Deputados timorenses recuam na decisão de comprar viaturas
após protesto de estudantes em Díli

Deputados timorenses recuam na decisão de comprar viaturas após protesto de estudantes em Díli

Estudantes de quatro universidades timorenses e elementos da sociedade civil realizaram esta segunda-feira um protesto em frente ao Parlamento contra as regalias dos 65 deputados do país.
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Os deputados timorenses do Congresso Nacional para a Reconstrução de Timor-Leste (CNRT), do Partido Democrático (PD) e do Khunto recuaram na decisão de comprar novas viaturas para os parlamentares, após protestos de estudantes universitários e da sociedade civil.

"Decidimos em conjunto, as três bancadas, e entendemos pedir ao Parlamento Nacional a anulação de todo o processo relativo à aquisição de viaturas para os deputados", afirmou aos jornalistas o porta-voz das três bancadas, o deputado Patrocínio Fernandes do CNRT, partido liderado pelo primeiro-ministro, Xanana Gusmão.

Estudantes de quatro universidades timorenses e elementos da sociedade civil realizaram esta segunda-feira, 15 de setembro, um protesto em frente ao Parlamento contra as regalias dos 65 deputados do país, que incluem a decisão recente de adquirir novas viaturas por um valor superior a três milhões de dólares.

A manifestação acabou por ser dispersa com gás lacrimogéneo e balas de borracha, depois dos estudantes terem lançado pedras e outros objetos contra o edifício do Parlamento.

Apesar de terem sido dispersos, os manifestantes voltaram a reunir-se em protesto no mesmo local, mas sem registo de mais incidentes.

O deputado explicou que a decisão é de não adquirir carros para os deputados durante a presente legislatura.

Patrocínio Fernandes sublinhou que a medida não resulta de pressão externa, mas sim da análise interna das preocupações manifestadas pelos próprios deputados, que, no entanto, reconhecem também a sensibilidade da opinião pública.

A conferência de imprensa contou também com a presença do presidente da bancada do PD (partido da coligação no Governo), Armando dos Santos Lopes, e ainda do presidente da bancada da KHUNTO, na oposição, António Verdeal.

Patrocínio Fernandes recordou que a intenção de adquirir as viaturas tinha como fundamento o estatuto dos deputados, que prevê a disponibilização de condições adequadas para o exercício do mandato parlamentar, incluindo transporte.

Segundo o deputado, as preocupações tinham surgido devido ao mau estado da frota atual, aos elevados custos de manutenção e às dificuldades do secretariado parlamentar em gerir de forma eficiente os veículos atribuídos aos deputados.

Após uma análise mais aprofundada da situação, as bancadas do CNRT, PD e KHUNTO decidiram agora suspender a execução da verba de 3,5 milhões de euros para compra de viaturas, inscrita no Orçamento de Estado para este ano.

"As bancadas do CNRT, PD e KHUNTO [que representam a maioria dos deputados] estão conscientes de que a decisão de comprar viaturas não corresponde às preocupações do público", acrescentou Patrocínio Fernandes.

O hemiciclo do Parlamento timorense inclui também as bancadas da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) e o Partido da Libertação Popular (PLP).

O líder da oposição timorense, Mari Alkatiri, apelou na semana passada ao Governo para resolver com urgência os problemas sociais e políticos no país, de modo a evitar cenários semelhantes ao que estão a ocorrer em países vizinhos.

"Eu digo sempre que a situação no nosso país hoje pode parecer melhor, mas todos sabemos que os problemas se acumulam. Podemos dizer que estamos a entrar numa situação de 'bomba-relógio'", afirmou o secretário-geral da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) na passada quinta-feira, referindo-se expressamente aos estudantes universitários.

Os jovens universitários e a sociedade civil vinham a protestar há algum tempo contra a aquisição de novas viaturas para os deputados. "Se não fizermos uma boa gestão desta situação, poderemos enfrentar, em pouco tempo, muitos problemas sociais, políticos e mesmo conflituais", avisou na altura o secretário-geral da Fretilin.

O protesto de estudantes junto ao parlamento em Díli provocou estragos, mas não foram registados feridos nem detidas pessoas até agora, disse a Polícia Nacional de Timor-Leste (PNTL).

O superintendente Justino Menezes, comandante das operações da PNTL, disse que a polícia não registou qualquer ferido, até ao momento, mas salientou que alguns veículos foram danificados.

“Ainda não detivemos ninguém, porque estamos a observar e a dar espaço para que continuem a manifestar-se. O processo normal será feito. Se destruírem algo, tomaremos as devidas medidas em momento oportuno”, afirmou o comandante aos jornalistas.

O protesto ocorreu ao mesmo tempo que decorria, no hemiciclo, a abertura da terceira sessão legislativa da sexta legislatura.

Presente no hemiciclo estava o Presidente timorense, José Ramos Horta, bem como um grupo de eurodeputados que iniciou esta segunda-feira uma visita ao país.

Ramos Horta apelou aos estudantes para não recorrerem à violência nem destruírem edifícios públicos.

“A minha mensagem para eles é que não devem destruir propriedade do Estado, nem do corpo diplomático. Os estudantes têm de demonstrar sentido de responsabilidade, com bom comportamento, dialogando de forma adequada e fazendo ouvir as suas vozes de forma ordeira”, afirmou Ramos-Horta aos jornalistas após a sessão solene.

Ramos-Horta afirmou que as reivindicações podem ser feitas, mas nunca com recurso à violência.

“Isso não é bom. A minha mensagem para eles é essa”, apelou o chefe de Estado.

A manifestação foi organizada por estudantes da Universidade Nacional de Timor-Leste (UNTL), Universidade de Díli (UNDIL), Universidade da Paz (UNPAZ) e Universidade de Timor Oriental (UNITAL) e também contou com a participação de ex-professores contratados, membros da sociedade civil e vítimas dos despejos, que estão a ser feitos na cidade de Díli.

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