A COP30 terminou em Belém do Pará, no Brasil, com um acordo de compromisso que evitou o colapso das negociações, mas que deixou expostas as divisões profundas entre países e um vazio significativo no tema que mais condiciona o clima: os combustíveis fósseis. Para Francisco Ferreira, presidente da associação ambientalista Zero, é claro que as conclusões da Conferência das Nações Unidas sobre o Clima ficaram "aquém do que o planeta exige".O ambientalista recorda que esta conferência deveria marcar "o momento da verdade e da implementação". No entanto, a verdade, diz, foi dura: "Continuamos, infelizmente, numa trajetória de aquecimento de 2,5°C em relação à era pré-industrial" - acima, portanto, da meta de 1,5º C acordada há dez anos em Paris. Depois de duas semanas de negociações tensas, que entraram pela madrugada dentro, os governos aprovaram um texto final sem qualquer menção a petróleo, gás ou carvão - apenas uma referência discreta ao acordo alcançado na COP28, no Dubai, em 2023, para avançar na transição para uma era pós-combustíveis fósseis - remetendo essa discussão para um documento paralelo emitido pela presidência brasileira.O acordo final desta COP30 prevê que os países ricos tripliquem, até 2035, o apoio financeiro para adaptação climática, em especial para nações vulneráveis que já lidam com a subida do nível do mar, ondas de calor e fenómenos extremos.Para António Correa do Lago, presidente da COP30, o compromisso encontrado foi o possível. Admitiu que “alguns tiveram maiores ambições”, mas defendeu que o acordo mantém viva a cooperação internacional num momento de tensões políticas evidenciadas pela ausência dos Estados Unidos, que não enviaram delegação oficial. Ainda assim, para muitos, a omissão dos combustíveis fósseis simbolizou uma cedência excessiva. O negociador do Panamá, Juan Carlos Monterrey, resumiu o desconforto ao dizer que um texto que nem sequer menciona os combustíveis fósseis “não é neutralidade, é cumplicidade”.É também neste ponto que Francisco Ferreira insiste. Para o presidente da Zero, esta COP “era, supostamente, a COP da verdade e da implementação”, mas o resultado mostra que “continuamos, infelizmente, numa trajetória de aquecimento de 2,5 graus em relação à era pré-industrial”. O ambientalista diz que as metas nacionais apresentadas pelos países também “não tiveram aqui um impulso, uma ambição suficiente”, o que deixa o mundo exposto a impactos cada vez mais severos, especialmente nas regiões com menos meios para responder.Francisco Ferreira reconhece que a conferência trouxe melhorias no controlo e transparência do financiamento climático, mas lembra que “falta ainda concretizar como se vão atingir os valores que são necessários, de 1,3 biliões de dólares por ano em 2035”. "Mesmo o triplicar do financiamento para adaptação é só para ser verificado em 2035”, acrescenta, o que na sua opinião fragiliza o impacto real do acordo junto dos países que enfrentam já hoje perdas e danos.Mas “a maior desilusão” é mesmo a falta de um roteiro concreto de implementação de medidas que desliguem a dependência de combustíveis fósseis, “a principal responsável pelo aquecimento da atmosfera”, lembra. Em vez disso, diz, fica apenas “uma promessa fora da Convenção por parte da Presidência brasileira para os próximos meses”. Por isso, conclui, “esta conferência está longe da ação, da implementação prometida”.Ainda assim, Ferreira assinala alguns avanços. “Salva-nos realmente termos um acordo”, afirma, sublinhando que isso impede que certos países, “a começar pelos Estados Unidos”, possam argumentar que nada foi decidido. Entre os avanços, "talvez um dos mais importantes seja naquilo que é a transição justa, porque aí vamos ter todo o mecanismo que vai permitir fazer uma transição energética onde as pessoas vão ser ouvidas, vão ser apoiadas, para que nos países onde esta mudança de empregos, esta necessidade de termos realmente uma resposta, uma transição para energias renováveis, abandonando os fósseis, seja feita e apoiada com os menores impactos sociais e também ambientais possíveis", refere.. No capítulo da adaptação, Ferreira lembra que há “indicadores aprovados”, mas avisa que "continuam a faltar obrigações, apoios concretos e mecanismos de cumprimento que garantam que os países acompanham e monitorizam de forma séria a resposta às alterações climáticas".Num balanço global, o presidente da Zero diz que houve “avanços”, mas reforça que “esta COP30 falhou realmente naquilo que era essencial”. Aponta o boicote da Arábia Saudita e de outros países produtores de combustíveis fósseis, bem como a presença “muito discreta” da China e a postura da Índia, como fatores que bloquearam o progresso num acordo claro para abandonar gradualmente os combustíveis fósseis, compromisso que tinha sido sinalizado na COP do Dubai há dois anos.No fim do encontro, Francisco Ferreira diz que a COP30 “acabou por valer a pena”, mas admite que é “sempre triste chegarmos ao fim e percebermos que as necessidades do planeta e dos compromissos, principalmente dos países desenvolvidos, ficaram muito aquém daquilo que aqui se esperava”..Combustíveis fósseis e desflorestação terão roteiros própriosPresente no Brasil, a ministra portuguesa do Ambiente, Maria da Graça Carvalho, disse que o roteiro para o abandono dos combustíveis fósseis, exigido por dezenas de países, mas que fica fora do texto final da COP30, não será esquecido e voltará a ser trabalhado.“Há a promessa da própria presidência brasileira – que nos disse que aqui teve de ser neutra, porque era a presidência, - de no próximo ano promover reuniões internacionais no roteiro dos combustíveis fósseis e na floresta, portanto isso não vai cair”, disse Maria da Graça Carvalho aos jornalistas após sair de uma reunião das delegações da União Europeia na conferência do clima de Belém, a COP30, em que foi acordado aceitar o texto final da presidência brasileira..Isso mesmo foi confirmado pelo presidente da conferência do clima de Belém, que prometeu no plenário final lançar um roteiro para abandonar os combustíveis fósseis e outro para parar e reverter a desflorestação.“Como presidente da COP 30, criarei dois roteiros: um sobre travar e reverter a desflorestação e outro sobre o abandono dos combustíveis fósseis de maneira justa, ordenada e equitativa”, disse André Correa do Lago, cuja declaração motivou um forte aplauso das delegações no plenário.O presidente da COP30 acrescentou que estes roteiros serão “guiados pela ciência e serão inclusivos”..COP30. Aprovado projeto final sem menção às energias fósseis