Haverá um antes e um depois, quanto ao abuso sexual de menores na Igreja Católica, depois do discurso que o Papa Francisco fez ontem no Vaticano, ao encerrar a cimeira sobre a proteção de menores na Igreja que levou a Roma os presidentes de todas as conferências episcopais espalhadas pelo mundo e ainda os superiores das congregações?.Para o padre José Maria Brito, diretor de comunicação dos Jesuítas em Portugal e diretor do jornal online da congregação (Ponto SJ), "a partir de agora não há álibis para não haver um antes e um depois" em relação à forma como a Igreja trata do problema..Ou seja, depois do que disse Francisco - ele próprio, aliás, também jesuíta -, "este deixou de ser o tempo do Papa e passou a ser o tempo de as igrejas nacionais" atuarem. A intervenção que o Papa fez, disse ainda, representa por isso "uma grande responsabilização das conferências episcopais".."Ninguém pode dizer que não houve uma chamada de atenção à responsabilização", acrescentou, recordando que o chefe da Igreja Católicas exigiu que as "orientações" que existem dentro da Igreja para tratar do problema do abuso sexual de menores devem passar a ser "diretivas"..O que está em causa, no entanto, segundo acrescentou, é de tal monta que não se pode esperar resultados radicais no curto prazo: "É uma mudança estrutural de comportamentos - e isto vai levar tempo.".Os jesuítas foram os autores em Portugal do único manual antipedofilia da Igreja Católica nacional, o "Manual SPC. Sistema de Proteção e Cuidado de Menores e Adultos Vulneráveis", que contém diretivas imperativas para cumprimento nas organizações controladas pela congregação (escolas, colónias de férias, etc.)..Segundo José Maria Brito, esse manual, lançado em junho do ano passado, pode ser, a qualquer momento, adotado por outras organizações religiosas, e até pela Conferência Episcopal para aplicação geral..O facto, porém, é que isso até agora não aconteceu. O que existe no país é um documento de 2012 emitido pela Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), intitulado "Diretrizes referentes ao tratamento dos casos de abuso sexual de menores por parte de membros do clero ou praticados no âmbito da atividade de pessoas jurídicas canónicas", onde se diz, por exemplo, que, perante "indícios ou evidências" de abusos sexuais de menores dentro de instituições religiosas, devem os seus responsáveis "diligenciar de imediato pela cessação desses atos e pela sua punição pelos procedimentos canónicos e legais estabelecidos".Presente na cimeira do Vaticano, o presidente da CEP, cardeal-patriarca D. Manuel Clemente, reconheceu a necessidade de a Igreja Católica portuguesa adotar novas medidas no combate a abusos sexuais pelo clero, admitindo também a possibilidade de um estudo aprofundado em Portugal sobre a matéria.."Tudo aquilo que for necessário fazer para que as coisas se esclareçam, para que se avance, há de ser feito", disse o prelado a jornalistas portugueses presentes na cimeira no Vaticano. Segundo acrescentou, as medidas que a Igreja portuguesa vai adotar terão por base o vade mecum que o Vaticano vai distribuir a todas as conferências episcopais - um documento "mais preciso, mais articulado, mais operativo" e com "ideias mais concretas" do que as contidas nas diretizes da CEP emitidas em 2012..Esse novo texto será analisado pela hierarquia católica nacional antes da assembleia plenária da CEP marcada para abril. "Esse vade mecum, de normas mais concretas e orientadoras, até nos vai facilitar o serviço", considerou Manuel Clemente..O presidente da CEP deixou elogios ao modelo de cimeira escolhido pelo Papa, que classificou como original ao abrir o debate a vários participantes, que disse ter decorrido com "toda a franqueza". "Isto é um exercício de Igreja no seu melhor. Por isso, estou muito grato, estamos todos, ao Papa Francisco, por ter feito algo assim, que eu creio que também é um exemplo para todos nós."