Aprovada contagem de todo o tempo de serviço dos professores. Governo em estado de emergência
PSD, Bloco de Esquerda, CDS, PCP e PEV: a oposição aliou-se nesta quinta-feira para aprovar a contagem integral do tempo de serviço dos professores, uma norma que contou apenas com o voto contrário do PS. Significa isto que a recuperação dos nove anos, quatro meses e dois dias reclamados pela classe docente vai ficar consagrada na lei.
A votação na especialidade (artigo a artigo) decorreu na comissão parlamentar de Educação e Ciência, com os deputados a votarem as propostas de alteração ao decreto-lei do governo que determinou a contabilização de dois anos, nove meses e 18 dias - o que nunca foi aceite pelos sindicatos.
Quanto aos prazos para a recuperação do tempo de serviço congelado - os cerca de seis anos que o diploma do executivo não contemplava -, ficou aprovado que o governo terá de encetar um "processo negocial" para efetivar a reposição, que terá "efeitos em 2020 e anos seguintes", uma formulação que teve os votos a favor do PSD e do CDS, a abstenção do BE e do PCP e o voto contra do PS. O PSD queria fazer depender a "devolução" do tempo congelado de fatores como a situação económica do país, proposta que acabou chumbada, neste caso pelas bancadas da esquerda.
No que se refere ao período já considerado pelo governo, ficou estabelecido que os dois anos, nove meses e 18 dias devem ser recuperados com efeitos a janeiro de 2019. No entanto, com o PS a advertir para a inconstitucionalidade de uma medida que implique o aumento das despesas previstas no Orçamento do Estado para este ano, o PSD anunciou que apresentará uma proposta de alteração para evitar a chamada norma-travão, que se aplica ao ano económico em curso. A solução dos sociais-democratas deverá passar por remeter a atualização para 2020, mas com retroativos a 2019.
Esta foi a solução anunciada ao fim do dia pelo Sindicato Independente de Professores e Educadores:
Na última terça-feira, o ministro das Finanças - ouvido na comissão parlamentar de Educação e Ciência a pedido do PS - defendeu que contar todo o tempo de serviço dos professores representaria "o maior aumento de despesa desta legislatura" e iria abrir "uma caixa de Pandora" sobre a recuperação do tempo de congelamento nas carreiras.
Já a possibilidade de o tempo de serviço congelado aos professores poder vir a contar para efeitos de aposentação foi chumbada. O PSD absteve-se, pelo que o voto contra dos socialistas foi suficiente para travar a proposta, que teve os votos favoráveis dos restantes partidos.
Pouco depois da votação no Parlamento, António Costa, chamou convocou o "núcleo duro" de decisão do Governo para uma reunião de emergência, a decorrer na manhã desta sexta-feira na residência oficial do PM, em São Bento.
Fonte oficial do primeiro-ministro adiantou ao DN que na reunião estarão presentes os ministros das Finanças, Mário Centeno, do Trabalho, Vieira da Silva, da Presidência, Mariana Vieira da Silva, dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, e o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Duarte Cordeiro.
Junta-se a este grupo o ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues.
Ao que o DN apurou, Costa, considera que a situação com a aprovação da contagem de tempo dos professores é "muito grave". "Todas as opções estão em aberto", afirmaram ao DN fontes próximas do primeiro-ministro.
António Costa vai dramatizar esta situação até ao limite e conta com o Presidente da República para vetar o diploma, sabe o DN.
No Parlamento, o PS acusou esquerda e direita de irresponsabilidade e de pôr em causa a legislatura.
Em declarações nos corredores da Assembleia da República, Porfírio Silva, do PS, foi particularmente incisivo nas críticas aos restantes partidos. "Isto é a absoluta irresponsabilidade (...). Isto é pôr em causa todo uma legislatura de recuperação de rendimentos. (...) Temos sabido manter o rumo certo, as contas no seu sítio e avançar passo a passo de forma segura. Isto é querer destruir todo o trabalho de construção de uma legislatura. (...) A História julgará quem assim procede", disse o deputado socialista.
Questionado sobre as questões de constitucionalidade que suscitou no decurso dos trabalhos, Porfírio Silva defendeu primeiro que "nenhuma resposta foi dada" sobre a questão que levantou relativa à norma-travão que impede o aumento de despesa acima do orçamentado, para depois afirmar que a proposta do PSD, aprovada pela comissão parlamentar de Educação terá de ser analisada com mais rigor.
"Vou olhar com atenção para a norma que foi apresentada na própria reunião. O próprio partido proponente parece não estar muito certo, porque apresentou várias versões", afirmou Porfírio Silva, que perante a insistência dos jornalistas decidiu terminar as declarações dizendo: "Não vou ficar aqui a discutir questões de inconstitucionalidade".
"A proposta do BE era uma garantia para os professores que efetivava um direito. Lamentamos que não se tenha ido mais longe e que o PSD tenha travado essa possibilidade", declarou Joana Mortágua à saída da comissão, sobre a falta de um calendário para a devolução do tempo de serviço.
Pelo lado do PCP, Ana Mesquita fez acusações no mesmo sentido: "A responsabilidade é do PSD e do CDS que se juntaram ao PS por não ter ficado um calendário concreto para a recuperação do tempo de serviço. Bem nos esforçámos para que, pelo menos, houvesse uma janela temporal. Ficamos outra vez dependentes de negociações quando sabemos como estas correram até agora".
Já Margarida Mano, do PSD, defendeu a convicção na constitucionalidade da proposta aprovada, que atira o peso orçamental para 2020, enumerando algumas vitórias conquistadas para os professores na quinta-feira à noite na comissão, como o reconhecimento de que o tempo congelado a contar deve ser os mais de nove anos reivindicados pelos docentes e a garantia de que os dois anos, nove meses e 18 dias terão efeitos a janeiro de 2019.
"A nossa votação permitirá que o Governo vá para a negociação com todos os graus de liberdade para decidir. Isto para nós também é fundamental, porque garante que a Assembleia da República não invade as competências do Governo", adiantou ainda Margarida Mano.
Com Lusa