Justiça quer decidir recurso de Marine Le Pen até ao verão de 2026
O Tribunal da Relação de Paris, ao informar ter recebido três recursos relativos às condenações impostas na véspera a Marine Le Pen, 22 outras pessoas da Reunião Nacional (RN) e o próprio partido, disse que irá analisar o processo “dentro de um prazo que deverá permitir tomar uma decisão no verão de 2026”. Pouco antes, o ministro da Justiça mostrou-se favorável a que o apelo tenha um prazo “o mais razoável possível”, embora Gérald Darmanin tenha lembrado que aquele órgão judicial é “totalmente independente”. A líder da extrema-direita - condenada a quatro anos de prisão e cinco anos de inelegibilidade por dirigir um esquema de desvio de fundos públicos - se vir a sua pena ser revista de acordo com as suas pretensões, poderá candidatar-se às presidenciais de 2027 pela quarta vez.
O primeiro presidente do Tribunal de Cassação (a instância superior de recurso) mostrou-se satisfeito com o calendário anunciado pela Relação. Christophe Soulard, um dos mais altos magistrados franceses, elogiou a “capacidade de se adaptar” e a consciência da justiça sobre as “questões em causa nas suas decisões” e as suas “consequências políticas”. Se a justiça for clemente para com Le Pen na segunda instância, esta terá a possibilidade de se candidatar até mês e meio antes do voto. Qualquer candidato elegível tem de depositar 500 assinaturas de políticos eleitos em pelo menos 30 departamentos e apresentá-las até à “sexta sexta-feira antes da primeira volta das eleições”, estipula a lei.
Le Pen aproveitou o momento e realizou uma reunião do grupo parlamentar aberta à imprensa (o que nunca acontecera antes), tendo voltado a queixar-se da “ingerência dos magistrados” nas eleições presidenciais. “O sistema detonou a bomba nuclear e se está a usar uma arma tão poderosa contra nós, é obviamente porque estamos prestes a ganhar uma eleição”, disse aos seus deputados. “Vamos ganhar”, concluiu. Já Jordan Bardella, presidente do partido e provável candidato caso se confirme a inelegibilidade de Le Pen, depois de ter apelado à “mobilização popular” na segunda-feira contra a decisão do tribunal, anunciou uma manifestação em Paris, no domingo. Um encontro que o ex-primeiro-ministro e atual líder parlamentar do Ensemble (partido de Macron) Gabriel Attal classificou de “uma reunião contra a independência do poder judicial”. Tomando de empréstimo a linguagem usada por outros líderes que estiveram a contas com a justiça, como Berlusconi, Bardella, ao mesmo tempo que “condena as ameaças” aos magistrados, assestou contra uma “tirania de juízes”, os quais qualificou de “vermelhos”.
A presidente do coletivo de juízes está sob proteção policial em resultado das ameaças nas redes sociais.
A presidente do coletivo de juízes Bénédicte de Perthuis passou a ter proteção policial, noticiou o Le Figaro, em resultado das ameaças proferidas nas redes sociais. Uma segunda investigação foi instaurada devido às ameaças, depois de uma primeira no início do ano devido a ameaças de morte publicadas num site de extrema-direita a todos os magistrados do processo dos assistentes dos eurodeputados. O procurador-geral Rémy Heitz, o outro dos dois mais altos magistrados de França, saiu a terreiro para criticar os “inadmissíveis” ataques verbais contra os magistrados e reiterar a independência da justiça. “A decisão foi tomada após um processo justo, na sequência de um debate com contraditório que durou dois meses e de uma investigação que durou anos”, disse na RTL. O ministro Darmanin também se referiu às ameaças como “inaceitáveis em democracia”.
No campo político, o líder da UDR, Éric Ciotti, aliado da RN, anunciou que o seu grupo vai apresentar em junho um projeto de lei para “abolir” a execução provisória. O primeiro-ministro, que na véspera se mostrou “incomodado” com a condenação de Marine Le Pen, disse que “há questões a colocar”, mas realçou que cabe aos deputados e senadores aprovarem ou não a iniciativa e sublinhou a “clara divisão de poderes” na república. À esquerda, depois de Jean-Luc Mélenchon ter criticado a sentença, a líder parlamentar de a França Insubmissa (LFI) chamou os membros da RN “reis dos hipócritas” e explicou porquê: “Os deputados do RN “pediram a inelegibilidade vitalícia para todos os eleitos que tenham sido condenados, nomeadamente, por emprego fictício ou desvio de fundos públicos, que é o que lhes é imputado”, lembrou Mathilde Panot.