Estádio Constant Vanden Stock
Estádio Constant Vanden StockRSC Anderlecht

Escutas em camarote durante jogos da Champions serviram para investigar ligação da Huawei a eurodeputados

Autoridades belgas colocaram escutas num camarote alugado pela empresa chinesa no estádio do Anderlecht para intercetarem conversas. Um lobista português foi preso em março.
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O Minsitério Público belga utilizou escutas durante jogos de futebol da Liga dos Campeões no estádio do Anderlecht para investigar a ligação entre a gigante tecnológica chinesa Huawei e alguns eurodeputados e lobistas, entre os quais o português Nuno Wahnon Martins, detido em março passado.

Segundo desvenda o site Politico, a gigante chinesa de tecnologia Huawei alugou um camarote privado no Estádio Constant Vanden Stock, do Anderlecht, em Bruxelas, para a temporada 2024/25, com o alegado objetivo de influenciar deputados e lobistas do Parlamento Europeu (MEPs). O espaço, adquirido por cerca de 50 mil euros, terá servido para seduzir deputados europeus durante partidas da Champions, que nesta época levaram até Bruxelas equipas como o FC Porto, o Fenerbahçe e a Real Sociedad.

De acordo com fontes da investigação citadas pelo Politico, as autoridades de investigação belgas colocaram escutas no camarote para intercetarem conversas, além de monitorizarem um dos principais lobistas da Huawei. Esta vigilância fez parte de uma ampla investigação sobre alegações de corrupção, que investiga se a empresa chinesa de comunicações tentou comprar influência política dentro da União Europeia.

As autoridades belgas suspeitam que o camarote era usado para estabelecer contactos com políticos, muitas vezes através de convites iniciais aos assistentes destes. Essa "cortesia" era posteriormente estendida a eurodeputados de diversos grupos políticos, ex-deputados e outros funcionários da UE.

A investigação, que começou a ganhar destaque em março passado, aponta que as práticas incluíam subornos, presentes excessivos, como despesas de viagem e refeições, além de convites regulares para jogos de futebol, disfarçados como lóbi comercial. As ações da Huawei teriam ocorrido entre 2021 e o final de 2024, segundo os promotores belgas.

O que se sabe sobre o caso até agora?

A investigação sobre as práticas de lóbi da Huawei abalou o Parlamento Europeu. A 13 de março, as autoridades belgas realizaram 21 buscas na Bélgica, em França e em Portugal, incluindo a sede da Huawei em Bruxelas e escritórios de assistentes parlamentares.

As operações culminaram em várias detenções - entre as quais a de Nuno Wahnon Martins, o lobista português envolvido -, e na apreensão de documentos e dispositivos eletrónicos. Oito indivíduos foram acusados por crimes como corrupção, lavagem de dinheiro e participação em organização criminosa. Três suspeitos permanecem detidos, três estão sob vigilância eletrónica e dois foram libertados sob condições, lembra a Euronews.

Embora os nomes dos suspeitos não tenham sido oficialmente divulgados, foram apontados na comunicação social os nomes de Valerio Ottati, lobista belga-italiano e diretor de assuntos públicos da Huawei na UE, como uma figura central no alegado esquema de corrupção. Abraham Liu, representante-chefe da Huawei para as instituições da UE, também foi citado em algumas reportagens.

Além disso, o Minstério Público belga solicitou o levantamento da imunidade de quatro deputados europeus: os italianos Salvatore De Meo e Fulvio Martusciello (Partido Popular Europeu), o socialista maltês Daniel Attard (do S & D, Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas) e o búlgaro Nikola Minchev (do Renovar a Europa). Houve também um pedido inicial para suspender a imunidade da eurodeputada italiana Giusi Princi, mas este acabou por ser retirado.

Esta investigação também trouxe de volta ao escrutínio uma carta de 2021, assinada por oito eurodeputados, que defendia o desenvolvimento da tecnologia 5G na Europa sem entraves geopolíticos. Embora não mencionasse a Huawei explicitamente, os promotores belgas acreditam que essa carta foi elaborada para promover os interesses da empresa. Cinco dos deputados que assinaram a carta e ainda são membros do Parlamento negaram à Euronews ter recebido qualquer pagamento da Huawei.

Nenhum dos deputados europeus foi acusado e todos negam qualquer irregularidade, lembra o Politico. Um pedido de levantamento da imunidade de um deputado europeu não implica que ele tenha infringido qualquer lei. Segundo a lei belga, essa é uma medida necessária para que a polícia possa convocar os eurodeputados para interrogatório e investigar completamente o caso.

Nas regras de lobbying estabelecidas no seio das instituições europeias, os eurodeputados podem aceitar presentes, mas devem declará-los se o valor for superior a 150 euros.

Como consequência da investigação, o Parlamento Europeu baniu temporariamente lobistas da Huawei das suas instalações em Bruxelas, Estrasburgo e Luxemburgo. A Comissão Europeia também suspendeu relações com a empresa, declarando que não se reunirá com grupos que representem os interesses da Huawei. A empresa, por sua vez, afirmou que mantém uma política de “tolerância zero” para a corrupção e que está comprometida em cooperar com as autoridades.

Estádio Constant Vanden Stock
Lobista Nuno Wahnon Martins é o português detido na operação que investiga corrupção da Huawei e eurodeputados

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