Dono de centro de estudos preso por abusos sexuais: "Desconhecia que era crime"

Explicador de 58 anos foi punido com oito anos de prisão por dez crimes de abuso sexual de menor. Tribunal de Matosinhos diz que não mostrou arrependimento e condenou-o a pagar 20 mil euros à ex-aluna de 14 anos.
Publicado a
Atualizado a

Foram cerca de cinco meses, em 2017 e 2018, em que o professor, sócio de um centro de estudos em Matosinhos, manteve uma relação sexual com uma aluna de 14 anos. O homem, na altura com 57 anos, a quem os pais da menor tinham confiado a filha para ter explicações de Matemática, disse em tribunal que "foi tudo natural" e que não sabia que era crime.

Para a juíza-presidente do coletivo, isto revela que não está arrependido e que, em termos penais, nem confessou os crimes, apesar de os ter admitido. Por isso, esta quinta-feira, dia 2, foi condenado a oito anos de prisão por dez crimes de abuso sexual de menor dependente, dos quais seis se referem a relações sexuais.

Como educador, o homem até começou por ser visto pela vítima com repugnância. Mas conseguiu uma aproximação e a conquista da menor - esta acabou por se deixar envolver com o adulto que lhe dava explicações para passar a vê-lo como a sua paixão. Começou com beijos e apalpões para chegar a relações sexuais, prolongadas no tempo. Pelo meio, no espaço de meses, manteve um total de 8304 conversas, telefónicas ou por SMS, com a menor.

O caso só foi descoberto quando a mãe da adolescente viu as mensagens, muitas de cariz pornográfico, no telemóvel da filha e fez queixa às autoridades. Mesmo aí, quando se deu conta que a aluna tinha ficado sem telemóvel, o professor manteve o comportamento tendo comprado um novo telemóvel para a menor, de forma a poder continuar a trocar mensagens com ela. Até ser detido em maio de 2018, ficando em prisão preventiva, situação em que se mantém.

Na leitura do acórdão, a juíza elencou os factos que ficaram provados, desde a primeira abordagem, os SMS a declarar-se à menor, passando pelos primeiros abusos, com beijos e apalpões, até a uma fase em que o arguido assumiu uma relação sexual com a vítima, que ainda mantinha a virgindade quando o conheceu. Em algumas das mensagens enviadas, o licenciado em engenharia civil, que era casado mas entretanto separou-se, revelou ter ciúmes de amizades que a aluna tinha com outros menores.

"Nem confissão nem arrependimento"

Em julgamento, que decorreu à porta fechada, as declarações do arguido "não revelaram arrependimento", nem se pode dizer que haja "confissão para efeitos penais". Por um lado, assumiu ter praticado os factos imputados mas disse que "desconhecia que era crime", sabia apenas que era proibido.

A juíza-presidente frisou que isto é inaceitável na sociedade atual, com informação constante sobre este tipo de ilícitos, ainda mais sendo educador. "Não se compreende como pode dizer que desconhecia", disse a magistrada, para quem também não houve arrependimento. "Entende-se que o senhor não está arrependido do que fez mas sim do que se soube. O seu discurso egocêntrico, acrítico, centrou-se em si próprio e não no impacto que a sua conduta teve na menor."

O tribunal alterou a qualificação de um crime de abuso sexual, que na acusação do MP era tipificado como contacto de natureza sexual e que foi alterado para ato sexual de relevo (com moldura penal mais elevada), mas ainda absolveu o arguido de dois crimes, por considerar que a acusação relativa a esses crimes era genérica.

Acabou condenado por abuso sexual de menor dependente em três crimes, pelos factos relativos a beijos e apalpões (um ano e meio de prisão por cada), outros seis crimes relativos às relações sexuais de cópula (três anos de cadeia por cada), e um outro que resulta do cariz pornográfico de muitas das mensagens trocadas (dez meses de prisão). A soma dava 23 anos e meio, com o tribunal a realizar um cúmulo jurídico de oito anos de prisão, pena efetiva a que vai condenado.

O homem alegou ainda que a menor consentiu e dizia-se apaixonada. Mesmo numa sociedade liberal e permissiva, "a auto-determinação sexual pressupõe maturidade", apontou o tribunal. Uma menor de 14 anos "não possui discernimento nem percebe o sentido e alcance de uma relação", salientou a juíza, concluindo que o arguido, que "mostrou total desprezo pela auto-determinação sexual da menor", não merecia qualquer atenuação na culpa. Os factos foram "provocados e procurados por si próprio, para satisfazer os seus desejos. Não foi de todo natural. É um adulto, o que torna a culpa mais intensa"

A mãe da vítima foi assistente no processo e pediu uma indemnização para a filha. O tribunal considerou que os crimes provocaram "sofrimento psíquico e grande ansiedade na menor", comprovados pela perícias médicas. Quando os factos foram conhecidos, em especial na escola que frequentava, a aluna ficou muito afetada e ainda hoje é acompanhada por psicólogo. O tribunal condenou o explicador a pagar uma indemnização de 20 mil euros por danos morais

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt