Quem me alertou do prémio que João Ferreira ganhou agora num concurso internacional de caligrafia chinesa foi Wang Suoying, professora no Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM), onde estudou um dos terceiros classificados de uma competição altamente exigente, que passa por uma conceção artística dos ideogramas chineses. Mais uma razão para avançar com o perfil deste jovem lisboeta de 30 anos, professor de português na China, que conheci há umas semanas num almoço organizado pela professora Wang no Dinastia Tang, no Parque das Nações."Cada caligrafia é diferente. Cada pessoa tem uma expressão artística diferente. Dedico-me diariamente à prática da caligrafia. Também faço pintura chinesa, pintura tradicional, onde misturo a pintura com a caligrafia", conta João, que sublinha ter tido a sorte de ter conhecido um professor de caligrafia onde está agora a dar aulas, Nanchang, na província Jiangxi. Com cinco milhões de habitantes, a capital do Jiangxi é a segunda cidade onde vive na China. Antes, deu aulas em Harbin, também com cerca de cinco milhões de habitantes, que fica na província de Heilongjiang. . Foi em 2020, durante a pandemia, que João começou a estudar chinês, primeiro sozinho, através de livros. Depois, em 2021, ingressou no CCCM, nas aulas dadas pelos professores Lu Yanbin e Lu Yang, o marido e o filho da professora Wang, há mais de 30 anos em Portugal, e autora dos manuais mais usados por portugueses para aprender mandarim. Este ano, o CCCM volta a oferecer os seus tradicionais cursos de língua e cultura chinesa, com as aulas a começar dia 20 de setembro."Fiz a licenciatura em Ciência Política no ISCSP, da Universidade de Lisboa, e depois também o mestrado em Estratégia. Já tinha interesse pela história e cultura chinesas, mas quando comecei a estudar mandarim foi mesmo do zero", conta. O CCCM, que fica na rua da Junqueira, em Lisboa, e está na tutela do Ministério da Educação, tem um extraordinário museu de arte chinesa e também a Biblioteca Jorge Álvares, especializada em Ásia e que recebeu o nome do primeiro português a visitar a China, em 1513. . Apesar de ter começado do zero, João mostrou-se um aluno de excecional qualidade, confirma a professora Wang, que chegou também a dar-lhe algumas aulas. E venceu mesmo uma das edições do concurso "Eu e a China", que consiste na escrita de um texto (que fez em mandarim) sobre a relação com a cultura chinesa. Em 2023, surgiu finalmente a oportunidade de ensinar português em Harbin, no norte da China, e assim começou a aventura chinesa de João, que prossegue hoje em Nanchang, na China central."Os meus alunos são todos estudantes chineses que acabam de sair do secundário e ingressam no curso de português aplicado. Ficam a estudar durante três anos e meio. A escola é oficialmente uma universidade. O curso é um curso de especialização em português virado para a área comercial e de negócios. O objetivo é formar alunos chineses para depois entrarem no mercado de trabalho, onde poderão ter emprego em empresas que têm negócios com Portugal, Brasil, Angola ou Moçambique. Eu ensino português, mas eles têm também disciplinas relacionadas com a área de negócios que são dadas por professores chineses", explica João, que esteve de férias em Portugal, para rever a família.Viver longe, num país de cultura tão diferente da portuguesa, foi um desafio, admite o jovem professor: "as primeiras duas semanas foram difíceis, mas felizmente consegui adaptar-me. Quando cheguei tive de me adaptar ao sotaque de Harbin. Felizmente, tive alguns colegas em Harbin, e um deles é português, o João Antunes, que me ajudaram a integrar na sociedade chinesa e à medida que fui conhecendo pessoas novas, nomeadamente os alunos, foi progressivamente mais fácil adaptar-me ao estilo de vida e aos costumes e tradições que lá praticam". Curiosamente, a adaptação à gastronomia local não foi um problema. "Sempre gostei de comida chinesa desde pequeno, portanto para mim isso não foi dificuldade nenhuma para mim", diz, a sorrir, João..Além da experiência de professor em duas províncias muito diferentes, João vai viajando para conhecer melhor a China, e já esteve em Pequim, e também na província de Sichuan e na de Cantão. "Enquanto tenho este privilégio de lá estar, tenho este projeto de vida de viajar pela China inteira e conhecer o mais possível sobre a sua cultura", realça, relembrando que "quem me incentivou a estudar mandarim foi o meu melhor amigo, o Guilherme Machado. Incentivou-me desde o período da faculdade".."A cultura chinesa fascinou-me desde a primeira viagem, apesar do choque cultural".Três décadas a promover a amizade Portugal-China que valeram o elogio do presidente Xi Jinping