Vladimir Putin falou pela primeira vez sobre a guerra na Ucrânia desde a entrada na agenda da proposta russa via Estados Unidos. O líder russo mostrou-se aberto a negociações “sérias”, mas não com o homólogo ucraniano, e apontou para o fim das hostilidades assim as tropas ucranianas retirem do seu próprio território. Sob uma aparente flexibilidade, Putin mostrou estar a seguir as metas maximalistas delineadas desde o início da “operação militar especial”. Pelo meio, ainda acusou a União Europeia de orquestrar um “roubo”, em referência aos ativos russos congelados que poderão vir a ser usados para ajudar a Ucrânia.“Se as tropas ucranianas abandonarem os territórios ocupados, então cessaremos as hostilidades; se não o fizerem, iremos consegui-lo por meios militares”, disse o líder russo em Bisqueque, capital do Quirguistão, ao referir-se em público à guerra pela primeira vez desde que os Estados Unidos tentar forçar um acordo à Ucrânia. Putin inverteu a lógica de quem ocupa o quê: segundo o seu ponto de vista, Donetsk, Kherson e Zaporíjia foram incorporados na Federação Russa (tal como Lugansk e a Crimeia, estes totalmente sob ocupação russa), pelo que é o exército ucraniano o invasor. Nada disto é novo. Em junho de 2024, Putin declarou que ordenaria um cessar-fogo imediato se a Ucrânia retirasse as tropas das quatro regiões ocupadas por Moscovo e se renunciasse aos seus planos de aderir à NATO. Uma ideia de pronto rejeitada pela Ucrânia e pelos aliados ocidentais e que surgiu na véspera de uma cimeira sobre a paz, realizada na Suíça, mas sem a presença da Rússia. Questionado sobre o chamado plano de paz, retirou a urgência do mesmo ao considerar que foi “colocada uma série de questões para discussão”, mas que não existem “versões finais”. Por outro lado, admitiu que o plano foi discutido antes da cimeira que protagonizou com Donald Trump no Alasca. “Como anunciei publicamente, foi-nos transmitido através de certos canais. Nós analisámo-lo. Depois disso, decorreram negociações em Genebra entre a delegação americana e a delegação ucraniana. E eles, pelo que entendo, decidiram que todos os 28 pontos deveriam ser divididos em quatro componentes separados”, comentou.Ainda sobre o tema, disse que o seu país está pronto para “negociações sérias” em torno do plano e elogiou os EUA por terem em conta a sua posição. Porém, se alguns dos pontos são considerados aceitáveis, outros terão de ser discutidos. À cabeça a questão territorial, que considerou um “ponto chave” nas negociações. Segundo o comandante das forças invasoras, há que reconhecer “de facto” a Crimeia, Donetsk e Lugansk como território russo. Sem surpresa, este ponto foi considerado inaceitável para a Ucrânia. .Enviado de Trump deu conselhos a Moscovo sobre plano de paz.Em defesa de WitkoffO russo confirmou que uma delegação dos EUA visitará Moscovo na próxima semana, e aproveitou para elogiar Steve Witkoff o enviado e amigo de Trump, cuja conversa com o russo Yuri Ushakov, assessor do Kremlin, foi tornada pública pela Bloomberg. “Um homem inteligente”, disse Putin do empresário do imobiliário. “O sr. Witkoff estará claramente a viajar para Moscovo por ordem do presidente Trump para negociar connosco”, concluiu..Ao mesmo tempo que Putin demonstrou simpatia pelo norte-americano, desconsiderou mais uma vez Volodymyr Zelensky. “Assinar documentos com a liderança ucraniana é inútil. Já falei sobre esta questão muitas vezes. Acredito que a liderança ucraniana cometeu um erro estratégico fundamental ao ter medo de realizar uma eleição presidencial, após a qual o presidente perdeu o seu estatuto legítimo”, comentou, ignorando que um país em guerra não tem condições para realizar um escrutínio justo e livre. “Claro que, no final, queremos alcançar um acordo com a Ucrânia, mas neste momento, é praticamente impossível. Legalmente impossível. Que negoceiem aqueles que podem e querem. Precisamos que as nossas decisões sejam reconhecidas internacionalmente pelos principais atores globais.” .Europa acelera para fechar acordo sobre uso de ativos russos para apoiar Kiev.Sobre a hipótese de a União Europeia avançar com o dinheiro dos ativos russos congelados (140 mil milhões de euros) para ajudar a Ucrânia, o presidente russo disse que Moscovo está a elaborar medidas recíprocas. Afirmou que usar os ativos congelados para financiar o empréstimo é como um “roubo de propriedade alheia” e uma medida que prejudicaria a imagem da Europa no plano internacional. Por fim, qualificou de “ridícula” a ideia de a Rússia ter planos de agressão à Europa e que está pronto a comprometer-se por escrito em como não o fará.No que respeita às negociações sobre o plano de paz, o chefe de gabinete da presidência da Ucrânia Andriy Yermak anunciou o regresso à mesa entre delegações ucraniana e americana para o final da semana, para “aprofundar os resultados obtidos em Genebra”. Numa mensagem no X, considerou “essencial não perder produtividade” e “trabalhar rapidamente” para que se alcance o objetivo: “Alcançar o mais rapidamente possível uma paz duradoura e digna para a Ucrânia”.