“Armada com um olhar de aço, Metreweli fala fluentemente a língua humana, com um pequeno sorriso ocasional.” A descrição, pela pena de uma jornalista do site Politico, retrata a nova chefe dos serviços secretos externos britânicos (MI6) depois da sua primeira aparição pública. Blaise Florence Metreweli, de 48 anos, a primeira mulher no cargo, não foi nomeada para preencher quotas. Aquando da notícia de que iria substituir no cargo Richard Moore, em junho, o primeiro-ministro Keir Starmer disse estar confiante de que “Blaise continuará a fornecer a liderança de excelência necessária para defender” o Reino Unido. “A histórica nomeação de Blaise Metreweli ocorre num momento em que o trabalho dos nossos serviços de informações nunca foi tão vital.” Essa ideia foi também relevada pela própria no discurso proferido na segunda-feira, na sala de jantar de C., a letra correspondente ao cargo desde o primeiro chefe, o capitão Mansfield Smith-Cumming. A primeira parte do texto foi dedicado às transformações em curso, as quais deixam à vista novos perigos como “alguns algoritmos” que se tornam “tão poderosos quanto os próprios Estados”, ferramentas que, diz, “podem tornar-se num novo vetor de conflito e controlo”. Em paralelo, “o poder em si está a tornar-se mais difuso, mais imprevisível, à medida que o controlo sobre estas tecnologias transita dos Estados para as empresas e, por vezes, para os indivíduos”, no que aparenta ser uma chamada de atenção para os oligarcas das grandes empresas tecnológicas. “O desafio definidor do século XXI não é simplesmente quem detém as tecnologias mais poderosas, mas quem as orienta com maior sabedoria. A nossa segurança, a nossa prosperidade e a nossa humanidade dependem disso”, disse, e ligando ao serviço que dirige, disse que também cabe ao MI6 um papel crucial neste campo. A inteligência artificial e a tecnologia são temas nos quais Metreweli é versada, apesar de a sua formação de base ser Antropologia em Pembroke, na Universidade de Cambridge (onde fez parte de uma equipa de remo). Revelou numa entrevista datada de 2022 ao Financial Times, com o pseudónimo Ada, que era uma “nerd” que sempre sonhou em ser espia, tendo recordado que aprendeu a escrever em código em criança. Longe das brincadeiras da infância, já como chefe de agentes de campo, teve de familiarizar-se com tecnologia nuclear. Não é público se obteve mais conhecimentos tecnológicos e científicos, mas depois de ter sido “diretora K.”, isto é, chefe da Contraespionagem para os países hostis no MI5 (de 2021 a 2025), regressou ao MI6 para dirigir o departamento de Tecnologia e Inovação (“Q.”) Sabe-se que passou anos em vários locais no Médio Oriente quando o Reino Unido esteve envolvido militarmente no Iraque e no Afeganistão, mas também posteriormente. John Sawers, que foi chefe do MI6 entre 2009 e 2014, revelou à BBC4 que nesse período Blaise Metreweli dirigia um posto: “Não conhecia a Blaise antes de me tornar chefe, mas encontrei-a numa das minhas primeiras viagens ao Médio Oriente”, onde estava a fazer “um trabalho excelente”, recordou. “Ninguém tem um caminho dourado neste mundo, mas ela claramente tinha potencial de liderança: tinha uma grande presença; uma figura bastante inspiradora; muito clara e focada; mas também possui um sentido de humor rápido e é boa em gerir pessoas.” Metreweli, que viveu na Arábia Saudita em criança (e também em Hong Kong), fala árabe e há quem aposte que ela tenha como objetivo restaurar a influência britânica na região. “Imagino que haverá bastante vontade de ver se o Reino Unido irá fazer uma diferença útil”, disse um ex-colega do MI6 ao Arab News. Mas no discurso de segunda-feira, C. não se referiu ao Médio Oriente e quebrou a tradição do antecessor de pintar um quadro das ameaças globais, para se centrar numa só: a Rússia. “A exportação do caos é uma característica e não um defeito desta abordagem russa ao envolvimento internacional; e devemos estar preparados para que isto continue até que Putin seja forçado a alterar o seu cálculo”, disse. O avô de Metreweli, Constantine Dobrowolski, foi um soldado do Exército Vermelho de origem ucraniana e agente secreto nazi, tendo desertado para o campo alemão, onde foi responsável direto pelo extermínio de judeus. “É precisamente esse legado complexo que contribuiu para o seu compromisso em prevenir conflitos e proteger a população britânica das ameaças modernas provenientes de Estados hostis”, defendeu o Ministério dos Negócios Estrangeiros britânico em junho, quando foi revelada a notícia do avô de Metreweli, cujo apelido de origem georgiana se deve ao padrasto do pai.