Depois de duas décadas de experiência como chefe da diplomacia do Djibuti, Mahmoud Ali Youssouf foi eleito presidente da Comissão da União Africana (UA) em fevereiro. Uma espécie de Ursula von der Leyen do bloco africano (mas com um orçamento de milhões em vez de biliões), que este ano tem como presidente rotativo o chefe de Estado angolano, João Lourenço. Angola será precisamente o palco da sétima Cimeira União Europeia-UA (25 anos depois da primeira no Cairo), com a presidente da Comissão Europeia, assim como o líder do Conselho Europeu, António Costa, presentes na próxima segunda e terça-feira em Luanda. Portugal estará representado pelo primeiro-ministro, Luís Montenegro, e pelo ministro de Estado e Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel.João Lourenço pode ser o anfitrião, mas Youssouf será o mestre de cerimónias. O presidente da Comissão da UA nasceu a 2 de setembro de 1965 na capital do Djibuti (então ainda Somalilândia Francesa), tendo estudado em França, Reino Unido e Canadá (tem um mestrado em Gestão da Universidade de Laval). Na década de 1990, começou a trabalhar no Ministério dos Negócios Estrangeiros, onde foi diretor do departamento árabe. Foi ainda embaixador residente no Egito (e não residente no Sudão, Líbano, Síria e Turquia), além de representante permanente do Djibuti junto da Liga Árabe e da Organização para a Cooperação Islâmica. Em 2005, chegou a ministro, tendo sido um dos que mais tempo ocupou este cargo no continente africano.Como chefe da diplomacia do Djibuti nas últimas duas décadas, contribuiu para transformar o seu pequeno país do Corno de África - quase quatro vezes mais pequeno que Portugal e com pouco mais de um milhão de habitantes - num foco de rivalidade entre potências estrangeiras e assim atrair investimento estrangeiro. O Djibuti acolhe bases militares de oito países, incluindo dos EUA e da China (localizadas a menos de 12 quilómetros de distância uma da outra), o que lhe garante tanto investimento como segurança numa zona marcada pelas guerras. Youssouf, que tem a mais valia de falar fluentemente francês, inglês e árabe e graças à sua experiência servir de ponte entre as diferentes regiões de África, foi eleito presidente da Comissão da UA por uma maioria de dois terços dos 49 Estados-membros elegíveis a 15 de fevereiro. O presidente do Djibuti, Ismail Omar Guelleh, falou de “um dia histórico” para o seu país. À sétima votação, derrotou aquele que era considerado o favorito, o antigo primeiro-ministro queniano, Raila Odinga, assim como o ex-chefe da diplomacia de Madagáscar, Richard Randriamandrato.Madagáscar é um dos seis Estados-membros da UA atualmente suspensos, depois de os militares terem assumido o poder na sequência de protestos que levaram à fuga do presidente Andry Rajoelina. Burkina Faso, Guiné-Conacri, Mali, Níger e Sudão são os outros países nessa situação, devido aos golpes militares dos últimos anos. Ao todo, são 55 os Estados-membros da UA, mais do dobro dos 27 europeus.Youssouf foi eleito para um mandato de quatro anos (para o qual pode ser reeleito uma vez) com base numa agenda de reforço do papel de África na geopolítica global, da promoção da unidade continental e da garantia da paz regional, sendo uma das suas prioridades a implementação de uma área de comércio livre continental e a melhoria das infraestruturas para o impulsionar. O mandato corria bem até ao final de outubro. No regresso de uma viagem de Youssouf a Angola, para preparar a cimeira com a UE, o seu porta-voz publicou uma foto nas redes sociais (entretanto apagada) num luxuoso avião privado, com a frase “Adeus linda Luanda”. O presidente da Comissão apressou-se a dizer que o avião tinha sido colocado à sua disposição por João Lourenço, para poder chegar a tempo a outro compromisso, reiterando que a UA não tem recursos para este tipo de aparelho. “A foto do meu porta-voz não foi apropriada”, escreveu no X tentando pôr fim à polémica, com o porta-voz a pedir desculpas publicamente.Um grão de areia na engrenagem para a cimeira da próxima semana, que terá como foco o compromisso com o multilateralismo, o reforço da cooperação entre os dois continentes em áreas como paz e segurança, integração económica, comércio, digitalização ou migração. Mas a UA quer também abordar as questões de reparações históricas pelo passado colonial - 2025 foi oficialmente designado pelo bloco como o ano da “justiça para africanos e afrodescendentes através de reparações”.