EUA. Responsáveis pelo colapso.Na presidência de Barack Obama foi aprovada uma lei de defesa dos direitos humanos e da sociedade civil venezuelana, em resultado da violência nas manifestações de 2014, durante as quais morreram mais de 40 pessoas. Mais tarde a administração aplicou sanções a funcionários venezuelanos vinculados a violações dos direitos humanos, mas também a corrupção política..As doações à cerimónia de tomada de posse de Donald Trump, a 20 de janeiro de 2017, estão a ser investigadas pela justiça norte-americana. Mas o que para o caso interessa, a empresa petrolífera estatal venezuelana, PVDSA, contribuiu com meio milhão de dólares. De nada valeu o gesto de Nicolás Maduro. Quatro meses depois, o Departamento do Tesouro aplicou sanções ao presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Maikel Moreno, bem como a mais meia dúzia de pares, por terem "usurpado" as funções da Assembleia Nacional e permitido a Maduro iniciar a "rutura" da ordem constitucional ao avançar com a Assembleia Constituinte. (Curiosamente, quando na terça-feira o levantamento liderado por Juan Guaidó deu mostras de falhar, o conselheiro de Segurança Nacional, John Bolton, disse que Maikel Moreno estava alinhado com o ministro da Defesa, Vladimir Padrino, e com o chefe da Guarda Presidencial, Iván Hernández, para levar Maduro a caminho do exílio.).Enquanto Trump admitia a "opção militar", Washington continuou a apertar a malha com mais sanções, a ponto de, em janeiro deste ano, o regime chavista cessar de forma unilateral as relações com os Estados Unidos. Nesse mesmo mês, os norte-americanos completaram o cerco ao aplicar sanções à produção e venda de crude, o que levou a uma quebra de rendimentos de 40%. Para um país que depende das receitas do petróleo (95% do valor das exportações) e que já estava mergulhado numa grave crise económica e social, iniciada com a queda dos preços do petróleo, em 2014, foi um golpe impiedoso. Donald Trump viu no regime de Maduro um inimigo de eleição. Se com a Coreia do Norte o homem de negócios não mostra pruridos ideológicos, no bolivarianismo vê os "horrores do socialismo" - um discurso para as bases de apoio, mas também para piscar o olho ao eleitorado latino. E, caso Guaidó assuma o poder e se convoquem eleições, abre-se uma via para os negócios num país a que falta quase tudo..Brasil e Colômbia. Tensão nas fronteiras.Com a destituição de Dilma Rousseff, a Venezuela passou a estar cercada de Estados com relações pouco amistosas. A Colômbia de Álvaro Uribe, apoiada pelos Estados Unidos, fez frente a Hugo Chávez. O ponto mais baixo aconteceu em 2010, na sequência da acusação do presidente colombiano de que guerrilheiros das FARC tinham bases na Venezuela, com o beneplácito do chavismo: Caracas rompeu as relações diplomáticas com Bogotá. Em fevereiro, a Colômbia serviu de base para uma operação de ajuda humanitária, mas o regime chavista impediu a iniciativa encabeçada por Juan Guaidó, o "fantoche do imperialismo", segundo Maduro..Até o vizinho mais pequeno, a Guiana, é uma dor de cabeça regional. A Venezuela tem pretensões territoriais a uma faixa que corresponde a mais de metade do país que foi colonizado pelos britânicos. Essa pretensão relativa à Guiana Essequiba ganhou novo peso depois da descoberta de petróleo na costa da região em disputa. No ano passado, o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, remeteu a questão para o Tribunal Internacional de Justiça. Dias depois surgiram rumores de que Caracas preparava uma invasão ao território. Brasília e Georgetown assinaram acordos de defesa e de cooperação. Brasil e Venezuela entraram em "embate diplomático", como disse o então presidente brasileiro Michel Temer..A confrontação diplomática conheceu novos capítulos com a eleição de Jair Bolsonaro. Este reconheceu Guaidó como presidente interino - a par da Colômbia e de outros 56 países, Portugal incluído - e tem trocado farpas com Maduro, que o mimou com expressões como "filhote de fascista" ou "imitador de Hitler". A exemplo de Trump, Bolsonaro tem usado o Twitter para ameaçar o regime venezuelano. Na mais recente mensagem, o presidente brasileiro afirmou que qualquer decisão sobre uma intervenção militar seria "exclusivamente" sua. Uma prerrogativa que, conforme corrigiu de imediato o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, só o Congresso pode aprovar. Uma decisão de Bolsonaro foi a concessão de asilo político a 25 militares venezuelanos que procuraram refúgio na embaixada brasileira em Caracas na sequência da falhada Operação Liberdade..Espanha. Da mediação ao apoio a Guaidó.A antiga potência colonial tem vivido em atrito com o chavismo. Ficou na história a frase que o rei Juan Carlos usou em 2002 para cortar a fala a Hugo Chávez, quando este criticava o primeiro-ministro José María Aznar: "Por qué no te callas?" De então para cá mudaram chefes de governo e de Estado, mas as relações foram turbulentas. Em 2018, Madrid e Caracas expulsaram os respetivos embaixadores. No entanto, o país manteve peso diplomático através do antigo primeiro-ministro Rodríguez Zapatero, que funcionou como mediador entre o governo e a oposição a partir de 2015. Com o agravamento da crise e o extremar de posições, a Espanha reconheceu a legitimidade do presidente da Assembleia Nacional, Juan Guaidó, como interino. Ainda assim, os negócios mantêm-se: a Repsol continua a receber um carregamento mensal com petróleo da PDVSA como forma de pagamento de uma dívida..Um novo foco de tensão entre os dois países surgiu com o acolhimento de Leopoldo López. Na terça-feira, o líder da Vontade Popular foi libertado da prisão domiciliária por um grupo de militares e juntou-se a Juan Guaidó. Perante o fracasso do levantamento procurou refúgio, como "hóspede", na embaixada espanhola. Em entrevista à Efe, López acirrou os ânimos ao considerar que uma intervenção militar é uma opção prevista na Constituição e que novos levantamentos estão previstos. O governo espanhol assegurou que não vai entregar López às autoridades, mas também que, devido ao seu estatuto de "hóspede", o opositor de Maduro vai "limitar" as suas atividades políticas..Rússia e China. Geopolítica e investimentos.O conselheiro de Segurança Nacional dos EUA usou uma retórica do tempo em que iniciou a sua atividade governamental, estava Ronald Reagan na Casa Branca. "Este é o nosso hemisfério, não é onde os russos deviam estar a interferir", disse John Bolton. Washington diz que há uma centena de conselheiros militares russos em Caracas e acusou-os de impedirem o exílio de Nicolás Maduro, o que levou a uma troca de acusações com Moscovo..Vladimir Putin tem todo o interesse em segurar Maduro - ou o regime chavista - em funções. Além de estender a influência para o hemisfério sul, à Rússia interessa manter aliados em oposição ao Ocidente, como o Irão, a Síria, a China e, em certa medida, a Turquia. Além do mais, há negócios de milhares de milhões, quer em ativos da indústria petrolífera quer na venda de material militar. Mas, como afirma o editor de política da BBC em russo, Famil Ismailov, "quando os russos investem num país, fazem-no pela política, não por razões económicas (...) é um pagamento feito à Venezuela pelo seu apoio à causa russa"..Já a China é o maior credor da Venezuela (num valor que não é conhecido). A principal razão para esse investimento estratégico no país sul-americano é pragmático: é o país com maiores reservas de petróleo do mundo. Como é seu timbre, Pequim mostra prudência e defende o princípio de não ingerência. É de esperar que siga as iniciativas diplomáticas de Moscovo na ONU para defender a permanência de Maduro no poder..Cuba. Aliado ideológico.Havana e Caracas mantêm uma relação especial desde a chegada de Hugo Chávez ao poder. A aliança não é só alicerçada no socialismo. Em troca de petróleo, o regime cubano oferece mão-de-obra: segundo a ex-embaixadora em Portugal Johana Tablada, em 20 mil cubanos presentes na Venezuela, 94% estão em missões médicas. Tablada respondia a Bolton, que chamou de "mentiroso patológico": este alegou que aquele número de pessoas está no topo da hierarquia militar e das forças de segurança e do governo venezuelano..Trump seguiu a narrativa de Bolton e no Twitter, após ameaçar com um embargo ainda mais abrangente a Havana, desejou que "todos os soldados cubanos regressem de imediato e pacificamente à sua ilha". A Casa Branca não está em sintonia com a CIA. Segundo o The New York Times , a agência de espionagem acredita que o envolvimento e o apoio de Cuba ao regime de Maduro são muito menos importantes do que os EUA creem.