Lukashenko, conhecido como o "último ditador da Europa", está no poder desde 1994.
Lukashenko, conhecido como o "último ditador da Europa", está no poder desde 1994.Kremlin.ru

Lukashenko prepara-se para mais 5 anos à frente da Bielorrússia. "Ritual para ditadores", denuncia oposição

Aleksander Lukashenko vai ser eleito para o seu sétimo mandato nas presidenciais bielorrussas de domingo. A líder da oposição no exílio, Sviatlana Tsikhanouskaya, diz que a votação nada tem a ver com o que se chama de eleições “no mundo democrático”.
Publicado a
Atualizado a

Este domingo, Aleksander Lukashenko, conhecido como o “último ditador da Europa”, verá confirmado o seu sétimo mandato como presidente da Bielorrússia, prolongando assim por mais cinco anos a sua liderança de três décadas à frente de um país cada vez mais isolado do mundo e cada vez mais dependente da Rússia. No boletim estarão cinco nomes, mas, como acontece desde 1994, o vencedor já é conhecido, numas eleições que a oposição no exílio considera serem uma farsa, tendo apelado aos bielorrussos (mas apenas os que estão no país, pois não haverá mesas de voto no estrangeiro) para votarem nulo.

As eleições deste domingo serão bem diferentes do escrutínio presidencial realizado em 2020, quando as acusações de fraude desencadearam os protestos de milhares de bielorrussos nas ruas durante meses, aos quais o regime respondeu com a detenção de mais de 35 mil pessoas, muitas delas torturadas ou obrigadas ao exílio. Outra diferença está no atual contexto geopolítico, mais complexo do que há quatro anos e meio, como nota Olga Dryndova, cientista política e editora-chefe do Belarus-Analyses no Centro de Investigação dos Estudos da Europa de Leste na Universidade de Bremen, na Alemanha.

“Desde a repressão dos protestos após as últimas eleições em 2020, a dependência do regime bielorrusso na Rússia resultou em níveis críticos de influência política, económica, militar e cultural, minando a soberania da Bielorrússia. Esta dependência levou a Bielorrússia a fornecer o seu território, juntamente com infraestruturas militares e civis, para ataques russos contra a Ucrânia”, refere esta especialista, sublinhando ainda que, paralelamente, o país tem sido “alvo das sanções ocidentais mais severas da sua história, introduzidas em várias vagas na sequência da repressão brutal aos protestos de 2020, da aterragem forçada de um voo da Ryanair em Minsk para prender um ativista da oposição, da crise migratória induzida na fronteira da UE, bem como apoio à guerra da Rússia contra a Ucrânia”.

image-fallback
Multidão desafia Lukashenko: "Toma chá, é oferta de Putin"

A atual campanha eleitoral também foi muito diferente da anterior, sem debates, sem grandes promessas por parte de Lukashenko, sem agitação civil visível e sem candidatos com um vislumbre de independência – além do presidente, há mais quatro nomes a votos, três dos quais representantes de partidos pró-governo e uma outra, Hana Kanapackaya, alegadamente independente, mas que também apoia Lukashenko.

Perdões de olho no Ocidente?

As vésperas destas eleições foram marcadas por mais uma série de perdões concedidos na sexta-feira por Lukashenko a 15 prisioneiros, um ato descrito pela imprensa estatal bielorrussa como um “gesto humanitário”. Sem dar grandes pormenores, foi anunciado que se tratavam de condenados por atividades extremistas e sete por crimes relacionados a drogas. Segundo o grupo de direitos humanos Viasna, considerado por Minsk uma organização extremista, existem cerca de 1.250 presos políticos no país, mesmo depois da libertação de mais de 250 no ano passado, muitos dos quais idosos, doentes ou próximos do fim da pena.

“Esta é a forma de a Bielorrússia enviar um sinal, e só pode haver um destinatário possível: o Ocidente. O regime de Aleksander Lukashenko pode estar a beneficiar da guerra em curso na Ucrânia, mas ainda quer preparar-se para um futuro menos animador”, nota Artyom Shraibam, um analista político bielorrusso e académico não-residente do Centro Carnegie Rússia Eurásia, lembrando que estas ações resultaram numa melhoria das relações com os Estados Unidos e a União Europeia em 2008 e 2015. Mas agora a situação vai além das sanções por causa da repressão de opositores, estando em cima da mesa a participação do país na invasão da Ucrânia, o que levou o Ocidente a decidir que a Bielorrússia é um estado vassalo russo indigno de qualquer atenção.

image-fallback
Lukashenko mantém-se no poder com 80% dos votos. Um morto em confrontos nas ruas

“É provável que mais presos políticos sejam libertados após as eleições de 2025. No entanto, dadas as novas realidades geopolíticas, o regime terá de fazer muito mais do que isso para acabar com o isolamento diplomático da Bielorrússia e provocar um levantamento parcial das sanções. No mínimo, espera-se que acabe com as repressões e deixe de apoiar a agressão russa contra a Ucrânia”, vaticina Olga Dryndova. Já Artyom Shraibam chama a atenção para o facto de “independentemente do que Lukashenko pretendia ao libertar os presos políticos, o próprio facto desta medida sugere que Minsk se sente desconfortável com a dependência total de Moscovo a longo prazo. Uma aliança com a Rússia garante a autoridade de Lukashenko, mas o líder bielorrusso está claramente preocupado com a possibilidade de ser difícil para ele continuar a governar – e depois entregar o poder a um sucessor – se estiver completamente isolado do Ocidente. O atual período de lua de mel com Moscovo não é visto como permanente por Minsk”.

Um ritual para os ditadores

Sviatlana Tsikhanouskaya, candidata à presidência em 2020 e líder da oposição no exílio.
Sviatlana Tsikhanouskaya, candidata à presidência em 2020 e líder da oposição no exílio.EPA/PAWEL SUPERNAK

Para Sviatlana Tsikhanouskaya, candidata à presidência em 2020 e líder da oposição no exílio, Lukashenko está a brincar com o Ocidente ao libertar presos políticos antes das eleições deste domingo e, embora fique satisfeita com estas libertações, garante que não representam qualquer abrandamento da repressão. “Não é uma mudança de política, é como testar a democracia. 'Olha, eu liberto 20 pessoas, é o suficiente para vocês? Vocês estão prontos para suspender as sanções? Vocês estão prontos para me reconhecer? Não? OK, 20 mais'", afirmou Tsikhanouskaya numa entrevista dada à Reuters esta semana, sublinhando que não devem existir negociações com Lukashenko enquanto ele continuar a manter prisioneiros como “reféns” - entre eles está o seu marido, Sergei Tikhanovsky, detido em maio de 2020.

Sobre as presidenciais deste domingo, Tsikhanouskaya garante que “o que no mundo democrático se chama eleições não tem nada em comum com este acontecimento na Bielorrússia. Porque é principalmente como um ritual para os ditadores, quando eles se renomeiam a eles mesmos”.

Também a Comissão Europeia, através da porta-voz para os Negócios Estrangeiros, Anitta Hipper, referiu na sexta-feira que estamos a falar de “um exercício totalmente antidemocrático. Estas eleições são uma farsa total. Não são eleições se já se sabe quem vai ganhar”. Mas garantindo que a “ UE continua a apoiar o povo bielorrusso” e continuará a pressionar o regime, lembrando que em dezembro foi aprovado “o mais recente pacote de sanções, visando os responsáveis por violações dos direitos humanos”, e que “no que diz respeito ao nosso apoio ao povo bielorrusso adoptámos um pacote de 30 milhões de euros em apoio à sociedade civil. Isto eleva o nosso apoio total da UE a 170 milhões de euros mobilizados desde 2020”.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt