Mais de um quarto dos 230 deputados que compõem a Assembleia da República são advogados ou juristas, representando a área profissional com maior peso no Parlamento. No total são 60 os parlamentares que vêm da área do Direito, com claro predomínio para os oriundos da advocacia: há 42 advogados no hemiciclo, a que se somam 18 juristas..Só há uma profissão que rivaliza com estas: a de professor, na esmagadora maioria dos casos do ensino universitário, embora se encontrem também entre os deputados alguns docentes do ensino secundário. No total, empatam com os advogados: são também 42..A compatibilidade entre o cargo de deputado e o exercício da advocacia é uma polémica de há décadas, que se reacendeu no final da passada semana quando o PSD apresentou e o PS viabilizou uma norma que permite aos parlamentares serem sócios ou prestarem serviços a sociedades que trabalhem para o Estado, uma decisão de sentido contrário ao texto que tinha sido aprovado inicialmente (numa votação de caráter indicativo)..Na primeira versão (aprovada com os votos do PS, do BE e do PCP), o texto fechava completamente a hipótese de os deputados trabalharem em sociedades que prestem serviços a entidades públicas, determinando que lhes estaria vedado "integrar ou prestar quaisquer serviços a sociedades civis ou comerciais" que desenvolvam atividades como "prestar serviços, exercer funções como consultor, emitir pareceres ou exercer o patrocínio judiciário nos processos, em qualquer foro, a favor ou contra o Estado ou quaisquer outros entes públicos"..O texto que foi aprovado na noite da última quinta-feira é substancialmente diferente, estipulando que é interdito aos deputados-advogados "intervir" nos casos em que o cliente da sociedade seja o Estado ou uma entidade pública. O mesmo é dizer que a proibição deixa de abranger a sociedade e passa a aplicar-se apenas à intervenção direta do deputado. A alteração - apresentada pelo PSD e viabilizada pela abstenção do PS - acabou por constituir o foco de maior polémica na discussão das alterações ao Estatuto dos Deputados..De acordo com o levantamento feito pelo DN à atividade profissional dos 230 eleitos, o PSD é o partido com maior número de deputados oriundos da área do Direito: são 24 advogados (é a profissão maioritária na bancada parlamentar laranja, que tem 89 parlamentares), 17 dos quais são remunerados. Ou seja, não estão em regime de exclusividade na Assembleia da República, acumulando as funções de deputado com o exercício privado da advocacia. Na bancada laranja há ainda quatro juristas. A segunda profissão mais representada são os professores - são 15..No PS há dez advogados (quatro declaram atividade remunerada na advocacia) e sete juristas. O número empata com o de docentes: são 17 numa bancada de 86 eleitos..Nos restantes partidos, o grupo parlamentar do CDS tem seis advogados (um com atividade remunerada) e quatro juristas. Proporcionalmente é a bancada em que esta área profissional tem mais peso. No Bloco de Esquerda não há advogados nem juristas (a profissão maioritária é professor, cinco deputados bloquistas são docentes), no PCP há dois advogados (nenhum a exercer) e um jurista, no PEV os dois parlamentares são juristas..Deputados da comissão seriam abrangidos pelas restrições.Reflexo da composição do Parlamento, a própria Comissão Eventual para o Reforço da Transparência é constituída maioritariamente por advogados e juristas - 11 num total de 23 membros efetivos da comissão (a que se juntam dois docentes universitários na área do Direito)..De entre estes há sete advogados remunerados - seis do PSD e um do PS - que, a serem eleitos na próxima legislatura, seriam mais diretamente afetados pelas restrições que estavam em cima da mesa, na medida em que as sociedades para as quais trabalham deixariam de poder prestar serviços a qualquer entidade pública..Mas os deputados-advogados não são caso único. A versão inicial aprovada na Comissão da Transparência estendia a mesma limitação a outras profissões liberais (caso dos arquitetos, por exemplo), impedindo o exercício de funções remuneradas em entidades que prestem serviços ao Estado. Uma limitação que ficou igualmente pelo caminho.