Na noite de quarta-feira registaram-se manifestações e distúrbios em vários pontos de Marrocos. O incidente mais grave deu-se em Lqliaa, perto de Agadir, no sul do país. A polícia abriu fogo e matou dois jovens. Segundo a versão das autoridades, os manifestantes estariam a tentar assaltar um posto da gendarmaria e obter armas e munições. "Os efetivos da gendarmaria de Laqliaa viram-se obrigados a usar as armas de serviço na noite de 1 de outubro em legítima defesa para repelir o assalto ao posto da Real Gendarmaria", disseram as autoridades locais de Inezgane-Ait Melloul. Acrescentaram que os manifestantes furtaram um veículo e quatro motocicletas e que pegaram fogo ao edifício. A versão do grupo que está por trás das manifestações é outra: segundo o representante local da Gen Z 212, alguns manifestantes, em resposta à repressão das forças de segurança, dirigiram-se ao posto, que foi alvo de arremesso de objetos. No entanto, afirma, não houve tentativa de assalto.Este é o incidente mais grave desde o início dos protestos. Na terça-feira, um jovem ficou em estado grave depois de ter sido atropelado por uma carrinha policial em Oujda, no leste do país. Mas contam-se em centenas os feridos, a maior parte das forças da ordem. Mais de 400 manifestantes foram detidos. Para o coletivo anónimo responsável pelos protestos, a corda está a partir-se, estando de um lado uma geração "exausta após anos de espera e corroída pela frustração", e do outro o executivo do reino. "Perdemos quase totalmente a confiança nos sucessivos governos. Esta perda não é passageira, mas sim o resultado de uma longa acumulação de promessas não cumpridas, que enfraqueceram de forma perigosa a confiança nas instituições oficiais", afirmou a Gen Z 212 numa mensagem publicada nas primeiras horas de quinta-feira, na plataforma Discord. Na quarta-feira, na manifestação em Casablanca, a frase de ordem era "Akhannouch para a rua!". O primeiro-ministro, o empresário Aziz Akhannouch, é visto como parte do problema e não da solução ao fim de quatro anos de mandato.O grupo recorda que os protestos visam o "direito à liberdade de expressão e uma reforma radical dos setores da saúde e da educação". .Este movimento, cujo nome se inspirou na revolta recente ocorrida no Nepal liderada pela Gen Z (geração Z, pessoas entre 15 e 30 anos) e no prefixo de chamadas telefónicas internacionais de Marrocos (+212), foi desencadeado com a morte de oito grávidas.. Os casos ocorreram no hospital Hassan, em Agadir, durante cesarianas. Segundo as notícias vindas a lume por meios de comunicação locais, a origem das mortes dever-se-á à qualidade defeituosa da anestesia. Um choque para a população que dias antes havia assistido à inauguração do renovado estádio príncipe Moulay Abdellah, em Rabat, parte das obras avaliadas em 4,2 mil milhões de euros para organizar o mundial de futebol de 2030 em conjunto com Espanha e Portugal. Os jovens marroquinos têm uma grande paixão pelo futebol, mas os que se manifestam denunciam um erro nas prioridades das políticas. A geração Z sofre sobretudo com uma elevada taxa de desemprego, que chega a atingir 50% em meios urbanos. "Queremos um país para todos", dizem. O movimento, nascido com menos de mil membros no Discord, tem agora mais de 120 mil seguidores. Dizem querer debater temas como a saúde, a educação e a luta contra a corrupção. Afirmam rejeitar a violência e dizem-se fiéis a Marrocos e ao rei Mohammed VI.E, nesta quinta-feira, apelam para a continuação de manifestações pacíficas.