"Mais novos são tão suscetíveis à infeção como os grupos seguintes"
Era previsível que 13,5 % das pessoas pudessem já ter adquirido anticorpos por infeção nesta altura?
Não surpreende. No primeiro inquérito, entre maio e julho de 2020, obtivemos uma seroprevalência de 2,9 %. A partir de outubro, e com maior incidência em janeiro e fevereiro deste ano, há uma intensidade muito elevada da epidemia da covid, e portanto era expectável que tivéssemos mais pessoas com anticorpos.
Também significa que há muito mais casos de infeção do que os registados?
O que é natural e esperado. No primeiro inquérito tínhamos uma seroprevalência cerca de cinco vezes mais elevada. Agora, não chega ao dobro o número de pessoas que tiveram um contacto com o vírus comparativamente aos casos conhecidos a partir do sistema nacional de vigilância epidemiológica. É esperado tendo em conta vários fatores, e um deles é haver pessoas com a infeção assintomáticas.
Essa diferença diminuiu bastante.
É um resultado francamente positivo e que corrobora o que vamos observando: um alargamento progressivo da testagem, mais concretamente nos últimos meses. É uma estratégia de testagem não direcionada apenas para as pessoas com sintomas ou os seus contactos, passa também por testar pessoas assintomáticas.
Quer dizer que teremos pelo menos 1,5 milhões de infetados...
Um pouco menos, à volta de 1,3 milhões terão tido a infeção
Outro dado é que quem tem menos de 20 anos é tão suscetível à infeção como os outros grupos.
É uma das principais conclusões do nosso estudo. Estudámos dois grupos: as crianças até aos 9 anos e depois os adolescentes e jovens até aos 19. A proporção dos que têm anticorpos contra o coronavírus não é diferente dos grupos etários seguintes, dos 30 aos 39 anos. A nossa hipótese é que as pessoas mais novas têm uma assintomatologia mais ligeira e não são tão captáveis no sistema de vigilância.
Poderá também ter a ver com a variante inglesa? No início, dizia-se que tinha mais impacto junto dos mais novos.
Não é possível diferenciar pelos testes serológicos com que variante do vírus a pessoa contactou. Mas já no primeiro inquérito as estimativas que obtivemos para os abaixo dos 20 anos mostravam que não havia diferença em relação aos grupos seguintes. Na altura, tínhamos uma amostra de 2300 pessoas, não era suficiente para dizermos que as diferenças tinham significado estatístico. Foi uma das razões que nos levou a aumentar a amostra, para conseguirmos confirmar, ou não, se essa diferença existia. Com esta amostra de 8463 pessoas não encontramos diferenças.
Tendo em conta os 13,5 % que adquiriram anticorpos pela infeção e que 8% da população (827 839 esta terça-feira) levou as duas doses da vacina, podemos dizer que 21,5 % estão imunizados?
É uma extrapolação legítima. Esta é uma realidade dinâmica e os 2 % de imunidade atribuída a 31 de março, quando terminou o inquérito, têm agora um valor diferente. Apesar de o grupo de vacinados incluído no inquérito ser reduzido, 450 pessoas tinham pelo menos uma dose, 98,5 % tinha anticorpos uma semana depois de tomar as duas doses. Andará à volta dos 21% de indivíduos imunizados, sendo que é uma estimativa por defeito. E não podemos esquecer que mais de 2,2 milhões [2 225 338] já tomaram uma dose e têm anticorpos.
Além de que a vossa amostra não inclui quem tem mais de 80 anos.
Por razões técnicas não foi possível, daí devermos ter cuidado na extrapolação. Recorremos a pessoas que vão aos laboratórios ou aos hospitais para fazer as análises e os mais de 80 anos não têm tanto acesso a estes serviços. Por outro lado, este grupo foi alvo da vacinação enquanto estava a decorrer o estudo e havia mudanças no número de vacinados de dia para dia. É um grupo que foi altamente afetado pela infeção e agora é o mais vacinado. Teremos que desenvolver um estudo dirigido a esta população, o que estamos a avaliar realizar nos próximos tempos.
Quando pensa que se atingirá a imunidade de grupo?
Isso significa que a população tem um nível de imunidade suficiente para impedir a circulação de um agente infeccioso, mesmo nas pessoas que não estão imunizadas. Na infeção por coronavírus não é exatamente assim. As vacinas têm uma eficácia muito elevada, protegem a pessoa de ter uma infeção grave, mas não está afastada a hipótese de a pessoa ser infetada e até transmitir o vírus. O importante é alcançar as metas de 60% a 70% da população vacinada para proteger os mais vulneráveis e limitar a circulação do vírus, tudo complementado com medidas preventivas.
Quando vão repetir o inquérito?
No terceiro trimestre, provavelmente em outubro, para avaliarmos a implementação do programa de vacinação e verificar se a imunidade registada nesta altura se mantém. E, provavelmente, manter o estudo no próximo ano.