Era uma questão de saber “quando” é que as estruturas metalorgânicas seriam laureadas com um Nobel. Esse dia chegou esta quarta-feira, e Susumu Kitagawa (Universidade de Quioto, Japão), Richard Robson (Universidade de Melbourne, Austrália) e Omar Yaghi (Universidade da Califórnia, EUA) receberam o prémio atribuído pela Real Academia Sueca de Ciências.No centro do prémio de 11 milhões de coroas suecas (aproximadamente um milhão de euros) estão estruturas altamente porosas criadas pelos três cientistas que, na prática, funcionam como uma malha com metal no centro, com ‘buracos’ por onde passam moléculas. No fundo, como se fosse um pedaço de crochê molecular onde substâncias (como gases ou outros produtos) podem passar. Ou seja: estes três cientistas criaram uma nova forma de arquitetura molecular.Ouvida pelo DN, Ana Estévez, investigadora na secção de Engenharia Química e Bioquímica da Faculdade de Ciências e Tecnologias (FCT) da Universidade Nova, explica como funcionam: “Estes materiais têm um metal no centro da estrutura. Dependendo da aplicação, as quatro estruturas químicas e o metal podem mudar. Ou seja, há, a nível científico, milhares de estruturas químicas, completamente diferentes, com metais completamente diferentes consoante o uso.”Há contudo uma grande vantagem no uso destas estruturas. Segundo Ana Estévez, “são muito grandes em relação a outro material”, o que permite que se capturem “uma grande quantidade de gases tóxicos, de CO2 e substâncias, para poder fazer descontaminações”. Este é um dos usos apontados pela investigadora, que especifica que com a utilização destas estruturas metalorgâncias podem purificar-se substâncias tão diversas como o ar ou a água. “Também se utilizam, por exemplo, para evitar a contaminação do ambiente, fazer separação de gases para os utilizar novamente, aplicando-os em economia circular”, diz Ana Estévez, acrescentando ainda uma vantagem: “Com estes materiais, é precisa uma quantidade muito pequena para capturar elementos. No fundo, cada grama deste composto tem milhares de campos de futebol lá dentro e isso dá uma propriedade única de, com muito pouco material, se conseguir capturar uma grande quantidade de gases tóxicos, que podem ser removidos e com isso ter ar e água mais puros.” O Comité do Nobel destaca ainda que, graças a estas estruturas metalorgânicas, pode até retirar-se água de ar do deserto.Contactado minutos após se saber da atribuição do Prémio nobel, Omar Yaghi disse estar “atónito” com a atribuição. Recordando o seu percurso desde o campo de refugiados palestinianos na Jordânia onde nasceu até agora, o investigador da Universidade da Califórnia explicou que o seu “sonho era publicar pelo menos um artigo científico” que fosse citado cem vezes. “Agora, os meus alunos dizem que o nosso grupo já recebeu mais de 250 mil citações. Então sim, foi inesperado. Mas a beleza da Química é que, se se aprende a controlar matéria a nível atómico e molecular, o potencial é ótimo. Nós abrimos uma mina de ouro”, descreveu o cientista. Apesar da importância o australiano Richard Robson recordou que quando decidiu construir esta nova estrutura molecular, “algumas pessoas pensaram que não fazia sentido. Mas não foi bem assim”, disse.Confessando-se “surpreendido e agradado”, Kitagawa brincou com a situação e conta como soube da notícia enquanto acabava algum trabalho em sala de aula. “Tenho recebido muitas chamadas estranhas a tentar vender coisas. Pensando ser o mesmo, atendi o telefone de mau humor apenas para ser surpreendido ao ouvir o presidente do comité de seleção da Academia”, brincou..Nobel da Química atribuído a Susumu Kitagawa, Richard Robson e Omar M. Yaghi .Efeito túnel “na palma da mão”: a experiência que deu um Nobel