A procuradoria de Milão abriu uma investigação a italianos que alegadamente terão pago grandes somas de dinheiro a a milícias sérvias para se tornarem "atiradores de fim-de-semana" durante a guerra da Bósnia.Estes italianos, descritos como extremistas de direita fanáticos por armas, terão feito viagens no estilo de "safaris humanos" para disparar sobre pessoas por diversão durante o cerco a Saravejo entre 1993 e 1995, que fez 11 mil mortos, noticiaram esta segunda-feira, 10 de novembro, os jornais Il Giorno e La Repubblica.Estes cidadãos transalpinos terão saído de Itália e pago "enormes" quantias a soldados sérvios para participarem na guerra. O caso foi aberto pelo procurador Alessandro Gobbis, sob a acusação de homicídio doloso agravado por crueldade e motivos abjetos, estando em curso uma investigação para identificar estes "turistas de guerra".As acusações estão a ser feitas contra desconhecidos, decorrentes de uma queixa apresentada pelo jornalista e escritor Ezio Gavazzeni, com a assistência de dois advogados e do ex-magistrado Guido Salvini.De acordo com testemunhos recolhidos no norte de Itália, estes "atiradores de fim-de-semana", na sua maioria simpatizantes da extrema-direita e apaixonados por armas, reuniam-se em Trieste e eram levados para as colinas em torno de Sarajevo, de onde disparavam contra a população da cidade sitiada depois de pagarem às milícias sérvias da Bósnia de Radovan Karadzic.O processo contém um relatório sobre "estrangeiros ricos envolvidos em atividades desumanas", enviado à Procuradoria de Milão pela ex-presidente da Câmara de Sarajevo, Benjamina Karic.Por enquanto, a investigação conta apenas com os documentos apresentados pelo autor da queixa, datados de 28 de janeiro. Nas próximas semanas, o procurador terá de investigar mais pormenores, possivelmente entrevistando as pessoas indicadas por Gavazzeni.Segundo o jornalista e escritor, "estas são apenas dicas", mas aparentemente também haveria "um preço para estes homicídios: as crianças custavam mais, depois os homens (de preferência fardados e armados), as mulheres e, por último, os idosos, que podiam ser mortos de graça".O autor da queixa menciona o documentário de 2022 "Sarajevo Safari", que conta com uma testemunha "anónima". "O realizador Miran Zupanic deu-nos as senhas para aceder à exibição restrita do filme no site da Al Jazeera, e posso fornecê-las ao magistrado que as solicitar", afirmou. "Algumas fontes falam de americanos, canadianos e russos, mas também de italianos, que estavam dispostos a pagar para brincar à guerra", acrescentou, referindo que estes seriam "certamente pessoas muito ricas" que podiam "arcar financeiramente com um desafio tão cheio de adrenalina".Dada a forma como "tudo estava organizado, os serviços de informação bósnios acreditavam que o Serviço de Segurança do Estado sérvio estava por detrás de tudo". Jovica Stanisic, "condenado por crimes de guerra pelo Tribunal Penal Internacional para a ex-Jugoslávia, desempenhou um papel fundamental neste serviço".Segundo a acusação, entre estes "turistas atiradores de elite" também se encontravam entusiastas da caça, sendo que o "pretexto da caça servia para levar os grupos ao seu destino em Belgrado sem levantar suspeitas".De acordo com um excerto do depoimento de John Jordan, um antigo bombeiro norte-americano que serviu como voluntário na cidade sitiada de Sarajevo, na década de 1990, perante o Tribunal Penal Internacional de Haia, no julgamento do comandante do Exército Sérvio da Bósnia, Ratko Mladic, havia pessoas que não lhe "pareciam locais por causa das suas roupas, das armas que transportavam, da forma como eram tratadas, geridas e até lideradas pelos habitantes locais". "Vi isso em Sarajevo em diversas ocasiões", aditou.