Uma gargalhada e outra foi como Marine Le Pen reagiu ao anúncio da candidatura de Nathalie Loiseau no final do debate entre ambas. "Madame Le Pen, eu quero dar-lhe os parabéns. Parabéns, porque conseguiu mudar a minha opinião. Quando entrei aqui eu tinha dito que não era a cabeça-de-lista da maioria às eleições europeias. Quero uma Europa da partilha e não uma Europa da divisão, por isso, esta noite, é verdade, estou pronto para assumir a minha candidatura", disse no programa L'Émmission politique, no canal France 2.."Não tinha premeditado", assegurou ao L'Obs. Mas a forma como lançou a candidatura foi considerada pelos críticos como uma falsa partida, uma vez que Loiseau já tinha dado sinais de que seria candidata. Aliás, a líder da extrema-direita já tinha previsto essa hipótese há um mês. "Nós compreendemos que queres ser cabeça-de-lista às europeias, não exageres", respondeu no Twitter a uma mensagem de Loiseau que acusava Le Pen de tomar "partido contra as forças policiais quando há violência" e tomar "partido contra França quando há interferência estrangeira"..Há uma dúzia de dias, Loiseau também protagonizou um momento de humor, ao dizer que tem um gato chamado Brexit. "Acorda-me todas as manhãs a miar como um louco porque quer sair, mas quando eu abro a porta ele fica parado, indeciso, e depois fica a olhar para mim quando eu o expulso", disse em entrevista ao Journal du Dimanche..No ano passado, o Times de Londres chamou-a de "arma secreta de Macron na luta pelo Brexit": como ministra dos Assuntos Europeus liderou as negociações da saída do Reino Unido em nome de Paris e que os brexiteers deviam temer as suas capacidades de negociadora. Essa característica foi relevada pela deputada de A República em Marcha (LREM) Cendra Motin. "Vamos perder uma grande ministra dos Assuntos Europeus, mas pelo menos não é uma segunda opção. Ela é uma negociadora muito boa e precisamos disso", disse ao La Dépêche..Mas Nathalie Loiseau, de 55 anos, não se notabilizou apenas pela arte da negociação. Muito cedo deu nas vistas. Aos 4 anos já sabia ler. Formou-se na Sciences-Po - quando entrou com 16 anos foi recebida à porta pelo diretor, que felicitou a "futura mais jovem ex-aluna da Escola Nacional de Administração" - e mais tarde na Langues O', onde estudou mandarim e indonésio..Em 1986 concorre com sucesso ao Ministério dos Negócios Estrangeiros. A carreira começou aos 25 anos na Embaixada de França em Jacarta, em 1990. Aí conhece o futuro marido, Bertrand, com quem virá a ter quatro filhos. À Indonésia seguiu-se o Senegal e Marrocos. De regresso a França, em 1993, trabalha junto do ministro dos Negócios Estrangeiros Alain Juppé. Uma relação de trabalho longa: 18 anos depois é nomeada diretora-geral da administração do Ministério, estava Juppé de novo no Quai d'Orsay (mais tarde apoiou o então presidente da Câmara de Bordéus nas primárias da direita, em 2016)..Combater a desinformação dos falcões de Bush.Mas é em Washington que se tornam públicas as suas qualidades. Enquanto chefe do serviço de imprensa e porta-voz da embaixada na capital norte-americana, entre 2002 e 2007. O presidente Jacques Chirac opõe-se à guerra no Iraque e os franceses são alvo de uma campanha vexatória. Mas Loiseau riposta, por exemplo, com uma carta aberta do embaixador Jean-David Levitte publicada no Washington Post, a criticar a "campanha de desinformação" da administração de George W. Bush.."Bush, o Congresso e o terceiro poder estavam contra nós. E todos os gurus da comunicação estavam a aconselhar-nos a ignorar. Com a Nathalie, responsável pelo departamento de comunicação, decidimos retaliar. E nós ganhámos. Durante todo esse tempo, ela permaneceu calma e serena. Ela tem sangue-frio", disse Levitte ao Liberátion ..Quem também ficou impressionada com Loiseau foi a escritora Catherine Clément, que a conheceu em Dakar. "Parecia uma jovem sem história, mas tem uma personalidade dos diabos. Ela não tem medo de nada.".Feminista e escritora.Em 2012 assumiu a direção da ENA, onde defendeu "uma diversidade de talentos". Feminista, tornou-se a segunda mulher à frente da instituição e aproveitou o púlpito para defender que as mulheres ocupem mais cargos de responsabilidade. "É normal que os homens tenham um emprego, uma família, passatempos e paixões. As mulheres também devem permitir-se tudo isto ao mesmo tempo", afirmou então ao Le Figaro ..À paixão pela leitura correspondia o sonho de escrever. O sonho materializou-se ao escrever Choisissez tout (edição JC Lattès). Nesse livro defende a igualdade entre homens e mulheres através de histórias que testemunhou ou protagonizou..Ela diz ser o exemplo de que uma mulher pode ter uma vida profissional e familiar, desde que se pense na organização do trabalho. O seu filho mais novo, de 12 anos, por exemplo, costumava fazer os trabalhos de casa no Quai d'Orsay. No ministério, quando teve a seu cargo a direção administrativa, proibiu as reuniões após as 19.00..Após a derrota de Juppé nas primárias, Loiseau junta-se ao movimento de Emmanuel Macron. É nomeada ministra dos Assuntos Europeus em junho de 2017, mas agora o desafio é outro. O presidente francês quer reformar a União Europeia a começar pelo Parlamento, onde quer quebrar a hegemonia dos grupos parlamentares do Partido Popular Europeu e dos Socialistas e Democratas, estabelecendo uma aliança com os Verdes. E Loiseau é a escolhida..Ao anunciar a sua demissão de ministra para liderar a lista do LREM perguntou: "Lembram-se do mote 'recuperar o controlo'? Foi um bom mote, mas dava a resposta errada, e podemos ver o estado em que se encontram agora", disse a propósito dos defensores do Brexit. "Recuperar o controlo do nosso destino só pode ser alcançado com a Europa", concluiu.