"O grande desafio agora será conseguirmos viver melhor e de forma mais inteligente"

Com o número de casos de covid-19 a aumentar em Portugal e o mundo em suspenso à espera da tão temida segunda vaga, o DN republica a entrevista a <strong>Constantino Sakellarides</strong> em que o médico, ex-diretor-geral da Saúde e ex-presidente da Escola Nacional de Saúde Pública já deixa o alerta. <em>Este texto foi publicado originalmente no dia 2 de maio de 2020 e faz parte de um lote de trabalhos relacionados com a covid-19 que o DN está a republicar.</em>
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O estado de emergência está a chegar ao fim. Aos poucos, a sociedade vai voltar ao trabalho, às escolas, ao convívio e ao consumo, mas se a situação se agravar voltamos ao confinamento. É preciso conter o vírus. Os portugueses aguentam mais tempo de isolamento? Que consequências teria esta decisão na saúde mental dos cidadãos? As consequências económicas não seriam agravadas? A pergunta surge: e agora? Ficamos em casa ou agimos inteligentemente e adaptamo-nos? Constantino Sakellarides defende que a reabertura tem de ser pensada seriamente, implica mudanças. Até porque as epidemias vão continuar a existir e há que aprender com o que estamos a viver. "Esta é a oportunidade de criar uma consciência mais coletiva, mais informada e colaborativa. É a forma de se encarar o futuro", diz. É sobre esta perspetiva que fala ao DN sobre a ameaça covid-19, de como estamos a lidar com ela e do futuro.

Em 2006, escreveu um artigo em que já alertava para o facto de as sociedades terem de se preparar para gerir novas epidemias. Em 2009, o mundo deparou-se com a gripe A, H1N1, em 2012, com outras ameaças à saúde pública, mas ninguém estava preparado para a covid-19, pois não?
Em termos sociais e políticos não. Houve uma aprendizagem de carácter técnico e científico. Uma das questões importantes é que estas crises sanitárias coincidem, cada vez mais, com outras, como a financeira, a das dívidas soberanas e a ambiental e climática, e têm de ser percebidas neste conjunto. E não podemos desligar umas coisas das outras. Há uma importante componente de saúde pública imediata e a prazo na crise provocada pela covid-19, que atingiu fortemente o nosso bem-estar mas que temos de interligar com os aspetos sociais, económicos e políticos.

Mas não foi só Portugal, ou a Europa, que não estava preparado, o mundo não estava...
Exatamente. Tal como a crise sanitária que estamos a viver, a crise financeira também tem sido global. Teve repercussões nacionais, mas o empobrecimento que provocou, as mudanças que introduziu no tecido social, nas empresas, nas instituições, na política, nas elites de liderança, também foi sentido a nível global. E tudo isto é importante, tudo isto criou mais dificuldades na preparação do mundo para uma epidemia, acentuando ainda mais as suas consequências. Por isso, digo, uma crise sanitária tem de ser observada e avaliada globalmente, em conjunto com as crises ambiental e financeira, que não cessaram, continuamos a vivê-las. São fenómenos que não estão separados uns dos outros e que exigem respostas em conjunto.

Perante a ameaça da doença, e vendo o que se passava noutros países, como Itália e Espanha, Portugal até reagiu rapidamente...
Nesta primeira fase da pandemia, a resposta da Direção-Geral da Saúde, do Governo, do primeiro-ministro, do Presidente da República e da grande maioria dos portugueses tem sido apropriada e muito positiva. Com isso as autoridades políticas do país acumularam um importantíssimo capital de confiança para o futuro próximo. É preciso que se continue a acumular este capital. Ou, pelo menos, que não se gaste rapidamente.

E que lições podemos tirar de imediato desta primeira fase de combate à pandemia?
A primeira tem que ver com a excelente resposta do Serviço Nacional de Saúde [SNS] e dos profissionais de saúde. São lições para mais tarde recordar. Mas há um outro aspeto para o qual quero chamar a atenção. Durante este período, as pessoas mobilizaram-se, reorganizaram-se, inventaram novas formas de comunicação, aprofundaram e adquiriram novas competências. Isto é um dado muito claro. Por todo o mundo fomos vendo novas formas de expressão de solidariedade, o que quer dizer que, no fundo, se atingiu um nível de inteligência coletiva que antes não tínhamos. O importante é que depois da fase aguda da crise isso não se perca.

Há uma aprendizagem que tem de ser feita a longo prazo?
Pensando no futuro a longo prazo, temos de monitorizar melhor a fronteira entre as espécies, humana e animal, pois sabemos que é daqui que vêm os riscos pandémicos. Mas também temos de monitorizar os sinais de irreversibilidade das ameaças climáticas e estar atentos aos sinais, aos alertas precoces para fenómenos que afetam a nossa saúde económica e financeira e que agravam ainda mais as desigualdades económicas e sociais.

Refere-se a que sinais?
A covid-19 veio lembrar mais uma vez que é preciso transformar as nossas cidades, os nossos hábitos, a forma como vivemos. Por exemplo, precisamos todos de ir trabalhar à mesma hora, nos mesmos locais, da mesma forma, com a mesma organização? Precisamos de aprender todos da mesma forma nos mesmos sítios, escolas, e à mesma hora? Não podemos combinar o trabalho com a vida familiar, com as experiências culturais e com o entretenimento de outra forma? Precisamos todos de ir de férias no mesmo mês ou de descansar todos nos mesmos dias da semana? Será necessário utilizarmos todos os serviços sociais e de saúde da mesma forma? O grande desafio a partir desta crise sanitária será conseguirmos viver melhor e de forma mais inteligente no futuro, conseguirmos desenhar arquiteturas comportamentais e laborais boas para todos. Arquiteturas que tenham uma natureza fortemente adaptativa, a partir das quais seja mais fácil reorganizar ora distanciamento, em face da ameaça, ora a proximidade, quando aquela atenua.

E se não o fizermos, quais as consequências?
Uma coisa que sabemos hoje seguramente é que este tipo de ameaças vão ser frequentes e que poderão até aumentar no futuro. Se persistirmos em continuar a viver exatamente da mesma maneira as várias dimensões da nossa vida como até aqui, as consequências serão muito preocupantes.

O que implicam as mudanças de que fala?
Para já, começarmos a aprender com estas experiências. Desde já, com a que estamos a viver, que é duríssima e universal e que nos obrigou a mudar de hábitos repentinamente. Se associarmos esta experiência à necessidade de mudarmos a nossa atitude em relação ao ambiente e às alterações climáticas, em relação às políticas de emprego que seguimos, talvez possamos criar um impulso forte para mudarmos de direção no futuro. Se continuarmos a olhar para as dificuldades que experimentamos - financeiras, ambientais, sociais e sanitárias - só no imediato e cada uma por si, aprende-se pouco, continuaremos a viver crise após crise.

Quer dizer que esta crise pode ser o impulso para a mudança?
Podemos fazer desta crise o epicentro de uma filosofia mais integrada para se olhar para a sociedade, para o planeta e para o futuro, criando os impulsos necessários para novas formas de viver. Só assim evitaremos a repetição de uma pandemia tão má ou pior do que esta, em contextos socioeconómicos e políticos cada vez mais desfavoráveis.

Ou seja, para se combater uma pandemia não basta conhecer o vírus, é preciso olhar para a dinâmica social, é isso?
Exatamente. E para isso é preciso que tanto a nível nacional como europeu e até global se aproveite este impulso para promover uma sociedade mais organizada assente num outro nível de inteligência coletiva e colaborativa. O objetivo para o futuro tem de ser o da criação de comunidades mais inteligentes.

É tornar as sociedades, as comunidades, mais informadas e mais bem preparadas...
É tornar as comunidades mais capazes de aprender com as consequências das decisões tomadas para se fechar um ciclo. É necessário ter conhecimento científico sobre a doença, mas também é preciso saber como a sociedade se comporta. É um ciclo de aprendizagem, e agora temos uma oportunidade, que no passado não aproveitámos, para mudarmos de direção.

O estado de emergência termina agora. A fase que se segue, o regresso progressivo às diferentes atividades económico-sociais, é também complexa e difícil de gerir?
O Governo acaba de anunciar como será essa transição. A reabertura será progressiva na economia e nas instituições sociais, com medidas novas anunciadas a cada 15 dias, permitindo assim avaliar continuamente o impacto das que foram sendo aplicadas. Mas vamos entrar numa fase muito complexa, e a inteligência coletiva adquirida não pode ser desperdiçada, tem antes de ser promovida. O foco não pode estar exclusivamente no vírus. Tem de estar também nas pessoas. Na fase aguda da curva epidémica o modelo de comando central da emergência de saúde pública foi predominante e obrigatório. As pessoas cooperaram, fazendo o que lhes disseram. Nesta fase, o enquadramento central continua a ser indispensável, mas agora temos de tirar partido da inteligência colaborativa adquirida. E para isto as pessoas têm de ter acesso à informação epidemiológica local.

Não basta a informação nacional, tem de se ir à vivência local?
Uma epidemia é um fenómeno local. Surge da transmissão entre as pessoas que convivem habitualmente entre si e chega a outras comunidades, através das que se deslocam pelo país ou de um país para o outro. Isto quer dizer que os números nacionais, e mesmo os concelhios, tal como têm sido apresentados pelas autoridades de saúde, deixam de lado aspetos muito relevantes para se perceber este fenómeno local: onde estão e de que tipo são as cadeias de transmissão? Onde estão os focos e qual a sua intensidade? Qual o número, a distribuição geográfica e os resultados dos "testes" de diagnóstico para a infeção? Qual o tempo entre as colheitas para a testagem e o isolamento dos contactos positivos? Qual o rasto serológico do vírus? Quando estamos todos fechados em casa, saber tudo isto talvez não seja indispensável. No entanto, quando se desenham estratégias de transição para a reabertura, o conhecimento dos espaços que fazem parte da nossa convivência é essencial.

Porquê?
Para se saber como agir. Devemos ter informação local em relação ao distanciamento social, à mobilidade e à utilização de dispositivos de proteção individual. Durante o estado de emergência foram detetadas variações comportamentais no país, de uma localidade para outra, mesmo quando as orientações eram iguais para todos. Por isso mesmo, precisamos de conhecer as respostas de proximidade dos serviços sociais e de saúde: como podemos comunicar com os nossos serviços locais quando precisamos de ajuda? Como podemos aceder a estes serviços? Que resposta podemos esperar? Se conjugarmos estes diferentes tipos de informação - sobre a transmissão do vírus, as pessoas e os serviços locais - será possível desenhar estratégias participativas locais, em constante atualização, que ativam a inteligência colaborativa criada em vez de a ignorar.

Temos de saber o que se passa no nosso bairro, na nossa freguesia, na nossa cidade, para sabermos como agir, evitarmos o contágio e não voltarmos a ficar em casa?
Claro. Podemos ser bem-mandados durante um ou dois meses, mas para 12 meses temos de começar a fazer parte do jogo. Quando o risco de infeção na minha comunidade for substancialmente inferior aos múltiplos efeitos sobre a minha saúde de um confinamento prolongado, eu quero sabê-lo, quero fazer parte da solução e aprender com os resultados. Não me digam para esperar em casa, digam-me para ser inteligente, deem-me informação sobre o que se passa nos espaços em que me movo para saber como agir.

Nesta fase, ainda há receio de se voltar à rua e de o contágio aumentar...
As pessoas, com a sua inteligência individual e coletiva, têm de começar a participar. Aliás, esta é uma das seis recomendações da Organização Mundial da Saúde para esta fase de transição - "communities are fully educated, engaged and empowered to adjust to the new norm" - e, curiosamente, a menos valorizada. Cada um de nós pode ser um elemento útil e ativo neste regresso, através da forma como se protege, como se comporta de acordo com o evoluir da situação. E todos devemos assumir esta responsabilidade.

Não haverá o risco de estarmos a sair do confinamento de uma forma precipitada...
É importante que essa precipitação não aconteça. Mas fala-se muito pouco dos inconvenientes do confinamento prolongado para a saúde das pessoas. Inconvenientes físicos, relacionais, de saúde mental, nos padrões de utilização dos cuidados de saúde. Ambas as vertentes têm de ser ponderadas simultaneamente. Contudo, estamos numa fase em que o risco de infeção diminuiu, e os somatórios e as médias nacionais da intensidade de transmissão estimada têm cada vez menos significado. Por isso, os focos locais de transmissão é que devem passar a preocupar-nos. As orientações gerais têm de vir acompanhadas de soluções de proximidade.

Fala em soluções adaptadas às localidades e de acordo com a evolução da doença nestas?
Falo nos pormenores das respostas locais dentro do enquadramento nacional definido. A transição tem de ser para todos, mas de diferentes maneiras. O principal desafio de saúde do país é a morbilidade múltipla que acompanha o processo de envelhecimento. Portanto, as respostas nesta fase requerem estratégias locais, evolutivas, adotadas segundo a epidemiologia da infeção e dos padrões de morbilidade observados, dos comportamentos sociais e das respostas efetivas dos serviços sociais e de saúde das localidades. Estes são os progressos que devemos ter em conta para dar as respostas de proximidade que agora interessam. Precisamos de verdadeiras estratégias locais de saúde. Elas são o estado da arte na saúde pública atual.

Mas, por exemplo, o que fazer com os mais idosos e vulneráveis?
A questão dos mais velhos é particularmente delicada, e muitos têm chamado a atenção para ela. Há já fadiga em relação ao confinamento, especialmente quando somos afastados de qualquer participação contextualizada na resposta que deve ser dada. E também fadiga em relação ao isolamento. Já não falo no isolamento por não se ter ninguém, já de si suficientemente frequente e trágico, falo do isolamento que surge dentro da própria família, mesmo com laços afetivos, da solidão que aparece associada ao deixar-se de pensar no futuro, ao perder-se um sentido para a existência, a solidão que aparece ao pensar-se: "Já fiz o que tinha a fazer." Falo da perda do gosto de se relacionar com os outros, do não se querer sair do casulo, do gosto por se manter ativo física, intelectual e socialmente.

O isolamento também tem consequências, e graves...
O sentir-se progressivamente mais confortável com o isolamento não é um bom sinal. Não se pode lavrar sentenças por grosso para coisas tão delicadas. Uma resposta inteligente, integrada e de proximidade para as situações dos mais velhos deve fazer parte necessariamente de todas as estratégias locais de transição. Para os que se acumulam em lares e para os outros. E esta resposta deve ter a participação das autarquias, das redes sociais locais, das farmácias comunitárias, das unidades funcionais dos ACeS, particularmente da unidade de saúde pública, dos serviços sociais, das ações de voluntariado. Não queremos nem a negligência por fadiga pandémica, nem o fatalismo, nem o abandono ao isolamento e à solidão.

Que base temos para se tomar agora as decisões para o fim do confinamento? Há especialistas em saúde pública que não são a favor de que cesse nesta fase...
É preciso dizer que estamos em terreno virgem. Não há experiências anteriores sobre a saída de um confinamento como o que vivemos agora. E há ainda importantes incertezas sobre a epidemiologia da doença, as projeções e previsões recentes não têm sido muito certeiras, ainda não sabemos quando teremos medicamentos eficazes e uma vacina. Portanto, nesta fase da epidemia tem havido reuniões semanais entre os poderes políticos e peritos em epidemiologia que têm sido muito positivas, porque além de incentivarem e valorizarem os exercícios analíticos em curso proporcionam ao sistema político uma base de conhecimento comum, pertinente e atualizada. É bom que estas continuem a acontecer. Mas também me parece que nas atuais circunstâncias, particularmente complexas, a fórmula simples de que "o Governo obteve a informação e com base nela vai decidir" não é suficiente.

Porquê?
A organização de uma base de conhecimento para a decisão política nesta altura precisa de outra amplitude de saúde pública por duas razões: a primeira é que requer uma síntese de várias contribuições disciplinares, o que se passa com a doença e a saúde das pessoas, além desta infeção, quais as perceções e os comportamentos sociais, como respondem os serviços sociais e de saúde; a segunda é o facto de esta síntese requerer a interpretação através de juízos experimentados nesta arte. Ou seja, o que significa tudo isto no que respeita à proteção da saúde publica? Que estratégia de ação sugere? Esta deve ser a base de conhecimento que deve servir de sustentação às decisões políticas. É importante que este processo seja transparente e partilhado. Isso ajuda a manter e a fortalecer o alinhamento social e político até agora conseguido.

Indo agora ao SNS, este regresso à normalidade também tem de trazer mudanças...
Para toda a sociedade, o fim do confinamento, a reabertura, tem de ser visto como um verdadeiro regresso ao futuro. Tinha 33 anos quando ocorreu o 25 de Abril, que comemorámos recentemente, e para a minha geração, jovens profissionais crescidos num mundo fechado, difícil, sem perspetivas para o futuro, a melhor forma de definir o efeito da revolução, tenho forte convicção nisto, foi o de ser um verdadeiro regresso ao futuro. Penso que esta ideia, regressar ao futuro, nunca foi tão apropriada como agora.

E isso vale também para o SNS?
Claro. O SNS esteve fechado ou subutilizado, vai começar a reabrir, e esta reabertura não pode ser um regresso ao passado. Tem de aprender com esta experiência e tem de aproveitar a oportunidade de mudança. Tem de haver "um regresso ao futuro". É preciso repensar a integração dos cuidados de saúde, numa resposta séria ao envelhecimento e à morbilidade múltipla, na articulação efetiva com os serviços sociais, na promoção e na coordenação do cuidar em casa, em novas abordagens ao acesso aos cuidados de saúde. Se assim fizermos, em 2021 podemos já começar a vislumbrar no terreno os primeiros indícios de um SNS de segunda geração.

Mas o que é preciso fazer já?
Em primeiro lugar acabar com a fragmentação, que é histórica, muito resistente, mas que tem sido extremamente gravosa para a qualidade dos cuidados. A fragmentação e a verticalização, que há muito estão na conceção do SNS, são hoje altamente disfuncionais.

Quando fala da fragmentação, fala em mais articulação de cuidados?
Articulação no sentido de gerir o percurso das pessoas entre os vários serviços de que precisam. Às pessoas não interessa que se chame hospital ou cuidados primários, o que elas precisam é de transitar de um lado para o outro de acordo com as suas necessidades e de obter bons resultados.

Falámos de Portugal, mas o vírus continua muito ativo noutras partes do mundo. O receio de um segundo surto é real?
Um segundo surto depende de vários fatores. Basta haver territórios por esse mundo fora onde a transmissão esteja fortemente ativa para que ninguém esteja descansado. Qualquer foco ativo desta infeção em qualquer parte do mundo é uma ameaça para todos. É muito importante que os países que podem mais ajudem os países que podem menos. Além da atitude solidária, isso é do seu próprio interesse.

Daí os apelos até do secretário-geral da ONU, António Guterres, para a ajuda a África e à América do Sul...
Sim, em África e na América do Sul, e também porventura na Índia, as condições de resposta à pandemia são muito más, há pouca capacidade para identificar a infeção, para responder em termos de saúde pública e em cuidados de saúde, já que a doença pede, nas expressões mais graves, cuidados intensivos bem equipados e competentes. Mas sofrem sempre os que têm menos. Morre-se da doença mas, parte do mundo, também de fome. Até num país como os EUA... a experiência no estado de Nova Iorque é tremenda. É a população mais desprotegida a nível social e de acesso à saúde que está a ser dizimada.

Diz num artigo, recentemente publicado na Acta Médica Portuguesa, que olhar para o futuro é uma obrigação pessoal e profissional e não uma redenção, porquê?
Porque não podemos reparar muito do sofrimento que esta doença já causou. Mas podemos fazer muito mais para proteger o bem-estar das pessoas no futuro. Regressar ao futuro não é uma forma de redimirmos os nossos pecados do que não fizemos. É uma forma de sermos inteligentes em relação ao que já aprendemos. É uma obrigação pessoal e profissional, para nós, para os nossos filhos, para as novas gerações em relação a um futuro melhor.

(Publicada originalmente a 2 de maio de 2020)

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