A presidente da Comissão Europeia e os líderes dos países do Mercado Comum do Sul (Mercosul) anunciaram esta sexta-feira ter chegado a um entendimento político para aquele que será o maior acordo comercial do mundo. Este é o primeiro passo da fase final de um processo iniciado em 1999 e que ainda poderá demorar mais uns anos até estar totalmente concluído. A França, o seu maior opositor, garantiu que a “luta ainda não acabou”..“Hoje [ontem] assinala-se um marco verdadeiramente histórico”, declarou Ursula von der Leyen, sublinhando que “este acordo não é apenas uma oportunidade económica, é uma necessidade política”, mas também “vantajoso para todos, que trará benefícios significativos para os consumidores e as empresas, de ambos os lados. Estamos focados na justiça e no benefício mútuos”. .A líder europeia falava ontem em Montevideu, onde se encontrou com os presidentes dos países do Mercosul - Lula da Silva (Brasil), Javier Milei (Argentina), Santiago Peña (Paraguai) e Luis Lacalle Pou (Uruguai), reunidos na capital uruguaia para a sua 65.ª Cimeira -, para finalizar o acordo político entre os dois blocos. Um acordo político que chega em vésperas de Donald Trump regressar à Casa Branca, com a promessa de que irá aumentar as tarifas aos produtos exportados. .“Estamos a enviar uma mensagem clara e poderosa ao mundo: em primeiro lugar, num mundo cada vez mais conflituoso, demonstramos que as democracias podem confiar umas nas outras”, sublinhou a alemã..O acordo UE-Mercosul abrange os 27 países do bloco europeu mais Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, o equivalente a 25% da economia global e quase 10% da população mundial. Segundo dados da Comissão Europeia, “a UE é o principal parceiro comercial e de investimento do Mercosul”, lembrando que as exportações do bloco europeu para o bloco latino-americano “foram de 45 mil milhões de euros em bens, em 2021, e de 17 mil milhões de euros em serviços em 2020”..Lutar “em todas as fases”.Este acordo é também marcado por um profundo desentendimento entre a Alemanha, que é uma das suas maiores apoiantes, e a França, que entre outras coisas, teme que os produtores agrícolas da União Europeia , nomeadamente os agricultores franceses, saiam prejudicados..Ursula von der Leyen também não se esqueceu deles nas suas declarações de ontem, garantindo: “Ouvimos as preocupações dos nossos agricultores e agimos em conformidade. Este acordo inclui salvaguardas robustas para proteger os seus meios de subsistência”. “Além disso, as nossas normas europeias em matéria de saúde e alimentação permanecem intocáveis. Os exportadores do Mercosul terão de cumprir rigorosamente estas normas para aceder ao mercado da UE”, acrescentou..Berlim não tardou em mostrar a sua satisfação, com o chanceler Olaf Scholz a declarar que “um importante obstáculo para o acordo foi superado”. A porta-voz do governo alemão, Christiane Hoffmann, foi mais longe dizendo que o “objetivo é e continua a ser uma solução mutuamente acordada e estamos em contacto com todos os parceiros sobre isso, incluindo a França”. E apelou “ao pragmatismo e à vontade de chegar a um compromisso na medida do possível”..Mas Paris continua a considerar este acordo “inaceitável tal como está”. “A Comissão concluiu o seu trabalho de negociação com o Mercosul, é da sua responsabilidade, mas o acordo não foi assinado ou ratificado. Portanto, este não é o fim da história”, declarou o Eliseu. A ministra francesa do Comércio Externo, Sophie Primas, sublinhou que o que foi feito nesta Cimeira do Mercosul “não compromete os Estados-membros” da UE e garantiu que a “França lutará em todas as fases ao lado dos Estados-membros que partilham a sua visão”. Um deles é a Polónia..O presidente do Paraguai, Santiago Peña, já se terá comprometido a visitar França na próxima semana, numa tentativa de fazer Emmanuel Macron mudar de ideias..Os passos seguintes.O texto do acordo de associação UE-Mercosul foi finalizado em 2019, após 20 anos de negociações, mas o bloco comunitário pretendia mais garantias por parte dos países sul-americanos de que respeitarão o Acordo de Paris e as leis laborais internacionais..Este acordo proposto é composto por um pilar político e de cooperação e por um pilar comercial, sendo que o fim das negociações de ontem constitui o primeiro passo no processo rumo à sua conclusão. .Os documentos oficiais serão publicados nos próximos dias, no entanto a revisão jurídica final por ambas as partes e a tradução do texto em todas as línguas oficiais da UE ainda poderá levar alguns meses. Depois será apresentado ao Conselho Europeu, presidido por António Costa, que ontem saudou esta “conquista muito importante”, e aos eurodeputados. .A forma mais rápida de ratificar o pilar comercial é separando-o da parte política e de cooperação. “É esperado que esta seja a forma preferida por Bruxelas, onde apenas o Conselho da UE e o Parlamento têm de intervir e onde a unanimidade não é exigida entre os países da UE”, explica o Politico. O pilar político e de cooperação só será aplicado quando todos os parlamentos nacionais o ratificarem, o que pode demorar anos.