desporto - Milagros Tolón Jaime - e uma nova porta-voz do Governo - a ministra da Inclusão, Segurança Social e Migrações, Elma Saiz Delgado -, depois da demissão de Pilar Alegria (que ocupava os dois cargos) na semana passada. Em momento algum referiu as eleições na Extremadura, ou o mau resultado do PSOE. “O governo de coligação progressista encara esta etapa com entusiasmo, energia renovada e espírito renovado, pronto a lutar pelo avanço de cada iniciativa com vontade de diálogo e humildade. E, porque não dizê-lo, com a certeza de contar com as melhores pessoas para realizar esta tarefa”, afirmou o primeiro-ministro, enquanto o partido tentava reagir à noite eleitoral.“A forma de governar de Pedro Sánchez é uma das razões pelas quais o PSOE está a perder em todos os lados”, resume Diogo Noivo, quando questionado sobre se o primeiro-ministro ainda vai a tempo de reconstruir o partido antes das próximas eleições legislativas (previstas para 2027). “O PSOE está num ponto de debilidade eleitoral, doutrinária, até ideológica, que não tem paralelo na sua história de mais de 120 anos”, acrescentou Diogo Noivo, lembrando que há mais desafios eleitorais pela frente. Três eleições em seis meses“Estas eleições autonómicas na Extremadura são as primeiras de um novo ciclo eleitoral que vai acabar com as legislativas espanholas. As legislativas seriam realizadas em 2027, mas estou convencido e creio que a maior parte dos analistas também, que vão ser antecipadas para 2026”, disse Diogo Noivo. Pedro Sánchez insiste contudo que levará o mandato até ao final, mas o desconforto à porta aberta dos parceiros de coligação pode obrigá-lo a mudar os planos.O calendário eleitoral começa já a 8 de fevereiro, com a antecipação das eleições em Aragão, depois de o presidente do governo Jorge Azcón (PP) se queixar do bloqueio da oposição que impossibilitou a aprovação do orçamento para 2026 - a sua aliança com o Vox entrou em rutura em 2024. As sondagens apontam para um cenário igual à Extremadura, com a subida do PP, mas aquém da maioria absoluta, a queda do PSOE - a candidata é Pilar Alegria, daí a saída do governo e a necessidade de Sánchez nomear ontem substitutas - e a subida do Vox. A 15 de março, será a vez de os eleitores de Castela e Leão irem às urnas. Esta comunidade também é governada pelo PP, tendo Alfonso Fernández Mañueco sido investido presidente com o apoio do Vox. Também aqui uma sondagem dá a vitória ao PP (apesar de perder deputados), com os socialistas a caírem mais que os populares. Já o Vox, apesar de ainda não ter oficialmente um candidato, teria mais seis representantes do que até agora.As últimas eleições autonómicas deste ciclo vão decorrer na Andaluzia, previsivelmente a 19 de junho (ainda não foram marcadas oficialmente). Juanma Moreno, do PP, surge nas sondagens com capacidade para repetir a maioria absoluta alcançada em 2022, com o PSOE a cair (mas não muito) e o Vox a crescer. A dúvida é saber quanto mais poderá crescer, porque se o partido de Santiago Abascal repetir o sucesso da Extremadura, pode deixar em risco essa maioria absoluta. Tal como esta região, a Andaluzia costumava ser um bastião socialista, tendo sido governada pelo PSOE entre 1978 e 2019.As eleições de domingo, as primeiras neste ciclo eleitoral, são também as primeiras num contexto “muito marcado pelos casos de corrupção, tráfico de influência, peculato, etc., que mancham tanto o partido como a família ou o governo de Sánchez”, lembra Diogo Noivo. Sendo que o próprio candidato socialista foi uma escolha do primeiro-ministro e está envolvido num desses escândalos, que atinge o irmão de Sánchez. Gallardo será julgado para o ano precisamente por tráfico de influências.O PSOE, procurando reagir à derrota, alegou que a “campanha de ataques” contra Gallardo esteve na origem da derrota. Mas também admitiu a falta de mobilização dos seus eleitores, por as eleições não coincidirem com as municipais e as legislativas. A participação foi de apenas 62,73%, quase menos oito pontos percentuais do que em 2023. A abstenção terá afetado principalmente o PSOE, com vários eleitores do partido que nas sondagens se mostravam indecisos a decidir ficar em casa..Extremadura vai a votos, com o PP à espera de saber qual será a força do Vox