Partindo da chamada "quarta revolução" ou "revolução social", iniciada temporalmente pela instalação do sovietismo na Rússia (1917-1918), a palavra "democracia" teve um alargamento de significado, porque designando na sua autenticidade original, o governo por todo o povo, multiplicou as formas de "governo representativo", mas também foi violentada para adjetivar variedades totalitárias, ou, mais moderadamente, chamadas de "autoridade". Inquieto com o facto de a variação semântica ser acompanhada pela decadência do Ocidente, que avaliou de 1500 até à atualidade (2000), Jacques Barzun decidiu usar uma nova expressão: "Para alcançar uma maior clareza de pensamento quanto ao etos desse período em declínio utilizaremos o termo demótico, que significa povo." Uma designação que se afirmou quando se deu ao trabalho de inventariar as propostas usadas para caracterizações da "nossa época" e que inclui, entre mais, as seguintes: época de incertezas, época da ciência, época de massacres, época do globalismo, época de ditaduras, época de derrotas, época de ira, época de expectativas absurdas. Retendo a expressão "época de globalismo", aquela em que vivemos e em que o outono ocidental se agrava, com analistas a simplificar o batismo da circunstância concluindo que há guerra em toda a parte, alargando por exigência da realidade o conceito de guerra, conclui que o mundo demótico foi limitado de facto pela evolução do que hoje mais agride as sociedades civis, que é o terrorismo. Na investigação que ficamos a dever ao professor Christopher Andrew (D. Quixote, 2018), ocupando-se de O Mundo Secreto e particularmente da época que chama "idade de ouro do assassinato", desde o "levantamento" irlandês contra a soberania inglesa na Irlanda até à guerra de 1914 (anarquistas, revolucionários e Mão Negra), conclui que foram mortos cerca de 150 pessoas e menos de 500 sofreram ferimentos; a especificidade é que o número refere-se principalmente a chefes de Estado e de governo: Alexandre II da Rússia (1881), Isabel da Áustria (1898), Humberto I de Itália (1900), D. Carlos de Portugal e o seu herdeiro (1908), Jorge I da Grécia (1913), o presidente Carnot da França (1894), o presidente William McKinley dos EUA (1901), o primeiro-ministro Cánovas del Castillo de Espanha (1897) e Piotr Stolypin da Rússia (1911)..Esta prática, atribuída principalmente a movimentos qualificados de anarquistas e agindo sobretudo no Ocidente, visava chamar o povo à "evidência" da justa necessidade da revolta contra o poder "despótico", ainda que coberto por uma aparência "demótica", mas que mostraria a sua debilidade perante o triunfo da revolta popular. Cita a propósito a declaração do assassino da imperatriz Isabel da Áustria, confessando: "Vim a Genebra matar um soberano com o propósito de dar exemplo aos que sofrem e aos que nada fazem para melhorar a sua posição social: por isso não me importava que soberano matava." Que existisse um "mundo demótico" era, nesta perceção, uma errada visão "utópica", porque uma tal realidade continuava a não existir na terra, mas não era uma impossibilidade, era o resultado da imposição de um poder injusto. Ter chegado a uma época chamada "da ciência", embora tenha assegurado benefícios que melhoram a efetividade dos direitos humanos, também implicou uma alteração qualitativa da violência: assim como se multiplicaram os poderes políticos com a capacidade de, recorrendo ao extremo dos poderes militares disponíveis, destruir o planeta terra, também permitiu aos poderes fracos atingirem os fortes, agora sacrificando inocentes..O ataque às Torres Gémeas de Nova Iorque marcará para sempre a mudança, que agora inclui os atentados contra as sociedades civis, utilizando meios rudimentares, esperando que a inocência das vítimas dinamize a quebra de confiança entre cidadãos e governos e a autoridade dos poderes políticos nacionais e internacionais: de novo manipulando o povo, sem a reserva de ataque aos titulares do poder, como na época em que foi chamada "idade de ouro do assassínio" e que agora - quer pelo poder dos Estados que não renunciam ao poder atómico nem guardam memória do horror que foi o ataque da Segunda Guerra Mundial ao Japão, quer pelo uso do poder que a técnica coloca à disposição dos fracos - de facto caminhamos para uma "época dos massacres", se o poder da palavra humanista não travar o programa de tais poderes, estaduais ou terroristas, que recusam a crença no "nunca mais" que animou a fundação da ONU..Os populismos que inquietam a prospetiva das eleições europeias próximas, que começaram como protesto contra a frustração da esperança da ordem e progresso anunciadas, já manifestam dar o passo para finalmente terem liderança e projeto. Que mais uma vez não favorece o poder democrático, ainda que com novo proposto batismo.