O que está a acontecer em Torre Pacheco? Confrontos entre extrema-direita e imigrantes estremecem Espanha
A última segunda-feira (14) marcou o quarto dia na qual a pequena cidade de Torre Pacheco, situada a 15 quilómetros de Cartagena, sudeste de Espanha, é palco de tensões e confrontos violentos.
Tudo começou na sexta-feira (11) da semana passada, quando grupos ligados à extrema-direita passaram a mobilizar-se nas ruas da cidade para o que tem sido chamado em Espanha por uma "caça aos imigrantes". Os protestos surgiram após um reformado local, de 68 anos, ter sido agredido por três jovens - sendo um de origem magrebina - "sem claro motivo", alega a vítima.
Desde então, centenas de pessoas, muitas vindas de fora do município, têm percorrido as ruas do bairro de San Antonio, onde vive grande parte da comunidade marroquina, gritando insultos racistas, destruindo estabelecimentos, partindo vidros de carros e agredindo moradores.
A violência já resultou em dez detenções, incluindo três relacionadas diretamente com a agressão ao idoso, e outros sete suspeitos de participar nos motins por crimes de ódio, distúrbios públicos e agressões. Cerca de 80 pessoas foram identificadas pelas autoridades.
Na noite de segunda-feira (14), a quarta consecutiva de tensão, a intervenção da Guardia Civil conseguiu evitar novos confrontos diretos entre jovens marroquinos e militantes de extrema-direita. Mesmo assim, dezenas de moradores permanecem em vigília temendo novos ataques. Segundo testemunhos, o clima é de medo e de um bairro sitiado, com lojas fechadas e ruas desertas ao cair da noite.
No mesmo dia, imãs da mesquita de Torre Pacheco reuniram com jovens da comunidade para pedir contenção, tentando "acalmar os miúdos para que não haja mais violência", disse um dos porta-vozes, citado pela agência Lusa. Os líderes religiosos insistem que o conflito tem sido alimentado por agitadores vindos de fora e pediram que estes deixem a cidade “em paz e sossego”.
A resposta política também elevou o tom do debate. Enquanto o Partido Socialista (PSOE) e o Podemos condenaram a “caça racista” promovida por grupos de extrema-direita, o Partido Popular exigiu reforço policial imediato para garantir segurança. Já o Vox, terceira força política em Espanha e conhecido pelo discurso anti-imigração, promoveu manifestações com o lema “Defende-te da insegurança”, insinuando que a violência decorre da presença de imigrantes.
Num editorial publicado esta terça-feira (15), o jornal El País alertou para o perigo da instrumentalização política do ódio racial, classificando os acontecimentos em Torre Pacheco como uma “advertência séria” para as autoridades. O jornal sublinha o papel das redes sociais na organização rápida dos ataques, através de boatos e vídeos falsos circulados em grupos de extrema-direita.
O Governo espanhol reforçou a presença de forças de segurança, com 90 agentes da Guardia Civil destacados na cidade e a promessa de aumentar os efetivos nos próximos dias. O ministro do Interior, Fernando Grande-Marlaska, garantiu que “não se permitirá que agitadores vindos de fora semeiem o caos numa comunidade que sempre conviveu em paz”.
A comunidade marroquina é a maior diáspora em Espanha, com cerca de 920 mil residentes. A maior parte trabalha nas colheitas do campo murciano.