A complexidade, de racionalização extremamente difícil, a que a desordem do Brexit conduziu a questão de saber se a Europa acaba no canal, e se, na sequência do possível não acordo, o Reino Unido terá de enfrentar algumas consequências resultantes de não ser um Estado nacional, tudo se reflete na imprevisibilidade dos resultados das passadas eleições europeias, quer o Reino Unido participasse sem significado nelas quer estivesse já ausente..Todavia, há um domínio, também hoje de significados múltiplos, em que os resultados terão efeitos significativos, que serão os dos populismos: agravando a relação da governança global conhecida, que não se limita à vigente legislação existente, abrange também o domínio dos poderes de facto conhecidos ou ignorados, com um fator inseguro que é a decisão do eleitorado em relação ao europeísmo até agora projetado..Vai ser igualmente ocupação fatigante e de resultado incerto seguir os movimentos dos países membros, destacando-se o de Marine Le Pen, que foi chamada "rainha" dos populistas na sua reunião em Viena, reconhecidamente influente no chamado grupo de Visegrad. A mudança do panorama do populismo será impressionante se tiver crédito suficiente a informação de Marc Ferro (2019) no sentido de que "o termo não figura em qualquer das grandes obras sobre pensamento político aparecidas no século XX", e agora cresce o número de partidos que na União, com maior ou menor projeção, parece inevitavelmente ligado à crise das migrações..Foi esta crise que levou Marion Maréchal-Le Pen, cristã integrista, a proclamar, como é repetidamente lembrado, a passagem da França do estatuto de filha mais velha da Igreja para a de petite-nièce de l'islam. Sendo a experiência da França a que mais releva na Meia Europa Democrática que vigorou durante a Guerra Fria, o tema dos gilets jaunes, praticantes de uma violência de que a tradição histórica da França se tinha desprendido, obriga a não descurar a segurança, sobretudo pela estranha circunstância de o movimento, violento, ter protagonistas destacados e identificados, mas que recusam ser considerados líderes, acrescentando até que reprovam a violência, embora sejam pregadores constantes e seguidos dos temíveis comportamentos. Parece ter sido esta circunstância que levou Raphaël Liogier (L'Etat du Monde, 2019) a autonomizar o tema com o difícil decifrável título de "Populismo l´iquido nas democracias ocidentais"..O caso da vitória de Donald Trump, invocando o objetivo - "Make America Great Again" -, não deixa de ser invocado para concluir que os populismos europeus partilham, na motivação, o sentimento nacional de "perda de identidade", dita atingida pelas migrações descontroladas, e também pela assumida desvalorização da imperatividade dos acordos internacionais, o que leva à comparação dos populismos de agora com o ambiente de entre as duas guerras mundiais, que conduziu sociedades civis variadas a apoiar, invocando interesses nacionais, regimes que ignoraram todas as proclamações de direitos humanos..Uma das mais duradouras e perigosas justificações foi que "a democracia decididamente é a ruína. É o rebanho conduzindo o pastor, é o mundo invertido, é a desordem, a incapacidade e a imbecilidade organizada". Previsões avulsas sobre o desenvolver das eleições europeias neste ano difícil de 2019 parecem ter memória desta avaliação, mas procurando obter a confiança na habitual afirmação de repúdio do poder político quanto ao desrespeito do direito. Esta atitude pretende orientar os eleitorados no sentido do peace power interno e externo, que não consente a violação do regime constitucional, não pretende o regime de poder pessoal, que vai respeitar os objetivos das declarações de direitos, em suma estabelecer o descanso do guerreiro..Infelizmente não é o que anunciam os analistas sobre o estado da paz no mundo, nem sobre a linha política dos emergentes, nem sobre o outono ocidental que o enfraquecimento do atlantismo agrava, nem sobre o descuido de consentir a formação de "colónias interiores" que provocam as discriminações, sendo estas a sementeira dos mitos raciais. Pode ser impossível, mas a única proposta que até hoje fortalece a esperança da paz pelo direito é conseguir que, no espaço de onde partem as mais trágicas migrações, se consiga implantar as condições que reforcem a decisão de ficar. .Felizmente não passou tempo suficiente para esquecer como a falta de autenticidade das intervenções foi realmente responsável pelo penoso período da "guerra fria", em que a adjetivação não minorava o drama dos países que iam sofrendo os efeitos da imposição estrangeira aos povos que apenas se libertaram com a queda do Muro de Berlim, e outros que foram libertados pela descolonização. Agora, a sementeira que produz uma variedade crescente de populismos não aponta para a capacidade de conseguir facilmente que o terrorismo, incluindo o de base religiosa, seja rapidamente dominado.