Varoufakis, ex-ministro das Finanças grego, decreta fim do capitalismo e início do tecnofeudalismo
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Varoufakis, ex-ministro das Finanças grego, decreta fim do capitalismo e início do tecnofeudalismo

Ministro nos tempos da 'troika', economista grego lançou o livro 'Tecnofeudalismo - Ou o fim do capitalismo', agora disponível em português.
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O antigo ministro das Finanças grego Yanis Varoufakis considera que o capitalismo chegou ao fim, com as rendas das empresas tecnológicas a substituírem o lucro como motor das economias, dando origem a um sistema a que chamou tecnofeudalismo.

Este regresso a um passado feudal na era da tecnologia e da Inteligência Artificial é a ideia central do novo livro do economista grego, Tecnofeudalismo - Ou o fim do capitalismo, agora lançado em Portugal pela editora Objectiva (Penguim Random House).

"Observada no seu conjunto, torna-se evidente que a economia mundial é cada vez menos movida pelo lucro e cada vez mais pela renda da nuvem", escreve Varoufakis, fazendo depois a distinção entre os conceitos de renda e lucro, no último caso um bem ou mercadoria ao qual é acrescentado valor.

As empresas detentoras do poder tecnológico, a quem chama os "cloudalistas", são os novos suseranos do sistema político a quem os capitalistas tradicionais prestam vassalagem, sob a forma do pagamento de rendas.

Na base na pirâmide estão os proletários e os servos do sistema, utilizadores das plataformas e redes sociais que, simultaneamente, as alimentam e lhes dão pistas e informações para os algoritmos trabalharem depois as melhores formas para captar a sua atenção, colocando-se ao serviço dos vassalos-capitalistas para venderem as suas mercadorias.

Para o antigo ministro das Finanças grego dos tempos da 'troika', "o capitalismo definha como resultado da atividade capitalista em expansão".

"Foi por meio da própria atividade capitalista que nasceu o tecnofeudalismo, e é assim que está a conquistar o poder. Afinal, como poderia ser de outro modo", questiona.

Num registo de diálogo com o seu falecido pai, com referências que vão da mitologia grega à cultura pop, Varoufakis vai buscar as mudanças tecnológicas das últimas duas décadas para mostrar como conduziram ao predomínio das plataformas tecnológicas sobre os mercados tradicionais.

São dados inúmeros exemplos na economia norte-americana, apontados casos de empresas como a Apple, Google, Tesla ou Amazon, mas também, no caso chinês, do Tik-Tok, Alibaba, Tencent, Baidu, Ping An ou JD.com.

"Desde os donos de fábricas no Midwest dos Estados Unidos aos poetas que lutam para vender a sua mais recente antologia, dos motoristas da Uber em Londres aos vendedores ambulantes na Indonésia, todos dependem agora de algum feudo da nuvem para aceder aos seus clientes. É um progresso, de certo modo", escreve.

Varoufakis nota que "ficou para trás o tempo em que, para cobrar a renda, os senhores feudais mandavam os rufias partir as pernas ou derramar o sangue dos seus vassalos".

Na sua opinião, "os cloudalistas não precisam de recorrer a agentes de execução para confiscar bens ou proceder a despejos. Basta removerem uma ligação da página do vassalo na nuvem para este perder o acesso à maioria dos seus clientes. E bastaria a remoção de uma ou duas hiperligações do motor de busca da Google ou de alguns sites de redes sociais e de comércio eletrónico para desaparecerem por completo do mundo online".

"O tecnofeudalismo assenta num terror higienizado e tecnológico", remata o ex-ministro grego, depois de apontar o poder de terminadas empresas, como a Tesla, de desligar o sistema operativo dos seus automóveis, ou da Google ou Apple, ao retirarem os seus sistemas operativos de determinada marca de telemóveis.

O economista grego, doutorado na Universidade de Essex, no Reino Unido, prevê uma nova "Guerra Fria", desta vez entre os Estados Unidos e a China em defesa dos respetivos rentistas, não deixa de recordar a criação do yuan digital pelas autoridades chinesas para contornar obstáculos e com graves prejuízos para a Europa, mas sobretudo para países em desenvolvimento como a Índia e todos os países de África e da América latina.

"A ausência de capital-nuvem na Europa significa que a nova Guerra Fria, conjugada com o choque energético que a guerra na Ucrânia infligiu aos seus industriais, já fez com que este continente se tornasse geoestrategicamente irrelevante", sustenta.

Varoufakis aponta os perigos deste novo sistema para os valores liberais e para a própria democracia e apontando possíveis caminhos para o inverter.

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