Depois de o presidente Donald Trump ter garantido que o ataque americano contra o Irão, na madrugada de ontem, “destruiu total e completamente” as instalações nucleares de Natanz, Isfahan e Fordo, foi a vez de o secretário da Defesa dos EUA, Pete Hegseth, vir reivindicar um “êxito esmagador” de uma operação que “obliterou” as ambições nucleares do regime iraniano. Mas quão eficazes foram mesmo os mísseis e bombas usados pelos bombardeiros americanos e chegarão para aniquilar a capacidade da República Islâmica de se tornar a 10.ª potência nuclear do mundo? Um desejo que Teerão nega, garantindo que o seu programa nuclear tem fins estritamente civis. Numa conferência de imprensa no Pentágono, onde deu pormenores sobre a Operação Martelo da Meia-Noite, o general Dan Quaine garantiu que “a avaliação final dos danos causados pela batalha levará algum tempo, mas as avaliações iniciais indicam que os três locais sofreram danos e destruição extremamente graves”. Um mapa fornecido pelo Pentágono com a rota de voo dos bombardeiros furtivos B-2 indica que a sua aproximação ao Irão os levou a sobrevoar o Mediterrâneo, tendo reabastecido em voo. Nos últimos dias foram vistos uma dúzia de aviões de reabastecimento americanos na Base das Lajes, nos Açores.Os bombardeiros americanos descolaram do continente americano na noite de sexta para sábado, com um grupo a seguir para o Pacífico, numa manobra de diversão, e outro a sobrevoar o Atlântico, dirigindo-se para o Irão. Na zona encontrava-se já o porta-aviões USS Nimitz que terá lançado mísseis Tomahawk contra infraestruturas-chave iranianas, enquanto os B-2, carregados com bombas GBU-57, conhecidas como “fura-bunkers”, iam entrando em espaço aéreo iraniano. A operação envolveu 125 aviões, entre eles sete bombardeiros furtivos, dezenas de mísseis Tomahawk e 14 bombas GBU-57, aqui usadas pela primeira vez..Na central de Natanz, o maior local de enriquecimento de urânio no Irão, a infraestrutura elétrica essencial, como a subestação, o edifício principal de energia, o abastecimento de emergência e os geradores de reserva terão sido destruídos, segundo a Al-Jazeera. O canal de notícias sediado no Qatar garante que não houve impacto direto na sala subterrânea, mas a perda de energia pode ter danificado as centrifugadoras utilizadas para o enriquecimento de urânio.Natanz já tinha sido alvo dos ataques israelitas, com a Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA) a ter confirmado que o edifício na superfície onde o urânio estava a ser enriquecido a 60% (pouco abaixo do limite para construir a bomba) já fora destruído. Mas imagens de satélite exibidas pelo britânico The Guardian mostram novos danos. O mesmo jornal revela que o centro de tecnologia nuclear de Isfahan foi atingido por mísseis de cruzeiro Tomahawk disparados de um submarino. Um vídeo publicado nas redes sociais mostrou uma detonação no local na madrugada de domingo.De acordo com a AIEA, além dos quatro já atingidos em ataques israelitas, outros seis edifícios foram agora atacados, incluindo uma instalação de produção de barras de combustível. A AIEA disse ainda que as instalações visadas em Isfahan não continham material nuclear ou abrigavam apenas pequenas quantidades de urânio natural ou pouco enriquecido..14 bombas fura 'bunker', 7 bombardeiros furtivos e dezenas de mísseis. O que os EUA usaram no ataque ao Irão.O alvo mais difícil entre as instalações nucleares do Irão era, contudo, a central de enriquecimento de urânio de Fordo. Situada 100 km a sudoeste de Teerão, foi construída de forma secreta debaixo de uma montanha - sob uma camada de rocha e betão a 80 ou 90 metros de profundidade -, perto da cidade sagrada de Qom, e está protegida por baterias antiaéreas. Foi ali que os B-2 americanos lançaram as GBU-57. E segundo a Sanad, agência de factchecking da Al Jazeera, três locais apresentam danos: duas crateras resultantes de bombas antibunker e uma instalação de defesa aérea, concebida para proteger o reator nuclear, danificada.Esta informação parece coincidir com a dada por dois responsáveis israelitas citados pelo jornal americano The New York Times. Segundo eles, o Exército israelita estima que esta instalação nuclear iraniana tenha sido seriamente danificada, mas não completamente destruída pelos bombardeamentos americanos. Ainda de acordo com o mesmo jornal, um alto-funcionário americano, que também pediu anonimato, reconheceu que a instalação não foi destruída, mas “gravemente danificada”.À CNN, o diretor da AIEA, Rafael Grossi confirmou haver “sinais claros de impactos” nas instalações nucleares iranianas, mas no que diz respeito à avaliação da extensão dos danos subterrâneos, “não podemos pronunciar-nos. Podem ser importantes, ou mesmo consideráveis, mas nem nós, nem ninguém está em condições de dizer qual a sua extensão”, prosseguiu, esperando que os inspetores da AIEA “possam regressar ao local o mais rapidamente possível”.A agência garantiu que os níveis de radiação junto aos três locais atingidos se mantiveram estáveis, enquanto as autoridades iranianas confirmaram não ter havido mortos, confirmando a ideia de que a maioria do pessoal já fora retirado das centrais.Ali Shamkhani, um dos conselheiros do guia supremo, o ayatollah Ali Khamenei, garantiu no X que, apesar dos ataques, o Irão mantém as reservas de urânio enriquecido. “Mesmo que as instalações nucleares sejam destruídas, o jogo não acabou, os materiais enriquecidos, o saber-fazer local e a vontade política permanecem”, escreveu.Teerão promete retaliarO ministro dos Negócios Estrangeiros do Irão, Abbas Araghchi, considerou os ataques dos EUA “ultrajantes” e afirmou que Teerão está a reservar “todas as opções para defender a sua soberania”..Com a bola no seu campo, o regime dos ayatollahs terá de decidir se responde rapidamente, por exemplo atacando as bases ou interesses americanos na região. Após dez dias de ataques cruzados com Israel, os analistas estimam que Teerão ainda tem a capacidade militar para o fazer, contando, para isso, com metade do seu stock de 3000 mísseis. Esta ideia foi ontem veiculada por Ali Akbar Velayati, outro conselheiro de Khamenei, que garantiu: “Já não há lugar para os EUA ou para as suas bases nesta região e no mundo islâmico.”Um dos alvos mais próximos é a sede da 5.ª Frota da Marinha dos EUA em Mina Salman, no Bahrein. Mas o Irão pode hesitar em atacar um Estado árabe vizinho. Poderá antes usar os seus proxies, grupos xiitas que apoia e lhe são fiéis, no Iraque e na Síria para atacar qualquer uma das bases americanas relativamente isoladas em At-Tanf, Ain Al-Asad ou Erbil. Quando em 2020 Trump ordenou o assassínio do líder dos Guardas da Revolução, Qassim Suleimani, o Irão retaliou contra militares americanos no Iraque, mas evitou qualquer morte, avisando com antecedência.O Irão pode ainda optar por atacar navios de guerra americanos ou pedir aos seus aliados no Iémen, os houthis, que retomem os ataques contra os navios ocidentais que passam entre o Oceano Índico e o Mar Vermelho.O regime iraniano e o seu guia supremo pode ainda optar por só retaliar mais tarde, aproveitando que os EUA já não estejam em alerta máximo. Nesse caso poderia escolher como alvo missões diplomáticas, consulares ou comerciais dos EUA, ou optar pelo assassinato de indivíduos. O risco aqui é que isso provocaria, sem dúvidas, novos ataques dos EUA.Finalmente, o Irão pode decidir não responder, aceitando antes a proposta do presidente Trump para voltar às negociações. Mas isso implicaria aceitar abandonar o seu programa nuclear - uma imagem de fraqueza que poucos acreditam que Teerão esteja disposta a dar.Entretanto, o Departamento de Segurança Interna emitiu um boletim a alertar para um “ambiente de ameaça elevada” nos EUA e para a possibilidade de “ataques cibernéticos de baixo nível”, bem como eventuais ataques de lobos solitários após os ataques dos EUA contra o Irão.A carta do Estreito de OrmuzSob um coro de apelos à contenção vindos da comunidade internacional, o Parlamento iraniano terá aprovado o encerramento do Estreito de Ormuz. Mas a decisão final cabe a Khamenei. O canal entre o Irão e Omã é o ponto de passagem para um quarto do comércio mundial de petróleo por via marítima - e cerca de um quinto de todo o transporte de petróleo. O seu encerramento faria, sem dúvida, disparar os preços..EUA bombardeiam Irão. Trump diz que instalações nucleares foram "obliteradas" e exige que se faça a paz