Um metro mínimo ou sempre que possível? Diretores pedem que DGS seja mais clara
A dois meses do arranque do ano letivo, previsto entre 14 a 17 de setembro, as escolas já conhecem as orientações do Governo para regressar às aulas presenciais, com adaptação aos novos tempos. Algumas das quais serão repetidas face à experiência realizada com os alunos do 11.º e 12.º anos de escolaridade no final do último período deste ano letivo que terminou: máscara obrigatória (a partir do 2.º ciclo) e distanciamento entre alunos nas salas de aulas. Esta última recomendação causa, contudo, alguma apreensão junto dos diretores dos estabelecimentos de ensino, que exigem uma comunicação mais clara das autoridades de saúde.
A 3 de julho, as escolas receberam um documento assinado pela Direção-Geral da Saúde (DGS) e pelo Ministério da Educação no qual seguia um conjunto de recomendações sobre os comportamentos a adotar no próximo ano letivo. De acordo com as orientações, lia-se, deve ser garantido, "sempre que possível", o distanciamento de "pelo menos 1 metro" entre alunos. Um medida que representa um retrocesso relativamente aos dois metros entre mesas definidos para o regresso dos 11.º e 12.º anos em maio.
No entanto, na sexta-feira passada, 10 de julho, durante a conferência de imprensa, a diretora-geral da Saúde falava num distanciamento "mínimo de um metro" entre alunos nas salas de aula, abrindo um discurso mais perentório do que aquele que seguiu no documento com as orientações. Indicar a distância mínima de um metro, em algumas salas, implica desdobramento de turmas, não previsto pelo Ministério da Educação.
Na conferência de imprensa desta quarta-feira, Graça Freitas reafirmou que o próximo ano letivo está a ser "cuidadosamente preparado" pelos ministérios da Saúde e da Educação. Quanto ao distanciamento entre alunos, a diretor-geral da Saúde reafirmou que o que ficou estabelecido foi que "sempre que possível deve garantir-se o distanciamento físico de pelo menos um metro", isto "sem comprometer a atividade letiva".
A situação deixou diretores de escolas em alerta. "Entretanto, a DGS já fala em 'distanciamento mínimo de um metro'? Mas nas orientações não diz isto", questiona o dirigente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP). Filinto Lima garante que a diferença entre os dois discursos está a levantar ansiedade entre os dirigentes escolares e pede que a comunicação seja mais clara por parte das autoridades de saúde. "A DGS tem de ser coerente, em qualquer circunstância, naquilo que envia às escolas e naquilo que fala publicamente. Se for como dizem as orientações, podemos ter turmas com tamanho normal [cerca de 30 alunos] a funcionar normalmente. E eu pergunto: isto está bem? A saúde pública aprova isto? A DGS aprovou, mas depois levantou dúvidas", frisa.
Por esta altura, os diretores e professores preparam, no âmbito da sua autonomia e com base nas recomendações do governo, o próximo ano. Um processo com fragilidades, admite Filinto Lima, que diz que "os diretores estão à beira de um ataque de nervos, por força das incoerências de quem deveria zelar pela nossa saúde". E remata: "se [a DGS] errou, que dê a mão à palmatória e assuma o erro".
O DN questionou a DGS para obter um parecer e esta indicou apenas que "já foram dados todos os esclarecimentos sobre o assunto" nas conferências em que participaram quer a diretora-geral da Saúde quer a ministra da Saúde.
"Um metro é a distância mínima", referiu Graça Freitas, na conferência de imprensa da passada sexta-feira. Mas a esta medida "somam-se outros métodos de barreira como as máscaras, a disposição das carteiras nas salas". E a ministra da Saúde, Marta Temido, reforçou: "em circunstâncias em que esse distanciamento físico não seja possível e seja compatível com a utilização de outros métodos barreira, isso poderá ser equacionado".
No entanto, diretores e professores lembram que nem todas as escolas reúnem condições nas salas de aula para garantir esta distância mínima sem recorrer ao desdobramento de turmas em todas as escolas. "Só nos resta concluir, porque conhecemos bem a realidade das nossas escolas, que a regra do distanciamento físico de um metro, no mínimo, não vai ser cumprida nas escolas, o que a ASPL vê com muita apreensão", lê-se no comunicado enviado às redações pela Associação Sindical dos Professores Licenciados (ASPL).
Uma realidade prevista e assumida pelo próprio ministro da Educação, devido à impossibilidade de multiplicar a capacidade das escolas ou do corpo docente para que ocorra este desdobramento. "Os alunos vão ter de caber todos na mesma sala. Não haverá desdobramento de turmas", afirmou Tiago Brandão Rodrigues, numa entrevista ao jornal Expresso.
A solução passaria, de outra forma, por arrancar o problema pela raiz, reduzindo, à partida, o número de alunos permitidos por turma. Uma medida chumbada em parlamento, no passado dia 24 de junho. A Assembleia da República rejeitou o projeto de lei do Bloco de Esquerda que propunha esta redução, tendo em conta as necessidades acionadas com o regresso às aulas em plena pandemia de covid-19. A proposta seguiu com os votos a favor do BE, PCP, PAN e PEV. Votaram contra a bancada do PS, PSD, CDS-PP e Chega. O projeto de lei registou a abstenção de voto da Iniciativa Liberal e da deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.
Filinto Lima, dirigente da ANDAEP, considera que "a DGS não está a dar muita importância às escolas". "Para a sociedade civil que for ao teatro ou ao cinema tem de estar separado por uma cadeira, os trabalhadores da construção civil têm de estar a dois metros de distância e, nas escolas, vale tudo", lamenta.
As declarações das autoridades de saúde motivaram o descontentamento de diversas associações representantes da comunidade escolar e levaram a ASPL a pedir reuniões urgentes ao Ministério da Educação, para um maior esclarecimento sobre as medidas a adotar no próximo ano letivo.
Atualizado às 13:45 de 15 de julho