Administradores hospitalares defendem regresso de hospitais de referência para a covid
Não se trata de uma redução da resposta ao surto, mas de uma concentração dos meios, diz o presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares. Voltar ao modelo inicial - quando existiam unidades dedicadas ao tratamento do novo coronavírus - permitiria "ter ganhos muito grandes para a resposta covid e para a resposta de cuidados gerais".

Hospital de Santa Maria, em Lisboa.
© PAULO SPRANGER/Global Imagens
Na hora de regressar à atividade "normal", os hospitais têm um desafio triplo: responder aos doentes infetados com o novo coronavírus, aos com outras patologias e a quem ficou para trás nas listas de espera por causa da pandemia. Voltar a ter unidades hospitalares de referência para o tratamento do novo coronavírus, pode ser parte da solução para fazer face aos próximos tempos, sugere Alexandre Lourenço, o presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares [APAH], ao DN. Assim seriam libertadas as enfermarias e os profissionais de saúde possíveis e redirecionados para a resposta aos doentes não covid-19, acautelando sempre a possibilidade de outras vagas do surto em Portugal.
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"Não é reduzir a resposta. É concentrar a resposta. Há hospitais em que porventura já não faz sentido estarem virados para esta resposta e os doentes devem ser transferidos para outros", diz Alexandre Lourenço. "Temos de manter uma capacidade para, caso haja outros picos [de covid-19], termos resposta. Mas a concentração de eficiência vai ter ganhos muito grandes para a covid-19 e para a resposta de cuidados gerais", acrescenta.
O presidente da APAH defende que esta ideia deveria ser estudada à luz de um plano nacional integrado para a reativação do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Um documento orientador para todos os hospitais que indicaria "os recursos e as instalações alocadas" para o novo coronavírus e os que poderiam retomar a sua atividade regular. "Mais de 60% da atividade cirúrgica é feita em unidades de cirurgia de ambulatório, um caso de sucesso português. Mas como tivemos de separar doentes covid dos restantes doentes e estas unidades de cirurgia de ambulatório tiveram condições ideais para ser transformadas em quartos individuais para cuidados intensivos, temos hoje estes quartos ocupados com dois, três doentes em alguns hospitais".
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Alexandre Lourenço, presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares, pede ao Governo um plano para reativar o Serviço Nacional de Saúde.
© Orlando Almeida/Global Imagens
Áreas que, segundo o administrador hospitalar, poderiam ser mais bem aproveitadas e receberem mais doentes, desde que estes hospitais não funcionassem como primeira linha para doentes covid. Os infetados com o novo coronavírus iriam para as tais unidade de referência, como aconteceu no início da pandemia. Alexandre Lourenço fala ainda na necessidade de ter mais profissionais de saúde disponíveis, lembrando que "não podem ser sempre os mesmos a assegurar o serviço". E que o projeto tem de ser aplicado de forma "gradual" e com medidas concretas para todo o país, com "reagendamentos à hora" e "alargamento dos horários [dos serviços de saúde], por exemplo, até às 20.00".
Intenção semelhante à expressa pelo Bloco de Esquerda numa resolução apresentada nesta segunda-feira e que visa a recuperação da atividade programada no SNS. No documento o partido pede ao Estado que "defina uma rede específica para a resposta à covid-19" e "estabeleça com as entidades do SNS programas de recuperação de atividade, com aumento do financiamento e da contratualização de atividade com essas instituições e aumentando os recursos considerados necessários pelas mesmas". O Bloco critica ainda a ministra da Saúde, Marta Temido, por pretender recorrer ao setor privado na recuperação das consultas e cirurgias em atraso.
A governante anunciou, na semana passada, que serão emitidos mais vales cirúrgicos para os utentes se tratarem em hospitais privados, caso o SNS tenha dificuldade em responder atempadamente. "Essa intenção existe, é clara e vamos acioná-la", sublinhou.
Marcações e horários alargados para evitar o regresso em massa dos doentes
As consultas, as cirurgias e a recolha de análises sem carácter de urgência retomaram, em alguns hospitais, nesta segunda-feira (4 de maio). E o critério para a reabertura foi a "pressão que cada instituição sente na sua envolvente", dizia a ministra da Saúde há uma semana destacando que a atividade do SNS não relacionada com a pandemia "tem de ser retomada de forma faseada, com recurso à telessaúde e à prescrição eletrónica".
Mesmo assim, quando alguns hospitais "abriram as portas", a fila formou-se. Foi o caso do maior centro hospitalar do país - Lisboa Norte, que inclui os hospitais de Santa Maria e Pulido Valente. No primeiro, entre as 08.00 e as 10-00, mais de meia centena de doentes juntaram-se em frente à central de colheitas do hospital "dificultando a gestão da fila de espera", como explicou fonte oficial da instituição ao DN. "Situação que só ficou normalizada ao fim da manhã."
Para contrariar este cenário e para garantir o cumprimento do distanciamento social pedido pelas autoridades de saúde, o Hospital de Santa Maria indica que "a central de colheitas passará a estar sujeita a regras de agendamento e desfasamento de horários para evitar aglomerações, como as que ocorreram hoje [esta segunda-feira 4 de maio]. Essas regras serão introduzidas nos próximos dias, prevendo-se que a regularização desta situação ocorra no prazo de uma semana". Além dessas medidas será feita uma campanha de sensibilização dos doentes sobre a necessidade de cumprir o agendamento.
No norte do país, o Centro Hospitalar de São João, que também recomeçou a atividade programada não urgente nesta semana, elaborou um plano, que passa pelo "aumento faseado e progressivo da atividade ao longo do mês de maio, priorizando as questões clínicas mais graves", aponta o hospital, em resposta ao DN. Optaram também por aumentar os horário de atendimento (agora das 08.00 às 20.00), "reduzindo os picos de procura"; por limitar o acesso a acompanhantes (exceto em utentes com necessidades especiais) e "manter a atividade de consultas não presenciais", ou seja, as teleconsultas.

Hospital de São João, no Porto.
© FERNANDO VELUDO/LUSA
Planos e ideias pensados por cada um dos hospitais e não a ação concertada reivindicada pela Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares.