Manifestação na sequência de uma greve nacional dos trabalhadores da Administração Pública, a primeira dessa legislatura, em 2020, convocada por organizações sindicais da CGTP e UGT. Lisboa, 30 de janeiro de 2020.
Manifestação na sequência de uma greve nacional dos trabalhadores da Administração Pública, a primeira dessa legislatura, em 2020, convocada por organizações sindicais da CGTP e UGT. Lisboa, 30 de janeiro de 2020.Foto: Reinaldo Rodrigues

Sexta-feira de greve num dos países onde o peso da despesa pública mais caiu

Segundo dados do governo (DGAEP - Direção-Geral da Administração e do Emprego Público), será a décima greve de âmbito nacional dos trabalhadores públicos desde a pandemia.
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O peso da despesa pública portuguesa medido em proporção do tamanho da economia (PIB - Produto Interno Bruto) caiu 4,5 pontos percentuais na última década; desde 2015, quando o país já tinha saído do programa de ajustamento, até ao corrente ano. É o terceiro maior aperto da Europa e do grupo de 40 países ditos desenvolvidos na década que termina em 2025. Esta sexta-feira, 24 de outubro, está marcada uma nova greve nacional da Função Pública.

De acordo com um levantamento e cálculos do DN/Dinheiro Vivo a partir dos dados mais recentes do Fundo Monetário Internacional (FMI), do World Economic Outlook, trata-se da terceira maior compressão do rácio de despesa no grupo dos chamados países desenvolvidos, cerca de 40 na nomenclatura do FMI.

Com isto, em Portugal, o peso do Estado e das restantes administrações públicas é o quinto mais baixo da Zona Euro (20 países) e o sexto mais baixo da União Europeia (27 países), devendo descer este ano para 43,7%. A média da área do euro é 50%.

E é neste ponto que os sindicatos da Função Pública afetos à CGTP (Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais, cuja plataforma de ação é chamada de Frente Comum) resolveram avançar para uma greve nacional, que acontece esta sexta-feira, 24 de outubro.

Segundo dados do governo (DGAEP - Direção-Geral da Administração e do Emprego Público), será a décima greve de âmbito nacional dos trabalhadores públicos desde a pandemia, embora esta não conte com a adesão da Federação de Sindicatos da Administração Pública (FESAP), afeta à UGT.

Esta quinta-feira, arrancou uma primeira paralisação para o "pessoal não docente" agendada por FESINAP, STMO e STTS. No dia 23 de outubro a ação de luta foi "direcionada para os trabalhadores das Carreiras Gerais da Administração Pública (Assistente Operacional, Assistente Técnico e Técnico Superior)"; no dia 24 é alargada "a todos os trabalhadores do sector da Saúde".

O "grande" dia

Seja como for, os trabalhadores das grandes estruturas sindicais do universo CGTP, como Federação Nacional dos Professores (FENPROF), Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP) e Federação Nacional dos Médicos (FNAM), vão parar na sexta. Os inspetores do Fisco também se juntaram, anunciou a Associação Sindical dos Profissionais da Inspeção Tributária e Aduaneira (APIT). Espera-se, portanto, um efeito maior.

Os representantes sindicais de vários sectores esperam "uma grande greve".

Reivindicam, como tem acontecido nos últimos anos, medidas como aumentos de salários, valorização das carreiras, reposição dos vínculos públicos a milhares de trabalhadores, mais investimento nos serviços públicos e a revogação do Sistema Integrado de Gestão e Avaliação do Desempenho na Administração Pública (SIADAP), entre outras.

No caso concreto das escolas, a CGTP resume algumas exigências: "aumento real dos salários que compense a perda de poder de compra acumulada; carreiras dignas e valorizadas que reconheçam o papel essencial dos profissionais da Educação e da Ciência; valorização da escola pública e de todos os serviços públicos; medidas estruturais para enfrentar a escassez de docentes e a enorme precariedade laboral entre os trabalhadores científicos".

Os médicos dizem estar a ser "empurrados para uma situação insustentável, com salários base cada vez mais próximos do salário mínimo nacional e condições de trabalho que comprometem a qualidade dos cuidados de saúde" e acusam o governo (o Ministério da Saúde) de propor políticas que "agravam as desigualdades no acesso aos cuidados, põem em causa a segurança de grávidas, recém-nascidos e doentes, e ameaçam a própria sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde (SNS)".

Os enfermeiros dizem que o governo decidiu "não aprovar os planos de desenvolvimento organizacional das Unidades Locais de Saúde, condicionando a contratação de enfermeiros e a abertura de concursos para desenvolvimento nas carreiras". Falam em "carência de enfermeiros", um fenómeno que se "intensificou".

Número de funcionários públicos em máximos, despesa a subir, mas mais utentes

Ainda a partir os números do FMI, além de Portugal, a redução do peso do Estado e restantes administrações públicas na economia só foi maior na Irlanda (menos 6,1 pontos percentuais entre 2015 e 2025) e na Dinamarca (menos 5,5).

Com este emagrecimento do peso da despesa, Portugal regista atualmente o quinto rácio mais baixo dos 20 países que compõem a Zona Euro e que, por isso, estão sujeitos às regras mais duras do Pacto de Estabilidade (redução da dívida para 60% do PIB e entrega consistente e repetida de excedentes orçamentais até atingir essa meta). Portugal está a conseguir fazer isso. O peso da dívida está a descer rapidamente e agora ronda os 90%. Falta o equivalente a um terço disso (30%) para chegar à meta europeia.

Nos últimos anos tem vindo a reduzir o peso da dívida, num ambiente de crescimento económico superior, o que tem permitido aumentar o peso dos impostos, logo, o contributo da receita para a consolidação, muito apoiado na receita da Segurança Social, que é movida pela criação de emprego.

A despesa pública, em termos nominais, tem aumentado, claro, mas sem acompanhar o crescimento da economia. É por isso, também, que o seu peso tem vindo a regredir.

Saúde, Educação, Defesa, Administração Interna

De acordo com dados do governo, da Direção-Geral da Administração e do Emprego Público (a DGAEP, tutela das Finanças), o número total de trabalhadores públicos no país bateu um novo máximo de 760.728 empregados no final do primeiro semestre deste ano, uma subida de 16% face a igual período de 2015.

Na Saúde, o aumento nestes dez anos ascende a 29%, havendo agora cerca de 157,6 mil profissionais.

Na área governativa "Educação, Ciência e Inovação", a subida foi de 18%, havendo atualmente quase 241 mil trabalhadores, segundo essa estimativa atualizada da DGAEP.

A perder está a área da Defesa, que tem menos 20% de profissionais face há dez anos (total de 29,8 mil empregos no primeiro semestre de 2025).

O emprego na Administração Interna também recuou (1,2%), com o governo a contabilizar agora cerca de 47 mil pessoas.

OE dá mais

O Executivo prometeu mais meios e recursos humanos para estas duas áreas governativas.

No caso dos orçamentos da Saúde e da Educação (programas orçamentais) estes têm vindo a ser reforçados e no OE 2026 não serão exceção.

As Finanças, na conta do programa orçamental da Saúde, estimam encerrar este ano com uma despesa total de 17 mil milhões de euros, prevendo depois um reforço ligeiro de 1,5%, até aos 17,3 mil milhões. Cerca de 50% são despesas com pessoal, indicam as Finanças.

Os sindicatos deste setor referem repetidamente que existem fortes constrangimentos à entrega de cuidados de saúde em segurança, a crescente carga horária, a precariedade dos vínculos dos mais jovens que vem com salários cada vez mais baixos. Referem ainda a pressão da procura, que é cada vez maior.

Segundo dados do próprio Serviço Nacional de Saúde, nos últimos dez anos, o número de utentes inscritos em cuidados de saúde primários passou de 10,1 milhões no final de 2015 para 10,7 milhões em setembro último. Dá mais 6% ou mais 600 mil utentes.

Em conferência de imprensa, Sebastião Santana, o coordenador da Frente Comum, referiu que o aumento do orçamento para a Saúde em 2026 fica abaixo da inflação e apontou que do total dos 17 mil milhões de euros inscritos no OE, "mais de metade é canalizado para privados", em exames, cirurgias, medicamentos, "financiados pelo Estado".

O orçamento do programa Educação e Ciência deve acabar 2025 com 3,6 mil milhões de euros (despesa consolidada). O ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, prevê (no OE 2026) um reforço de 10,4%, para 3,9 mil milhões. Neste quadro, as despesas com pessoal valem 53% do total anual.

Manifestação na sequência de uma greve nacional dos trabalhadores da Administração Pública, a primeira dessa legislatura, em 2020, convocada por organizações sindicais da CGTP e UGT. Lisboa, 30 de janeiro de 2020.
Frente Comum prevê "grande greve" da função pública na sexta-feira

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