Mais de uma dezena dos contratos públicos de grande dimensão (mais de 30 milhões de euros) de que há registo desde 2008, ou seja, dos últimos 17 anos, foram feitos em 2025 e o maior contrato alguma vez celebrado em Portugal foi assinado no final de julho passado, para lançar a linha de comboio de alta velocidade no norte do país.De acordo com um levantamento feito pelo DN/Dinheiro Vivo no Portal Base, a corrida aos grandes projetos está a ser muito elevada agora, até para aproveitar alguns recursos existentes, como o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) que expira a meio do ano que vem. Assim, ainda o ano de 2025 não acabou (falta mês e meio) e já foi superado em 10% o valor total dos contratos públicos publicados no ano passado.De acordo com dados do mesmo portal Base, onde o governo centraliza a informação sobre os contratos públicos celebrados em Portugal continental e regiões autónomas, até 13 de novembro, o valor contratado ascende já a 19,8 mil milhões de euros desde janeiro, mais 1,7 mil milhões de euros do que em todo o ano de 2024.E há uma explicação imediata: a linha ferroviária de alta velocidade, cuja concessão a norte foi contratualizada este ano, é agora o maior contrato público alguma vez feito no país, avaliado em 1,66 mil milhões de euros.De acordo com o Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção, que tem a responsabilidade pela gestão do portal, a 17 de setembro foi publicado o contrato relativo à empreitada de obras públicas que resultou do "concurso público com publicidade internacional para a Concessão da Linha Ferroviária de Alta Velocidade entre Porto (Campanhã) e Oiã".O valor contratual é estimado nos referidos 1,7 mil milhões de euros. Como é normal nestes grandes contratos, o valor não é todo em investimento neste ano, é plurianual. De acordo com a minuta, o prazo de execução é de "10.957 dias", ou seja, 30 anos.Este megaprojeto de investimento (público e privado) na ferrovia de alta velocidade é algo que está a marinar, por assim dizer, há mais de duas décadas.Em 2005, o então governo do PS, de José Sócrates, empenhou-se muito em avançar no projeto (na altura pela mão de Mário Lino, ministro das Obras Públicas, e Fernando Teixeira dos Santos, das Finanças, ambos na foto do arquivo do DN), mas na altura este tipo de obras (nesse tempo, era o projeto bandeira do chamado PIIP - Programa de Investimentos em Infra-estruturas Prioritárias) encontrou forte oposição do PSD, que criticava o despesismo e o risco para as contas públicas, e do próprio ministro das Finanças, Luís Campos e Cunha, que durou apenas três meses no cargo, saindo em colisão frontal com o primeiro-ministro Sócrates por causa disso.Seria substituído em julho de 2005 por Teixeira dos Santos, que ficou até ao fim, até à bancarrota do país, na primavera de 2011.Hoje, é o governo social-democrata, de Luís Montenegro, que dá os maiores passos no projeto do TGV (que não é só nacional, vai integrar a rede europeia de alta velocidade) e isso já se ressente nas estimativas e previsões de investimento público deste executivo, sendo aplaudido pela Comissão Europeia e outros organismos internacionais, como OCDE e FMI.O salto na ferrovia faz com que este ano, que ainda não terminou, concentre já quase 30% do valor contratualizado total em sede de grandes projetos de investimento (contratos acima dos 30 milhões de euros) nas últimas duas décadas.TGVO contrato para construir a linha ferroviária de alta velocidade no norte do país, entre Porto (Campanhã) e Oiã é, de longe, o maior de que há registo, do alto dos seus 1,7 mil milhões de euros.A entidade adjudicante é Infraestruturas de Portugal, a adjudicatária (vencedora do concurso) é o consórcio AVAN Norte – Gestão da Ferrovia de Alta Velocidade, SA.O projeto vai mexer com dois distritos (Porto e Aveiro) e nove municípios (Vila Nova de Gaia, Oliveira de Azeméis, Oliveira do Bairro, Espinho, Aveiro, Albergaria-a-Velha, Santa Maria da Feira, Estarreja e Porto).Além de gigante, será uma obra pública complexa. Segundo o governo, a construção terá duas fases ao longo das três décadas projetadas. "Cinco anos de desenvolvimento para conceção, projeto, construção e financiamento da infraestrutura" e "25 anos para para manutenção e disponibilização dos ativos".A linha deverá ter "71 km de extensão, via dupla de bitola 1.668 mm para passageiros e velocidade máxima de 300 km/h, um tempo de percurso direto Porto-Lisboa próximo de 1h15"."Inclui uma ponte rodoferroviária sobre o Rio Douro, ligações à Linha do Norte, em Canelas, com 17 km de extensão, a adaptação da Estação de Campanhã, uma nova estação em Santo Ovídio, Vila Nova de Gaia, subterrânea, e uma subestação em Estarreja", diz o contrato.Mais comboiosO segundo maior contrato celebrado este ano e terceiro maior do histórico de duas décadas também é na ferrovia. Celebrado e publicado em outubro passado, visa a "aquisição de 117 veículos [ferroviários]", "62 unidades automotoras para serviço urbano; 55 para serviço regional", a que acresce "as respetivas peças de parque, sobresselentes e ferramentas especiais; opção de aquisição de um ou dois conjuntos de até 18 automotoras, cada, para serviço urbano; e a construção de oficinas de manutenção de material circulante", informa o portal.O valor do negócio feito na modalidade de "procedimento de negociação" está estimado em 746 milhões de euros e o prazo de execução global do investimento é 2.527 dias, cerca de sete anos.A compra foi adjudicada pela CP - Comboios de Portugal. Venceu o grupo francês Alstom.Outros grandesO terceiro maior contrato celebrado até à data, este ano, é o resultante do "concurso limitado por prévia qualificação, com publicidade internacional, para prestação de serviços de operação e manutenção da Central de Valorização Energética" que servirá a área do Grande Porto.A obra, que será feita em Gondomar, está avaliada em mais de 267 milhões de euros e abrange um período de execução de 7.305 dias (20 anos). Foi adjudicada pela Associação de Municípios para a Gestão Sustentável de Resíduos do Grande Porto - LIPOR. O vencedor foi o grupo Veolia Energie, também de origem francesa.Fora do continente, Açores e Madeira também aparecem no topo do ranking dos contratos deste ano.No portal Base, destaca-se a "empreitada de construção do novo porto das Lajes das Flores". O contrato foi assinado em março passado e está avaliado em 195 milhões de euros, com execução prevista de cinco anos. A obra foi adjudicada pelos Portos dos Açores e ganha pelos grupos de construção Tecnovia Açores e Teixeira Duarte - Engenharia e Construções.Na Madeira, a Empresa de Electricidade da Madeira adjudicou por cinco anos, à empresa Atlantic Islands Electricity (do grupo Sousa), a continuidade da operação da "central de produção de eletricidade situada na Zona Franca Industrial, designada Central Térmica do Caniçal" que diz "assegurar cerca de 24% do total de energia elétrica consumida na ilha da Madeira". Custo da concessão contratualizada em junho deste ano: 161 milhões de euros por um prazo de cinco anos.A reanimação do investimento públicoDepois de anos (antes da pandemia e depois dela) de subexecução do investimento público anualmente previstos nos sucessivos Orçamentos do Estado, e que ajudaram bastante a chegar aos excedentes orçamentais, o atual governo sinaliza que chegou a hora do investimento, outra vez.De acordo com o Ministério das Finanças, no OE 2026, "para 2026, prevê-se que o investimento público (formação bruta de capital fixo) nas Administrações Públicas se cifre em 10.931 milhões de euros, cerca de 3,4% do produto interno bruto (PIB), que compara com uma estimativa de execução em 2025 de aproximadamente 10.234 milhões de euros (3,3% do PIB)"."O crescimento do investimento público está relacionado sobretudo com a execução dos investimentos da Administração Central, incluindo projetos financiados no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR)", acrescentam as Finanças.A tutela do ministro Joaquim Miranda Sarmento confirma que "o montante global plurianual [2025 e 2026] dos investimentos estruturantes ascende a 23.748 milhões de euros, destacando-se as áreas associadas à mobilidade, infraestruturas e comunicações (Ferrovia 2020 e expansão da rede de metropolitanos), ao alargamento do parque habitacional e apoio ao acesso à habitação, à defesa nacional (incluindo a Lei de Programação Militar), bem como aos investimentos nas infraestruturas tecnológicas e físicas do Serviço Nacional de Saúde. Os valores de 2025 e 2026 resultam do perfil de execução destes investimentos e do seu financiamento europeu, sobretudo no âmbito do PRR".