As vagas para este ano foram divulgadas, as candidaturas à primeira fase de acesso ao ensino superior já iniciaram e os próximos tempos avizinham-se caóticos quer em Lisboa quer no Porto, as duas cidades onde mais estudantes universitários se matriculam todos os anos. Milhares procuram anualmente quarto para arrendar, uma tarefa que tende a ser complicada, face à escassez de oportunidades em residências universitárias e aos elevados preços praticados nos alugueres. O ano letivo 2019-2020 arranca com boas notícias para a capital, mas não para o Porto..Em Lisboa, onde atualmente há cerca de duas mil camas para estudantes universitários, a reitoria anunciou que serão disponibilizadas mais 186 já neste ano letivo, por consequência da abertura da nova Residência Universitária da Ajuda - que, numa segunda fase, prevê o alargamento para um total de 300 camas. Um número ainda assim baixo para responder às necessidades dos quase 30 mil deslocados que afluem à capital, uma vez que apenas 9,2% têm lugar em residências públicas, segundo um diagnóstico do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES)..No Porto, esta percentagem é ligeiramente maior, situando-se nos 9,7%, com 15 608 deslocados. Para responder a este problema, o ministério prevê a criação de 1650 novas camas na região norte no Plano Nacional para o Alojamento no Ensino Superior (PNAES) - no qual também está contemplada a nova residência do Campus da Ajuda. Embora não especifique para quando nem por onde serão distribuídas. A certeza é uma: segundo a Reitoria da Universidade do Porto, contactada pelo DN, a instituição não terá qualquer cama a mais disponível neste ano letivo..O PNAES, gerido pelo ministério, planeia a duplicação das camas atualmente existentes a nível nacional (15 370) até 2030, para os 113 813 estudantes deslocados no ensino superior público..Quer as 186 novas camas em Lisboa quer as 1650 previstas para o norte integram a 1.ª fase da obra total em todo o país - correspondente aos próximos quatro anos e que implicará um aumento de 80% do total da obra, mais cerca de 12 mil camas. Sete mil destas estão previstas para a Área Metropolitana de Lisboa, onde também 500 já existentes serão ainda objeto de melhorias. Para a 2.ª fase deste projeto estão previstas pelo menos mais 121 camas para Lisboa, incluindo dois quartos adaptados..Ainda em Lisboa, está prevista a afetação de imóveis devolutos do Estado ao Fundo Nacional de Reabilitação do Edificado. Como é o caso do edifício da 5 de Outubro, cujo projeto está já a decorrer para que ali passem a ser disponibilizadas mais 600 camas a estudantes do ensino superior..Quase nada mudou."Obsceno." Era assim que, há um ano, João Pedro Louro descrevia o processo de procura por um quarto na capital. Na altura como presidente da Associação Académica de Lisboa, atualmente consultor do Conselho Nacional de Educação (CNE) para o ensino superior, falava da dificuldade não só em encontrar um quarto como em encontrar algum com condições mínimas e a preços razoáveis. Desde então, garante, "o que quer que tenha mudado mudou muito pouco"..Entretanto, "o governo lançou mais um programa de alojamento estudantil" (referindo-se ao PNAES), sobre o qual ainda não se viram "grandes desenvolvimentos", diz. O que mudou foi "sobretudo ao nível da substituição por parte de associações e de outras entidades na promoção de residências". Explica com o exemplo da cidade do Porto, onde a Associação Académica, em parceria com a Santa Casa da Misericórdia, está a projetar uma nova residência estudantil..Mas a disponibilidade de camas em residências públicas ainda não responde ao elevado número de estudantes que todos os anos chegam aos grandes centros urbanos. O que faz do aluguer de quartos a única solução, embora raramente viável, devido aos elevados preços praticados na cidade. E, quanto a estes preços, João Pedro Louro garante que tudo "continua na mesma"..Segundo os últimos dados relativos a 2018 da Uniplaces, plataforma online de alojamento, a renda média de um quarto em Lisboa situou-se nos 485 euros - mais 26 do que no ano anterior. Uma tendência que se verifica a nível nacional, onde as rendas aplicadas a estudantes sofreram um aumento de 4% (para a média de 451) nos primeiros meses de 2018, subindo 17 euros face ao período homólogo.."Claro que foi lançado o programa de renda acessível, mas ainda não há resultados destas candidaturas e, por isso, não conseguimos aferir o impacto desta iniciativa", acrescenta o membro do Conselho Nacional de Educação..A Lisboa segue-se a cidade do Porto, com uma média de 407 euros mensais.Também Coimbra está no topo da lista de cidades mais caras, aplicando rendas médias no valor de 291 euros. Na capital, Arroios é a zona mais procurada, com um preço médio de 393. Já no Porto, é Paranhos, situando-se nos 347. Em Coimbra é a Baixa, com uma média de renda de 276 euros. Preços muito mais elevados relativamente aos praticados nas residências públicas, sob a gestão dos Serviços de Ação Social, onde a média mensal não chega aos 200 euros..João Pedro Louro conta que ainda vai recebendo pedidos de ajuda de conhecidos que gostariam de estudar em Lisboa mas estão com dificuldade em encontrar oportunidade de alojamento com preços baixos. O que pode mesmo resultar na desistência em enveredar pelas faculdades da capital. Algo que não espera que mude já neste ano. Ou mesmo nos próximos.."Não tenho dúvidas de que os preços praticados são e voltarão a ser neste ano um fator de exclusão para os jovens que poderiam ponderar vir estudar para Lisboa", sublinha. "Enquanto esta bolha imobiliária existir, parece-me difícil o cenário mudar" e a solução só pode passar por uma "maior aposta no investimento de residências estudantis". E para tal deve aproveitar o património do próprio Estado, aconselha. "O que não falta em Lisboa é património. Nem há necessidade de construir de raiz, porque sabemos que isso acarreta muitas verbas.".O alojamento estudantil "ainda é a grande questão" para os jovens que estão ou pretendem entrar no ensino superior, acrescenta Sofia Escária, presidente da Federação Académica de Lisboa. A capital continua "a não conseguir colmatar as necessidades dos estudantes", garante..Os desafios para o novo ano.Além das residências universitárias, um dos principais temas que tem marcado a esfera do ensino superior, o ano letivo 2019-2020 espera outros velhos e novos desafios: das propinas ao planeamento da redução de mestrados integrados, passando pela criação de mais bolsas..Cortes nas propinas (e outros gastos académicos).Durante anos, o tema levantou manifestações estudantis pelo país, até chegar ao Parlamento, que decidiu baixar a propina máxima em 20%, para 856 euros (antes 1068). A redução de mais de 200 euros, já a partir do ano letivo 2019-2020, ficou prevista no Orçamento do Estado para 2019..Com o corte nas propinas chegaram também outras alterações. Ainda em março, um projeto de lei do PSD anunciou a inclusão de serviços académicos no valor da propina. Como a inscrição no curso ou nos exames, a emissão do cartão de estudante e de declarações para pedir abonos..Atualmente, cada universidade não só aplica taxas sobre estes serviços como cobra os valores que entender sobre eles, de forma autónoma..Menos mestrados integrados.Chegaram a Portugal com a revolução que Bolonha fez acontecer no ensino superior, mas agora estão em risco..Segundo a Direção-Geral do Ensino Superior (DGES), a partir do ano letivo 2021-2022, os mestrados integrados só serão aplicados a áreas como Arquitetura e Urbanismo, Ciências Farmacêuticas, Medicina, Medicina Dentária e Medicina Veterinária. As engenharias, uma grande marca deste regime curricular, ficam fora do lote. Qualquer área fora dele terá apenas disponibilizadas licenciaturas. Caso o aluno decida ingressar num mestrado, terá de dar início a uma nova candidatura, na mesma instituição ou não..Apesar de a medida ainda não estar prevista acontecer já neste ano letivo, a presidente da Federação Académica do Porto garante que as instituições de ensino superior já começam a preparar-se para esta reforma. "Sei que o Instituto Superior Técnico, por exemplo, já está a fazer uma apreciação da medida", revela Sofia Escária..As consequências desta limitação ainda são uma dúvida. Não só poderão atenuar as diferenças que atualmente existem entre as universidades e os politécnicos como causar dificuldades às ordens profissionais. "Ainda há dúvidas sobre como é que esta realidade se vai materializar e sobretudo quais as implicações que vai ter para as ordens", sublinha a presidente..De acordo com o ministro do Ensino Superior, Manuel Heitor, a obrigatoriedade de mestrados integrados só será disponibilizada nas áreas para as quais há recomendações internacionais neste sentido. "Poderão optar por fazer o segundo ciclo numa instituição diferente, se assim o entenderem", disse. E acrescentava que além de dar mais margem de decisão aos estudantes na definição dos seus percursos académicos, a medida "promove a concorrência" no setor..Mais duas mil bolsas para deslocados.Em entrevista ao DN, o ministro Manuel Heitor disse que este próximo ano haverá mais duas mil bolsas +Superior (destinadas a estudantes fora dos centros urbanos)..A iniciativa visa atrair candidatos para instituições de ensino superior que não integrem os grandes centros urbanos..Pode candidatar-se ao programa qualquer estudante de nacionalidade portuguesa ou de um Estado membro da União Europeia que esteja inscrito no ensino superior, depois de colocado na 1.ª, 2.ª ou mesmo 3.ª fase do Concurso Nacional de Acesso. Desde que num ciclo de estudos de uma das instituições que pertencem ao + Superior.