Depois do 01, do 02 e do 03, o Bolsonaro 04 já está na política

Depois do senador Flávio, do vereador Carlos e do deputado Eduardo, o 04, como o pai o chama, será vogal do Aliança Pelo Brasil, novo partido do clã. Mesmo novato, já tem uma razoável coleção de polémicas, como os irmãos.
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No meio da extensa lista de membros da direção do Aliança pelo Brasil (APB), a força política brasileira nascida no dia 22 de novembro num hotel de Brasília em redor da figura e do ideário de Jair Bolsonaro, está lá em letras pequeninas o nome de Renan Bolsonaro no papel de vogal. O quarto filho do presidente, 21 anos, estreia-se na política, à imagem do pai e dos três irmãos mais velhos, como dirigente daquele que se define como "o partido da família" - no sentido lato, claro.

Jair Renan, mas conhecido só por Renan, é tido como discreto e tímido, com meras dezenas de milhares de seguidores nas redes sociais, ao contrário dos mediáticos irmãos, o senador Flávio Bolsonaro (38 anos), que será vice-presidente da APB, o vereador Carlos Bolsonaro (36 anos) e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (35 anos), todos com seguidores na casa dos milhões. O presidente da República chama-os, pela ordem de idade, de 01, 02, 03 e 04.

Enquanto os três irmãos mais velhos, 01, 02 e 03, são filhos de Rogéria Nantes, a primeira mulher de Bolsonaro, o novo membro do clã de políticos, o 04, é fruto do segundo casamento do pai, com Ana Cristina Valle. O hoje presidente e Cristina conheceram-se era ela chefe de gabinete de um outro parlamentar. Estiveram juntos 11 anos. Hoje, Bolsonaro é casado com Michelle, a primeira-dama e mãe de Laura, e Cristina com um cidadão norueguês, com quem Renan morou em Resende, cidade no estado do Rio de Janeiro.

Por causa da tal discrição e timidez, sabe-se pouco de Renan, apenas que estudou Dreito no Rio de Janeiro mas deixou o curso em suspenso para se dedicar a outro em Tecnologia da Informação, em Brasília, onde mora num apartamento do pai que gerou controvérsia em janeiro de 2018 - reportagem do jornal Folha de S. Paulo revelou que, apesar de ser proprietário desse imóvel, o então deputado não abdicou de um subsídio de 3000 reais de auxílio moradia para morar na capital brasileira.

"O que eu fiz com esse dinheiro? Como estava solteiro nessa época, usei-o para comer gente", justificou Jair Bolsonaro na ocasião, irritado com a revelação.

Publicamente, Renan, chamado de "Mitinho", porque a alcunha do pai entre os seus apoiantes é "Mito", ou de "BolsoKid", o seu petit nom preferido nos jogos de computador online, só falou de política logo após o tristemente célebre atentado à faca de Juiz de Fora, um mês antes das eleições - "a partir de hoje, estou nessa luta com os meus pais, os meus irmãos e junto com o Brasil", afirmou.

Antes de se tornar dirigente da APB, era militante do Partido Social Cristão, o sétimo de nove partidos a que o pai pertenceu ao longo da carreira política de 30 anos.

Outras reportagens caracterizam-no como um fã absoluto do jogo de computador League of Legends - chega a partilhar vídeos de seis horas a jogar - e espectador do reality show da TV Bandeirantes Polícia 24, que acompanha ações de agentes das forças de segurança paulistas. "Vamos ver aí o Polícia24 horas, ver marginal se foder mesmo, 'tá ligado? Presídio em Pedrinhas [penitenciária no Maranhão que registou casos de decapitação, mutilação e canibalismo nos últimos anos] 'tá uma maravilha."

Segundo o Folha de S. Paulo, Renan tem ainda um outro hobby invulgar: cria oito galinhas, que nomeou de A a H.

O mais alto dos irmãos, com 1,91 metros, esteve no centro de uma outra polémica, quando tinha 12 anos. Bolsonaro, na altura deputado, pediu intervenção ao Ministério dos Negócios Estrangeiros a propósito de uma viagem de Cristina com o filho para Oslo, capital do país do seu segundo marido, sem autorização do pai. O tema, divulgado entre a primeira e a segunda voltas da eleição presidencial foi, no entanto, desdramatizado pela mãe de Renan: "Acabou tudo bem, ele tirou a ação e ficou tudo bem, ele nem deveria ter feito isso mas fez, foi coisa de pai, porque ele tem um amor fora do comum pelos filhos."

Por outro lado, em 2017, uma troca de mensagens tornada pública entre os então deputados Jair e Eduardo expôs Renan em modos pouco abonatórios. Irritado porque Eduardo faltara a uma votação eleitoral importante no Parlamento, Jair escreveu: "Papel de filho da puta que você está fazendo comigo. Tens moral para falar do Renan? Irresponsável." Ao que Eduardo rebateu: "Quer me dar esporro [calão para reprimenda] tudo bem. O vacilo foi meu. Achei que a eleição só fosse semana que vem. Mas me comparar com o merda do seu filho, calma lá."

No entanto, Renan foi sobretudo notícia durante as investigações do caso da execução de Marielle Franco, do PSOL. Quando as autoridades prenderam o ex-polícia Ronnie Lessa, acusado de ser autor dos disparos que mataram a vereadora de extrema-esquerda e o motorista Anderson Gomes, revelaram paralelamente que Renan e uma filha do suposto assassino, que vivia no mesmo condomínio do presidente da República, haviam namorado.

Mas Renan ainda está longe de dar tantas dores de cabeça ao governo do pai como os irmãos.

O mais velho, Flávio, é acusado pelo Ministério Público de organização criminosa e lavagem de dinheiro. As autoridades suspeitam que, ainda deputado estadual no Rio, comandava ao lado de Fabrício Queiroz, membro do seu gabinete, amigo de 30 anos do presidente da República e com ligações à máfia carioca (conhecida como milícia), um esquema de "rachadinha". Ou seja, desviava o dinheiro do salário dos seus colaboradores, a maioria dos quais nem sequer exercia funções no gabinete.

Carlos, que enquanto coordenador das redes sociais oficiais do pai foi obrigado a pedir desculpas e a recuar de publicações embaraçosas, é considerado responsável pela demissão de dois ministros, até então da estrita confiança do Planalto, com quem se incompatibilizou: Gustavo Bebianno e Santos Cruz. E ainda se tornou crítico feroz do general Hamilton Mourão, vice-presidente da República. No último mês, cancelou, sem explicações, os seus perfis nas redes sociais onde era hiperativo.

Eduardo defendeu a criação de uma bomba atómica no Brasil, para impor respeito à Venezuela de Nicolás Maduro. Disse que bastariam um cabo, um soldado e um jipe para fechar o Supremo Tribunal Federal e falou no regresso do Ato Institucional número 5, o decreto da ditadura militar que em 1968 suspendeu mandatos parlamentares, aplicou a censura, decretou prisões e execuções políticas e promoveu a tortura. Por esta última declaração responde a processo no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados.

O APB, de que Renan será vogal, Flávio "vice" e que Carlos e Eduardo em breve integrarão, ainda está dependente do cumprimento de complexos requisitos burocráticos para se oficializar como partido e poder concorrer a eleições. Mas na convenção inaugural, semanas após rompimento traumático de Bolsonaro com o anterior partido, já disse ao que vinha: com muitas citações da Bíblia, terá como princípios "o respeito a Deus e à religião". Mas também a "garantia da ordem, da representação política e da segurança", razão pela qual o seu logótipo foi esculpido com cartuchos de bala. Além, claro, do propósito de "defender a família".

Laura: conhecida pela "fraquejada"

Além dos quatro filhos, Jair Bolsonaro é pai ainda de Laura Bolsonaro, de 8 anos, fruto do casamento com a atual mulher, a primeira-dama do Brasil, Michelle de Paula Bolsonaro. Laura, com a irmã Letícia, filha de uma primeira relação de Michelle, vive no Palácio do Alvorada, a residência oficial do presidente da República do Brasil. Sem, naturalmente ter ainda demonstrado qualquer inclinação para a política, Laura foi, no entanto, bandeira da luta de feministas brasileiras contra a eleição do seu pai. Tudo porque numa controversa palestra no Clube Hebraica, no Rio, o então candidato presidencial, já depois de ter atacado quilombolas (habitantes de quilombos, antigos refúgios de escravos africanos e afrodescendentes), afirmou que teve "cinco filhos, quatro são homens mas à quinta eu dei uma fraquejada e veio uma mulher". O movimento Ele Não, de mulheres em oposição a Bolsonaro, usou então a expressão para criar palavras de ordem como "nós não somos fraquejadas".

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