Restrições baixam. Mais de cem milhões de chineses em viagem
Regresso à normalidade possível passa pelo turismo interno durante as férias de cinco dias num país que pode estar com 20% de taxa de desemprego.

Turistas na Grande Muralha da China.
© WANG ZHAO / AFP
Na China o feriado do 1.º de Maio não se esgota nas 24 horas. Em 2008 o governo encurtou o período de férias de sete para três dias e este ano voltou a estendê-lo, desta vez para cinco. Como é tradição, milhões de chineses vão aproveitar para viajar, mas desta vez sem saírem do país.
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Citado pelo The Guardian , o Ministério dos Transportes chinês prevê que 117 milhões de chineses aproveitem a pausa para viajar. Um número que, apesar da sua grandeza corresponde a menos de um décimo da população.

Passageiros aguardam pelo autocarro de longa distância na estação central de Wuhan.
© AFP
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A agência turística online Trip.com avalia em 90 milhões o número de viagens internas nesta quadra, quando no ano passado foram 195 milhões.
"Este ano, o entusiasmo das pessoas pelas viagens foi inibido", comentou um porta-voz da empresa ao jornal de Hong Kong South China Morning Pos t.
As autoridades anunciaram uma descida do nível de emergência na província de Hebei (cuja capital foi o epicentro do covid-19, Wuhan) e os municípios de Pequim e Tianjin, a partir de quinta-feira.
As medidas permitem que dezenas de milhões de pessoas viajem sem terem de se submeter a 14 dias de quarentena domiciliária no regresso. As pessoas chegadas de zonas de chamado baixo risco também já não precisam de completar duas semanas de isolamento em Pequim.

Autocarro alvo de desinfeção em Wuhan.
© AFP
No entanto, como o levantamento dessas restrições ocorreu com poucas horas de antecedência e as viagens para o estrangeiro são desaconselhadas pelas autoridades e sujeitas a proibições em grande número de países, as viagens internas, em especial as viagens no interior de cada província serão a escolha preferida pela maioria dos turistas
Segundo a Trip.com, Xangai, Guangzhou e Pequim são os três principais destinos para os turistas.

Retrato de Sun Yat-sen, considerado o pai da República Popular da China, na praça Tiananmen, Pequim.
© EPA/Wu Hong
Essa empresa destaca que mais de metade das reservas de hotéis foram feitas para unidades de quatro e cinco estrelas, refletindo a importância atribuída à higiene, segurança e espaços com menor ocupação.
Um total de 4 mil locais turísticos estarão abertos neste período, um número recorde desde o início da pandemia, prevendo-se que os sítios mais populares sejam a Grande Muralha na secção Mutianyu, a 80 quilómetros de Pequim, e o parque florestal Taiping, no centro da China.
Este é um momento de enorme importância para o início da recuperação económica do setor do turismo. A consultora Analysys estima que a indústria do turismo nacional da China tem perdido uma média diária de 1,2 mil milhões de euros, segundo o South China Morning Post .
Também as companhias aéreas chinesas esperam um regresso a uma maior atividade. O aumento das reservas para este período permitiu recuperar 40% do seu tráfego, e há inclusive novas rotas internas a ligar o novo aeroporto da capital chinesa ao resto do país.
Milhões e milhões no desemprego
Faz parte da política dos governos locais a introdução de incentivos para os cidadãos viajarem ou fazerem compras para relançar a economia, duramente atingida.
Segundo a The Economist , as despesas dos consumidores em atividades como restaurantes diminuíram 40% e as estadias em hotéis são um terço do normal. Pior, a paragem da economia levou a um aumento de falências e o consequente desemprego que, disse uma empresa de corretagem à revista, é três vezes superior aos dados oficiais, ou seja, cerca de 20%.
Esses dados estão em linha com os que a UBS Securities divulgou. Cerca de 80 milhões de empregos podem ter desaparecido nos setores de serviços, indústria e construção desde a eclosão do coronavírus em Wuhan. Outros 10 milhões de postos de trabalho podem ter sido cortados devido à queda das exportações chinesas para os mercados da Europa e América do Norte. "O mercado de trabalho chinês provavelmente está sob a maior pressão desde o final dos anos 1990 ou início dos anos 2000", analisa a UBS.
A China tem como espinha dorsal da economia cerca de 280 milhões de trabalhadores rurais e migrantes internos, uma mão de obra flexível e barata que é a mais vulnerável neste momento.
Segundo uma previsão da Economist Unit Intelligence, entre os que não perdem o emprego, até 250 milhões de trabalhadores deverão perder entre 10% e 50% do rendimento neste ano.
Covid-19 não foi criado em laboratório
As agências de de informações dos Estados Unidos concluíram que o novo coronavírus não foi "feito pelo homem ou geneticamente modificado", mas ainda estão a examinar as origens da pandemia, dias depois de a Austrália ter pedido uma investigação independente sobre o assunto.
"A comunidade de serviços de informação também concorda com o amplo consenso científico de que o vírus Covid-19 não foi produzido pelo homem nem geneticamente modificado", declarou o gabinete do diretor dos serviços secretos dos EUA. "Continuar-se-á a examinar rigorosamente a informação e os dados recolhidos para determinar se o surto começou através do contacto com animais infetados ou se foi o resultado de um acidente num laboratório em Wuhan", lê-se no comunicado do órgão dirigido interinamente por Richard Grenell.
A declaração da entidade coordenadora da rede de agências de espionagem dos EUA surge numa altura em que o presidente Donald Trump tem invocado a teoria de que o laboratório do Instituto de Virologia de Wuhan seja a origem da pandemia que já matou mais de 220 mil pessoas em todo o mundo.
Essa teoria tem servido múltiplos propósitos, desde desviar atenções para as responsabilidades próprias, ao aumento de pressão na guerra comercial com Pequim.
Nos últimos dias, a administração Trump intensificou a sua retórica em relação à China, com o secretário de Estado Mike Pompeo a atacar em múltiplas frentes, das detenções realizadas aos manifestantes em Hong Kong ao boicote de equipamentos de telecomunicações Huawei nas instalações diplomáticas americanas e às culpas da China na propagação do coronavírus.
Inclusive Donald Trump acusou Pequim de "fazer tudo" para impedir a sua reeleição em novembro, o que foi prontamente desmentido pelo governo chinês.
Para Pompeo parte da missão do Departamento de Estado é proteger a vida dos norte-americanos contra ameaças e isso inclui saber como o vírus se propagou a partir de Wuhan.
"O Partido Comunista Chinês diz-nos que quer ser nosso parceiro, que quer ser transparente. Precisamos de parceiros em quem possamos confiar. Que quando nos dizem alguma coisa seja exato e não ficamos a pensar que nos estão a esconder alguma coisa", disse.
Pompeo lembrou que os cientistas dos EUA e de todo o mundo ainda não tiveram acesso ao Instituto de Virologia nem a outros laboratórios que estudam agentes patogénicos contagiosos na China.
"Não é a primeira vez que um vírus sai da China", disse Pompeo. "E por isso há uma obrigação contínua por parte de parceiros fiáveis de partilhar esta informação com o mundo".
Há dias foi revelado pelo Washington Post que em 2018 diplomatas norte-americanos em Pequim manifestaram preocupação quanto a potenciais problemas de segurança no laboratório de Wuhan.
Na quinta-feira, o governo chinês afirmou que quaisquer alegações de que o coronavírus tenha saído de um laboratório são "infundadas e puramente fabricadas a partir do nada".
O porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Geng Shuang, assegurou que o laboratório de Wuhan aplica procedimentos de segurança que impediriam a libertação de qualquer agente patogénico.